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Confesso que tenho cada vez menos paciência para casos patológicos de burrice violenta. Aquela que não fica no seu cantinho, mas mostra os dentes e morde. O orgulho de ser "burro" mostra que o poço não tem fundo no Brasil (siga a thread) 
Antes de mais nada, burrice não é a falta de um conhecimento específico. Um camponês pode não saber navegar na internet. Mas duvido que vc saiba produzir comida como ele. A beleza da sociedade é a complementaridade dos saberes, a ponto de precisarmos uns dos outros.
Burro também não é quem separa sujeito e predicado por vírgula. Muita gente não entende isso e desvaloriza a opinião do outro por não compartilhar dos mesmos padrões de fala. Burrice é achar que usar ou não a norma culta da língua é pré-condição para participar do debate público
Trato aqui da burrice de quem menospreza o conhecimento, chegando a odiar quem o detém ou quem busca aprendizado. Ou pior: a burrice de quem tortura a realidade até ela gritar o que ele quer ouvir.
Da burrice apressada, que xinga algo na rede sem ter consumido nada além de seu título ou visto o nome do autor ou autora. E, diante das críticas sobre a superficialidade desse comportamento, rosna, dizendo que tudo o que é importante pode ser escrito em uma linha ou um tuíte.
O burro é aquele que vê seu preconceito violento como sabedoria.
Essa burrice pensa que já sabe de tudo a ponto de tachar os que discordam de sua visão de mundo como mal informados ou manipulados sem apresentar dados e fatos que corroborem a crítica. Ou tenta calar as vozes diferentes da sua por encarar a dissonância como ruído e não música.
Pois a burrice sempre tenta destruir o conhecimento que ameaça jogar luz sobre ela própria.
A burrice também é incapaz de aceitar o próprio erro, transferindo a culpa para o outro. Ou, diante de um questionamento, foge da autocrítica, dizendo que outra pessoa ou partido também faz a mesma coisa. A burrice não pede desculpa.
Pois a burrice de um indivíduo acha que é absolvida pela burrice de outro indivíduo ou do coletivo.
A burrice não aceita a existência de outra versão que interprete os fatos além da sua. É incapaz de reafirmar sua visão e, ao mesmo tempo, conviver com outras. Enxerga a opinião alheia como "notícia falsa" por não admitir a sua existência.
A burrice de alguns seguidores de políticos que não aceitam a existência de divergências ocorre da direita à esquerda, ou seja, não é monopólio de ninguém.
Se o debate público fosse mais qualificado, a pessoa se sentiria mais motivada a procurar se informar melhor e de maneira mais plural a fim de conviver com seus pares nas redes sociais ou mesmo na vida offline.
Ler coisas com as quais concordamos e com as quais não concordamos. Ler fontes de informação que não sejam anônimas, que se responsabilizam pelo que divulgam. Preferir fontes que baseiam relatos em provas e não em teorias da conspiração. Que são gostosas, mas burras.
Muitos na Alemanha pré-Segunda Guerra se acovardaram ou acharam pertinente a queima de livros levado a cabo por estudantes que apoiavam o regime nazista. Hoje, vemos muitos se acovardarem diante de ondas burras, intolerantes e violentas frente ao conhecimento.
Não, não estou comparando nossa sociedade com a nazista. Apenas dizendo que a burrice pode ser atemporal. E universal.
Como sempre digo: falta amor no mundo, mas falta interpretação de texto. E um bom calmante na água de muita gente.
