Thread by @lucasmafaldo

O método científico é uma maravilha, mas é só um procedimento para testar hipóteses. Acreditar que a ciência possui uma resposta para tudo é dogmatismo.

O consenso atual é apenas... um consenso. Além de mudar com evolução da ciência, ele é parcialmente formado por fatores extra-científicos, como hábitos, preconceitos sociais, dinâmicas institucionais e burocráticas e até sorte.

E se não é verdade que há um consenso absolutamente confiável, é ainda menos verdade que as pessoas que foram formadas por essa consenso são portadoras da verdade absoluta. Além do próprio consenso poder estar errado, os membros individuais podem adicionar seus erros pessoais.

Por isso, apesar de ter extremo interesse em toda pesquisa científica sobre algo que afete a minha vida, tenho também uma boa dose de ceticismo quando vejo alguém dizendo que eu DEVERIA fazer algo porque a ciência diz que sim.

O problema é que é difícil equilibrar uma dose saudável de ceticismo com... puro pensamento mágico. Ou o sujeito acredita que os médicos sabem tudo sobre sua vida ou que a solução é fugir de tratamento médico e conjurar energia de cristais.

Tem que ter uma terceira opção aí.

Para ficar no exemplo da medicina, há obviamente um exagero no modo como as pessoas usam os médicos. Não quero soar psolista, mas acho que existe uma espécie de "engano consumismo cientificista". As pessoas querem pagar por um serviço que simplesmente remova um problema.

Embora o desejo seja compreensível, as pessoas precisam entender que não é assim que as coisas funcionam. Nem tudo que você sente é um problema isolado que pode ser resolvido com uma pílula. Em tudo há uma variação genética, além de efeitos sistêmicos e ambientais.

E o próprio tratamento tem seus riscos e variações. No fundo, mesmo depois de adquirir o máximo de conhecimento, cada pessoa tem que fazer um "calculo prudencial" e ver o que acha que é a melhor resposta no SEU CASO.

Toda decisão envolve uma mistura de universal e particular.

Creio que a minha cultura de origem -- a classe média potiguar -- teve uma dificuldade especial de compreender isso. Talvez a região tenha passado rápido demais de uma cultura interiorana para a cultura média brasileira. Muita coisa foi atropelada.

Só para dar um exemplo, eu sempre fiquei espantado quando vi gente tomando colheradas de ajeite, e depois de óleo de côco, porque leram que era um tipo de gordura mais saudável. Não consegui explicar a ninguém que fazia mais sentido colocar na comida. É a cultura do remédio.

Isso, claro, depois de todo mundo ter sido convencido a parar de usar manteiga da terra e gordura de porco (que eram produzidas localmente) para comprar margarina das multi-nacionais -- prejudicando o bolso e a saúde das pessoas ao mesmo tempo.

Eu vejo claramente uma mudança geracional nessa região: a turma na faixa de 60 em sua maioria tinha uma cosmovisão interiorana, mas sólida. As gerações seguintes tentaram se modernizar rapidamente e acabaram criando um pastiche de consumismo e cientificismo muito superficial.

Talvez o isolamento das gerações anteriores tivessem suas vantagens: apesar da experiência de mundo limitada, criaram hábitos (pessoais e sociais) que funcionavam muito bem para navegar naquele mundo. As gerações seguintes ficaram meio atordoadas.

Talvez venha agora uma síntese.

Sim, sei que estou fazendo generalizações demais até para mim, mas essa é só uma threadzinha de fim de semana. Volto ao assunto com mais energia noutro dia.