, 28 tweets, 7 min read
My Authors
Read all threads
Não adianta apontar apenas para as individualidades nesse time do Liverpool. A equipe atingiu um nível absurdo, mas tudo tem a ver com o coletivo.

Além de conhecer todas as peças no tabuleiro do adversário, é preciso entender como cada uma interage com as outras.
Falei um pouco sobre a formação desse time do Liverpool e sobre a história do homem por trás de tudo: Jürgen Klopp.



O trabalho do alemão na construção desse grande Liverpool não deve ser subestimado.
Arrigo Sacchi, uma das maiores mentes futebolísticas de todos os tempo, reclamava dos rumos que o futebol vinha tomando na virada do século.

Para o italiano, o jogo estava se tornando cada vez mais individualizado e compartimentado. Um jogo de especialistas.
Alguns jogadores só atacavam, outros só defendiam, outros só driblavam...

“Isso é reacionário. Não multiplica as qualidades individuais exponencialmente. Esse é, na verdade, o objetivo da tática: alcançar um efeito multiplicador nas qualidades dos jogadores”
De lá pra cá, muita coisa aconteceu. O futebol mudou muito nas últimas duas décadas, mas talvez esse pensamento de Sacchi seja o que melhor resume o Liverpool de Klopp.
Em 2013-14, antes de Klopp, os Reds quase venceram a Liga depois de 24 anos.

O time comandado por Brendan Rodgers fez 84 pontos e marcou 101 gols, mas teve a segunda pior defesa entre os oito primeiros colocados e perdeu a taça no fatídico escorregão de Gerrard.
O time era organizado, mas se baseava bastante no talento individual. Gerrard foi recuado para reger o time lá de trás. Coutinho dava um toque de magia e o trio de ataque infernizava a vida dos adversários.
Hoje o Liverpool também tem um trio de ataque mortal, mas é um time bem melhor, mais consistente e equilibrado.

Muito passa por uma defesa extremamente sólida e um meio-campo funcional.
Klopp vendeu Coutinho e ficou com jogadores como Wijnaldum, Milner, Henderson, Fabinho, Oxlade-Chamberlain, Keita e Shaqiri. Todos seriam considerados volantes no Brasil, talvez com exceção dos dois últimos.

O fato é que são jogadores multifuncionais.
Milner joga em praticamente todas as posições do campo. Henderson é primeiro volante, faz o lado direito e jogou como zagueiro contra o Monterrey. Fabinho começou como lateral, hoje é volante, mas também já jogou como zagueiro (o brasileiro está lesionado e não disputa o mundial)
Shaqiri joga no meio, na ponta direita ou na esquerda. Keita pode ser um jogador de mais infiltração na área do adversário ou ajudar mais na circulação de bola no meio. Até Lallana, que era um meia de ligação antes, vem jogando mais preso, armando de trás.
No ataque, a mesma coisa. Firmino era centro-avante, passou a jogar como Falso 9, já foi um 10 clássico e hoje faz tudo isso.

Ainda subestimado por muita gente no Brasil, Firmino é uma liderança nesse ataque. Faz gols, mas principalmente facilita o trabalho de todos os outros
Salah jogava muito na Roma. Já dava pinta de craque. Começou na ponta-direita, mas passou a jogar mais no comando do ataque pela sua capacidade surreal de criar e aproveitar espaços que ninguém mais vê.
Mané, o craque do time na atual temporada, pode jogar na ponta no 4-3-3, como atacante por dentro num 4-4-2 ou até pelo lado nesse mesmo esquema.

Com isso, o Liverpool não tem um formato fixo em campo. Varia do 4-3-3 para o 4-4-2 ou para o 4-1-4-1 em um estalar de dedos.
Às vezes você identifica um 4-3-3, mas tem dificuldade de dizer quem está jogando na ponta, tamanha é a movimentação.

Mas isso não significa que o time não tem um modelo de jogo bem definido e bem treinado.
A principal constante nesse time do Liverpool é a importância dos laterais. Com esse meio-campo mais funcional, a bola passa o tempo todo por Trent Alexander-Arnold (TAA) na direita e Andrew Robertson na esquerda.
Os dois fazem o corredor inteiro e aparecem tanto na saída de bola quanto na chegada ao ataque.

Na temporada passada, TAA somou 12 assistências na Premier League e Robertson 11.
Os dois costumam subir juntos, dando largura (amplitude) ao time. São os principais articuladores do time. Quem já teve Léo Moura e Juan sabe do que eu estou falando :)

Com isso, o Liverpool fica exposto a contra-ataques.
A escolha é difícil: se você deixar dois jogadores na frente enquanto o Liverpool tiver a bola, não terá superioridade numérica para defender, mas pegará os zagueiros no mano-a-mano na hora de contra-atacar.
Mesmo quando o adversário expõe a defesa no 2-contra-2, o trabalho é difícil.

Virgil van Dijk (VVD) ficou famoso por ter feito uma temporada inteira sem ser driblado. Isso se deve, é claro, pela sua técnica de marcação, noção de posicionamento, tempo de bola e físico avantajado.
VVD, inclusive, é bastante rápido para um cara tão grande (1,93m e 92kg).

Na temporada passada marcou o pique mais rápido da Champions League, atingindo 34,5km/h contra o Barcelona.

Longe dos 38km/h de Bruno Henrique (), mas impressionante mesmo assim.
No entanto, o mais impressionante em VVD é a forma como ele manipula os atacantes.

Ele não é driblado porque é muito difícil tentar o drible em cima dele.

O zagueiro holandês sabe perfeitamente fechar os espaços e aguardar o momento do bote.

Van Dijk ainda é dúvida para amanhã. Caso Henderson jogue em seu lugar, o Liverpool perde duplamente: não terá seu melhor zagueiro e ainda enfraquecerá sua circulação de bola no meio, já que o titular Fabinho nem foi a Doha e Henderson é disparado a melhor opção para volante.
Por fim, passando por tudo isso, o atacante ainda tem que enfrentar Alisson, um goleiro pra lá de seguro.

O brasileiro assume bem a descrição do bom goleiro que meu pai me dizia na infância: pega todas as fáceis, quase todas as difíceis e algumas impossíveis.
Como o pessoal do @KopcastLFC lembrou no último episódio (com minha participação), Alisson só tomou três gols de fora da área desde que chegou ao Liverpool. Não é qualquer chute que entra não.

@KopcastLFC Jürgen Klopp diz que, como jogador, “tinha o talento da quinta divisão e um cérebro da primeira divisão”. Talvez tenha sido parecido com Jorge Jesus, que diz ao seus jogadores: “se eu tivesse um treinador que me ensinasse o que ensino a vocês, teria sido dez vezes mais jogador”.
Esse é justamente o papel dos grandes treinadores: colocar o cérebro a serviço de lapidar as características individuais de cada jogador, buscando um todo que é muito maior do que a soma das partes.
PS: estou lançando meu primeiro livro - Outro patamar: análises sobre o Flamengo de 2019 e as lições para o futebol brasileiro.

Estamos com uma campanha de crowdfunding que funciona basicamente como uma pré-venda com recompensas incríveis.

Chega junto!

benfeitoria.com/outropatamar
Missing some Tweet in this thread? You can try to force a refresh.

Enjoying this thread?

Keep Current with Téo Benjamin

Profile picture

Stay in touch and get notified when new unrolls are available from this author!

Read all threads

This Thread may be Removed Anytime!

Twitter may remove this content at anytime, convert it as a PDF, save and print for later use!

Try unrolling a thread yourself!

how to unroll video

1) Follow Thread Reader App on Twitter so you can easily mention us!

2) Go to a Twitter thread (series of Tweets by the same owner) and mention us with a keyword "unroll" @threadreaderapp unroll

You can practice here first or read more on our help page!

Follow Us on Twitter!

Did Thread Reader help you today?

Support us! We are indie developers!


This site is made by just three indie developers on a laptop doing marketing, support and development! Read more about the story.

Become a Premium Member ($3.00/month or $30.00/year) and get exclusive features!

Become Premium

Too expensive? Make a small donation by buying us coffee ($5) or help with server cost ($10)

Donate via Paypal Become our Patreon

Thank you for your support!