Thread by @aheidrich

Uma das coisas que mais me incomoda quando dizem que "análise x ou y tem um olhar crítico" porque essa assertiva pressupõe que o "olhar crítico" seja de quem o diz e não de quem lê e, portanto, "compra" essa análise acriticamente. \1

Por exemplo, por conta do último filme do Coringa, muitas pessoas se surpreenderam ao simpatizarem com a personagem principal e verem, por contraposição, o Batman, o herói, rico, magnata, com outros olhos, sobretudo pela visão que lhes foi "imposta" durante toda sua vida. \2

Uma das falas mais recorrentes sobre o Batman é justamente esta de que "ele é um rico", como se este fosse seu pecado. Veja que ora se cobra desses bem nascidos (ou "bem crescidos") que tenham "consciência social", mas quando um deles o demonstra nunca é suficiente. \3

Lembro de quando ocorreu um atropelamento aqui, no norte da ilha, as manchetes marcavam "um BMW atropelou...". Cara! Como pode um carro atropelar? E como pode uma marca específica de carro atropelar?! Nunca viu um Porsche saindo sozinho e atropelando as pessoas? \4

Este e outros exemplos são recorrentes por aqui e por ali, nunca leio "um Fusca, um Fiat, um Chevette atropelou" porque não emplaca, porque não chama atenção e não nos conecta ao nosso senso próprio de fracasso que precisa (note, PRECISA) de alguém ou algo para culpar. \5

Não se trata de perdoar ricos, assim como não se trata de perdoar pobres, simplesmente porque não se perdoa alguém por ser rico ou por ser pobre, mas se perdoa alguém se você decidir perdoar alguém por seus atos, alguém que pode ser rico ou pobre. \6

Mas o jeito que nos contam algumas notícias, nos cobram uma posição moral sobre a posição de classe do agente envolvido em um sinistro, acima de suas ações específicas. Mas agora cabe a ti perceber por que esta desigualdade nos é relatada como mais importante do que as ações. \7

Nós vivemos uma época sedenta por justiça, mas que ignora a necessidade de um claro conceito de justiça. Se o Coringa é violentado de diversas formas, vinda de diferentes origens, física, psíquica, o que seja, a reação da personagem (em outras histórias) para uma sociedade. \8

Reagir contra a sociedade é algo difuso, pois existem diferentes pessoas com diferentes sensações e percepções, milhares ou milhões, dependendo do caso em análise, mas aí se perdem os agressores, como aqueles que atiram coquetéis molotov e logo se ocultam na multidão. \9

Aí está um ponto, o anonimato protege o covarde e covardes costuma se recolher ou avançar, mas quando avançam, normalmente, agridem. E eu sei como é difícil, mas repassar o sofrimento como se isto fosse diminuir o seu é um erro. \10

"Falta de empatia com a dor alheia? Desprezo pelo Coringa? Admiração pelo Darwinismo Social?" são algumas das afirmações que poderiam me atribuir, mas não, apenas digo que quem está mais próximo, mais ama ou tem mais empatia é que mais atrapalha porque não sabe como tratar. \11

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