Não dá pra entender como ninguém fez um filme sobre a vida do Meneghetti, um ladrão anarquista que dedicou toda a sua vida a roubar basicamente joias e relógios, por considerá-los "objetos fúteis que só serviam para aguçar a vaidade dos ricos". Sigam o fio.
Gino Meneghetti era um italiano de Pisa que se mudou para São Paulo na juventude. Na Itália era procurado por diversos roubos. Sua primeira prisão foi aos 14 anos e na última tinha mais de 60. Morreu com 88 e passou 40 preso, sendo 15 numa solitária.
Em São Paulo, Meneghetti se dedicou à "arte do roubo" por décadas. Dos anos 20 aos 50, o larápio dilapidou todas as joalherias e palacetes da capital paulista. Foi ladrão até o fim: dias antes de morrer de velho, em 1976, foi pego tentando invadir uma casa.
Foram incontáveis as suas passagens pelos presídios de São Paulo (e também do Sul, onde tentou a sorte quando passou a ser muito visado). Fugiu de quase todos, em fugas tidas como impossíveis. Tinha a inteligência aguçada e a agilidade de um artista de circo.
Em uma de suas fugas mais incríveis, quando estava preso numa espécie de castelo em Florianópolis, escalou a muralha de quatro metros numa distração da guarda e saltou para o mar de uma altura superior a 50 metros. Nadou horas até chegar à praia.
Já ficou preso dentro de um poço com uma grade por cima, de onde nunca ninguém havia escapado. E Meneghetti conseguiu fugir escalando as paredes como um gato e arrancando as grades na unha, durante a madrugada, quando todos dormiam.
Nunca se confirmou com a prisão, por ser contra o encarceramento de seres humanos. Embora não agredisse a ninguém fisicamente, era rebelde e não cumpria ordens. Por isso era sempre enviado à solitária, de onde gritava: "io sono un uomo" (eu sou um homem).
Meneghetti passou 15 anos numa solitária, incomunicável e sem ver a luz do sol. Suportou as piores torturas físicas e psicológicas para confessar crimes que nunca cometeu, como o homicídio de um chefe de polícia. Foi inocentado. Era ladrão, não assassino.
Nunca ficou rico roubando, mas alternava períodos de fartura com outros de dura carestia. Gastava o dinheiro "expropriado" com a boa vida (a qual julgava ter direito) e ajudando os pobres (que considerava vítimas da exploração dos ricos).
Meneghetti era chamado de "gato dos telhados", porque andava sobre eles com agilidade felina e se escondia como rato no forro das mansões. Quando a polícia o cercava, saltava de telhado em telhado até sumir na poeira. 
Meneghetti em dois momentos: com e sem bigode. Quando ele ficava manjado de um jeito, voltava a roubar de outro. Por mais ridícula que possa parecer a tática, ela confundia a polícia, pois os homens da época se vestiam como ele e o uso de bigode era comum.
Por fim, Meneghetti com a idade avançada, vagando por São Paulo. Em entrevista ao Pasquim, nos anos 70, disse que nunca se arrependeu e que faria tudo de novo, por convicção. "Não me recuperei porque nada fiz de errado para me recuperar".
Há dois livros que podem ser encontrados na @estantevirtual: o melhor é "Meneghetti - O Gato dos Telhados", do Mouzar Benedito. Mas também vale a pena ler "O Incrível Meneghetti", de Paulo José da Costa Jr, seu amigo e advogado que o defendeu.
Nunca fizeram um longa-metragem sobre a vida de Meneghetti, mas Beto Brant fez um curta (obrigado por lembrar, @gustavo_menezes).
