Thread by @tantotupiassu

Quando eu e Livia decidimos casar, nossa primeira data era dezembro de 2014.

Acontece que a avó da Lívia estava bem doente, então decidimos adiantar tudo.

Casamos no dia 05 de setembro, e foi a melhor coisa que fizemos, pois vó Íris faleceu logo depois.

Como adiantamos a festa, acabamos fugindo bastante do nosso orçamento, que já era apertado.

Seria uma coisa bem pequena, para poucos convidados, no quintal da minha mãe, e, com a adiantada, tivemos que economizar onde fosse possível.

Os enfeites, por exemplo, fizemos todos eles na mão, com ajuda de amigos. A iluminação também, e assim fomos.

Os gastos grandes a gente foi pagando como dava, mas um item em especial foi ficando sempre para depois: a aliança.

Quando faltavam 2 semanas para a festa, me desesperei.

Já sem nenhuma grana, e sem anel, o que fazer?

Minha grande sorte é sempre poder contar com o companheirismo absoluto da Livia, e foi ela quem resolveu o problema, de forma simples e despreocupada.

Belo dia, ela chega em casa e diz:

- Comprei nossas alianças - me mostrando dois anéis lindos.

- Como assim, amor? Com qual dinheiro?

- Amor, entrei numa joalheria do shopping e comprei.

- E quanto custou?

- 20 mil, o par.

Enquanto eu me debatia no chão da sala, Lívia começou a rir da minha cara.

- Amor, deixa de ser besta! Tu achas que eu ia dar 20 mil em aliança?

- E onde você arranjou isso?

- Comprei num chinês, no Comércio. Custaram 20 reais. Igual ouro, né? Ninguém diz que é de marreteiro.

Vocês já devem ter notado que Lívia é fantástica, né?

Ela podia cobrar, exigir uma jóia cara, bater o pé e dizer não caso, mas, bicho, ela sempre opta pelo mais simples, pelo mais compreensível, e isso faz dela uma pessoa apaixonante.

Pois bem!

Casamos, trocamos as alianças chinesa, a festa foi linda, detalhes nossos por todos os cantos, e hoje completamos 5 anos de casados.

Nesse tempo, por diversas vezes, pensamos comprar alianças chiques, mas, sempre que a ideia surgia, também surgia um outro sonho ou necessidade.

A compra da nossa aliança foi ficando para trás, e viajamos, compramos livros, tivemos filhos, comemos bem e fomos sempre imensamente felizes.

No fim, quando o assunto ressurgia, Lívia só me abraçava e falava:

- Gosto das nossas alianças baratinhas.

Já no final, nossas alianças de ouro nem eras mais douradas... o dourado delas se perdeu na vida, inclusive nas nossas mãos suadas, envolvidas em luvas de látex, quando acarinhávamos a vó Íris na sua partida, no hospital.

Acho que foi alguma reação química, ou alguma ordem do destino, mas ali, na morte dela, o ouro se foi e só perseverou o que era verdadeiro, um anel prateado que nos acompanhou por todo esse tempo - exatamente como nosso amor, sem espaço para nada supérfluo.

E o nosso amor perdura, mas, infelizmente, a aliança se foi.

Dia 31/05/2019, nascimento do Vicente: tudo corria para um parto normal, mas, subitamente, tivemos que fazer uma cesárea de urgência.

Na correria do preparo da sala de operação, no medo de nosso filhos estar sofrendo, alguém disse: tire sua aliança - e eu tirei.

E guardei no bolso da roupa do hospital, e vi meu filho sair do ventre, e me embeveci, e chorei e amei e beijei minha esposa... e esqueci a aliança.

Na volta ao quarto, já instalados, joguei a roupa no cesto de refugo e só pensava na minha família...

No dia seguinte, quando dei por mim, movimentei o hospital, mas não tinha mais nada a ser feito.

Perdi minha aliança de ouro pintado e descascado, de metal barato comprada do chinês, que custou 10 reais, mas que valia tanta história de amor, de companheirismo e amizade, e me deu uma baita vontade de chorar, sabe?

Foi Lívia que não deixou ficar para baixo, sempre ela a me ensinar sobre a vida:

- Fica assim não, amor. A aliança é a gente, mas sempre somos nós. Depois, com calma, a gente finalmente compra uma melhor...

E talvez ela não saiba como me senti nu, perdido e sem rumo sem minha aliança barata, tudo devidamente remediado com uma esposa que é luz e que brilha iluminando tudo ao redor.

E ela tem toda a razão - sempre tem, ou quase sempre tem, rs

A aliança representou todas as dificuldades, desafios e barras que passamos, e todo o amor que nos envolve, mas jamais representa, somente nela, o que somos de fato.

E nesse 05/09, quando fazemos 5 anos casados, pensei em dar esse recado sobre amor, talvez para passar um pouco da luz dela, meu amor, a vocês, nesses tempos tão tenebrosos.

Porque o amor jamais deve ser guiado por bens materiais.

Porque a oferta verdadeira do amor é isso: companheirismo, amizade, compreensão e paixão.

E isso, felizmente, temos de sobra, mesmo sem nossa aliança chinesa.

E, quem sabe, com calma, no dia em que estivermos mais saciados da nossa fome eterna de amar e viajar, de criar, de ler e de assistir, de ver o mar, a gente não pare na frente de um joalheria qualquer e escolha um anel, simples e bonito, exatamente como a vida deve ser...

Ps.: essas fotos lindas são do @fabriciosousa, o melhor fotógrafo e amigo que vocês possam imaginar - basta notar o amor e sensibilidade desse olhar.