Eu já.
Quando Íris nasceu, em 2016, por uma série de fatores, acabou internada na UTI Neonatal da maternidade onde nasceu.
Bicho... não desejo isso a ninguém...
Nos corredores de uma UTI Neonatal a gente escuta cada história, cada relato de luta, igual a essa que vou contar:
Imagina o cara ouvir aquilo no momento mais sublime da sua vida, depois de meses de ansiedade e felicidade, já com mil planos feitos.
Ainda na sala de cirurgia o bebê apresentou dificuldades. Foi ficando azulado, roxo, e a médica logo decretou a morte iminente por meio do "Paizinho, seu filho não vai sobreviver."
"Não vai sobreviver, UM CACETE!"
Mas para onde correr na cidadezinha de interior, lá na distante Carajás, com hospital pequeno e sem especialista?
Para quem pedir socorro?
Desandou a ligar para todos os conhecidos. Falou com o gerente, com o superior e até com diretor. Conseguiu uma UTI aérea pelo plano de saúde da Vale, tudo devidamente apressado pelos amigos, e correu para tentar salvar seu menino.
A esposa ficou na sala de operações, pois não podia voar ainda, recém aberta nas entranhas.
“Como vai ser lá?
Nunca nem saí da cidadezinha!
Nunca estive na cidade grande!
Mas vou me virar.
Ele vai viver."
Ele dizia terem sido as horas mais terríveis da vida dele.
O pai, que não podia ficar com a criança, foi colocado num hotel em São Bras, perto da rodoviária de Belém.
A rotina era massacrante.
Foram dias e dias em que habitou o corredor atrás de estar com o filho, de saber melhora ou piora, sempre mandando notícias para a mãe, ainda convalescente em Carajás.
No primeiro trajeto de carro, do aeroporto ao hospital [é pertinho], achou Belém um mundo.
No dia em que teve que comprar coisas básicas para o bebê, foi andando até supermercado próximo [aqui do ladinho], e se perdeu.
Dividindo o corredor e histórias, ajudei ele no registro do moleque que lutava, nascido na Serra de Carajás, registrado em Belém com a graça de Nicolas
Só ficava ali, sentado ao lado da porta da Sala 02, como se rezando pela recuperação do filho. Mas bastava alguém se aproximar e era homem alegre e gentil, papo inteligente e cativante.
Sobretudo, esperançoso.
Precisava ver o menino seu, retirado morto do seu ventre, tão pequeno, tão frágil, igual um sabiá.
Imagina?
Ver a criança viva era ver o oásis, o viajante seco.
Acabou com forte sangramento ao final do primeiro dia.
Recebeu atendimento ali mesmo, num canto do corredor, mas seguiu ao lado do marido sem arredar pé.
Agora eram dois perdidos na grandeza da cidade mundo.
Depois de mais de mês o menino recebeu alta.
Respirou.
Vingou.
Eu estava lá no dia. Os pais ficaram longos minutos no corredor do hospital somente admirando a criança, agora, da cor se gente.
"Não vai sobreviver, UM CACETE!"
Havia um pai ali.
Lutou luta boa.
Viveu o menino e voltaram para a cidadezinha que é pequena, mas é mundo deles - e eles são maiores do que o mundo todo.
Fim.
Acho que mudou de telefone, mas sei que estão bem.
Com a força que eles têm, estão bem.