Thread by @P_droMenezes

A @CNNBrasil tem defendido o suposto "Grande Debate", afirmando que é um modelo aclamado no exterior. Não é verdade.

Nos EUA, a própria CNN cancelou o programa por reconhecer que prejudicava o debate público.

A história é curiosa e ensina muito sobre a imprensa. Conto + no fio:

O "Crossfire" (Fogo Cruzado, o Grande Debate deles) foi um dos programas de maior sucesso da CNN por 22 anos.

O episódio mais famoso foi ao ar em 15 de outubro de 2004. É um dos momentos mais marcantes da TV dos EUA. Foi o início do fim para o Crossfire, cancelado em dezembro.

O responsável por cancelar o Crossfire foi Jon Stewart, esse do gif abaixo. Ele apresentava o Daily Show e foi pioneiro ao misturar comédia com noticiário político. O programa fazia tanto sucesso que era transmitido no Brasil. O modelo do Daily Show foi copiado em todo o mundo.

Em 15 de outubro de 2004, Stewart foi convidado para o Crossfire, supostamente para falar do novo livro dele. Mas ele ignorou o livro e decidiu criticar o modelo do Crossfire ao vivaço, deixando os apresentadores sem graça.

O vídeo está no YouTube:

Stewart não usou meias palavras. Disse que o Crossfire "machucava a América".

"Vocês colocam dois piratas partidários (partisan hacks) para discordar. Isso não é um programa de debates. É um teatro."

Obviamente, os apresentadores ficaram sem graça, enquanto a plateia ria deles.

O vídeo mostra Jon Stewart no auge, extremamente engraçado, com respostas ágeis e ácidas. Viralizou.

Dois meses depois, a CNN cancelou o Crossfire. O presidente da emissora admitiu que Stewart estava certo e influenciou a decisão.

Todas as críticas se encaixam no Grande Debate.

Gostei das participações de @GabrielaPrioli, mas não concordo que o problema do Grande Debate é a contraposição entre conhecimento técnico e achismo. Ninguém tem conhecimento técnico para debater uma polêmica nova todo dia. O modelo está errado por princípio: teatro não é debate.

Além da impossibilidade de existir um técnico que consiga debater a polêmica do dia todo dia, quem disse que a exposição de dois lados divergentes ajuda a esclarecer um assunto? Com frequência, há mais de dois lados.

São 2 pessoas contratadas para discordar, mas não para pensar.

Esse modelo baseado em confronto binário, sempre entre as mesmas duas pessoas, está fadado ao fraco. Gera muita divisão e pouca reflexão.

Não é possível fazer um verdadeiro programa de debates com assim. Sempre vai virar teatrinho, por melhores que sejam os debatedores.

A TV brasileira já tem modelos melhores, como o Painel Globo News, apresentado por @renataloprete. Nele, o tema da semana é discutido por especialistas que mudam conforme o tema. Ou o @Mamilospod, na podosfera.

Tem como melhorar? Claro. Mas o Grande Debate vai na direção errada.

A inovação que esse suposto Grande Debate traz é o componente de teatrinho, a personalização de disputas diárias nas quais cada um escolhe seu lacrador favorito. Reparem como tudo se baseava em Gabriela x Coppolla e, depois, em Gabriela x Tomé. O debate fica mais vendável e raso.

Talvez algum executivo descolado ache que isso é inovação, mas não é. Tentam emular o ambiente da internet, mas ficam apenas com o pior das redes - tudologia, personificação, clima de rinha, etc.

Não há conhecimento técnico capaz de salvar algo que está errado por concepção.

Corrigindo:

"Esse modelo baseado em confronto binário, sempre entre as mesmas duas pessoas, está fadado ao FRACASSO*. Gera muita divisão e pouca reflexão."