Vê sangue e começa a passar mal?

Isso se chama reflexo vaso-vagal (RVV) e tudo indica que se trata de um resquício evolucionário.

Vamos entender?
RVV é um momento em que o corpo, ao ser confrontado por um estresse (ou por ortostase prolongada - ficar em pé), desiste do clássico mecanismo de “luta e fuga”, que seria um forte estímulo do sistema nervoso simpático (SNS) que aumenta a velocidade e força do coração.
A resposta de “luta e fuga” é um mecanismo evolucionário importante. Quando expostos a uma ameaça, os animais (inclusive nós) se beneficiam dessas rápidas alterações para sua sobrevivência.

Só que nem todo animal (e ser humano) responde da mesma forma.
Em alguns, ao invés da “luta e fuga”, ocorre um mecanismo de “imobilidade”, em que o coração, por estímulo do sistema nervoso parassimpático (SNP) ou vagal, reduz sua frequência cardíaca e pressão arterial (PA).

Se esse reflexo vem em momento inoportuno, pode levar ao desmaio.
Se queremos fugir de ameaças, por que isso?
- Hipótese anticoagulante: a queda da PA reduz o sangramento e melhora as chances de coagulação.
- Hipótese dos conflitos: na pré-história, mulheres e adolescentes (não combatentes) melhorariam suas chances ao fingir-se de morto.
E se isso é uma evolução desvantajosa, por que Darwin ainda não se livrou dela?
- Fingir-se de morto é, notadamente, uma boa estratégia de combate;
- A queda da PA e da frequência cardíaca podem melhorar o enchimento cardíaco e sua função como bomba, trazendo vantagem tardia.
- Cair deixa o animal em posição gravitacional neutra, melhorando perfusão orgânica.

E por que só humanos desmaiam?
- Porque aliamos essa resposta ao fato de vivermos em posição ereta, o que potencializa todo o mecanismo.
Se é um problema evolucionário que carregamos ou uma vantagem, isso só podemos supor.
Mas causa sintomas. Reduz qualidade de vida. Neste sentido pode ser encarado como “doença” e tem tratamento: desde manobras para interromper crises, até ablação e marca-passos em casos extremos.

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3 Sep
Vamos de ECG? Nesse post eu vou explicar breve e resumidamente como o complexo QRS (aquele que mostra o ventrículo batendo) se forma e por que ele se alarga.

E te explicar que nem todo QRS largo é bloqueio de ramo, mesmo que pareça. Vamos lá?
Nível: do básico ao muito avançado.
1/n. O QRS é o complexo que representa a atividade elétrica ventricular. Ele pode ter só um vetor, dois, três, quatro… Em algumas derivações tem três, por isso foi chamado de Q, R, S.
Cada letra corresponde a um vetor, portanto, a uma direção de frente de onda.
2/n. Se você treme ao ouvir a palavra “vetor”, não se preocupe, troca por “direção da onda”que tá tudo bem.
Como é o batimento cardíaco normal?
- Após passar pelo nó AV, o estímulo ganha o feixe de His
- Depois os ramos direito e esquerdo (e os fascículos do esquerdo)
- Purkinje
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1 Sep
É inerente ao ser humano que se ancore em ideias fixas e se feche para o contraditório. Esse é o viés cognitivo de ancoragem.

Muitos nos ancoramos em tratamentos e intervenções clássicas da Medicina sem questioná-los. É assim com a trombólise no AVC. Vamos levantar a âncora?
Tudo começou em 1933, quando William Tillet percebeu por acaso que certas cepas de Streptococos aglutinavam em tubos com plasma, mas não em tubos com soro. O streptococo sintetizava uma substância fibrinolítica: a streptoquinase.
Em 1958, Sussman e Fitch publicam a primeira série de três casos do uso de fibrinolisina por 4 a 6 dias.
Décadas de falhas se passaram - pacientes sangram mais que melhoram, até que em 1992, um artigo da revista Stroke (AVC em inglês) questionou: trombolíticos funcionam?
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25 Aug
Carta aberta que contesta interpretação dos trials negativos sobre COVID é uma confissão de que a Hidroxicloroquina não é milagrosa.
Além de uma ferramenta criada e assinada por médicos e doutores que querem apenas uma coisa: ludibriar você, mais uma vez.

Entenda.
O tamanho de uma amostra (quantos pacientes precisam ser estudados em uma pesquisa) é calculado baseado nos fatores:
- Quantos % de falsos negativos o pesquisador permite que apareçam no estudo: normalmente 20%
- Quantos % de falsos positivos: normalmente 5%
- Eficácia estimada.
A amostra precisa ser calculada antes da pesquisa. Este é um conceito verdadeiro que os autores desta peça ridícula usam para depois tirar conclusões falsas:
- “Em outras palavras, os resultados significam que tratamento precoce é eficaz”. Baseado em que eles dizem isso?
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23 Aug
"Uma aspirina por dia deixa o médico mais longe”. Essa máxima começou a ser construída no Clube dos Otimistas de Glendale, e foi o pontapé inicial pra salvar milhares de vidas. Mas agora, sua prescrição indiscriminada deve parar.

Se liga no fio pra entender.
Sumérios, egípcios e Hipócrates usavam casca de salgueiro para aliviar dor, febre e inflamação. Em 1763, o Reverendo Edward Stone afirmou que “muitas doenças carregam consigo a cura", pela coincidência que o salgueiro cresce também onde há doenças febris tropicais, como a malária
Durante o século XIX, diversos pesquisadores tentaram extrair a substância anti-inflamatória: a salicina. Apenas em 1897, Felix Hoffman, funcionário da Bayer, conseguiu modificar o ácido salicílico a ácido acetilsalicílico (AAS), um composto com menos irritação gástrica.
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21 Aug
Um fio sobre a história da trombose venosa e pulmonar, dos anti-coagulantes, fazendeiros, venenos de rato…

Também um fio sobre porquê a Medicina deve ser repensada a todo momento. Segue os próximos tweets para entender.
A primeira descrição histórica de um caso semelhante a uma trombose venosa foi do jovem Raoul no manuscrito “La vie et les miracles de Saint Louis” de Guillaume de Saint Pathus de 1271.

Outro possível (obviamente enviesado) caso famoso, você deve conhecer: é o de Jesus Cristo. Image
No século XX foram descobertas propriedades anticoagulantes de algumas substâncias: a heparina e os antagonistas da vitamina K.
Esses últimos foram usados como veneno de rato por alguns anos até que se percebesse que a dose raticida não era tão tóxica assim para os humanos. Image
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17 Aug
O que bolo de laranja, alho e patinetes têm a ver com COVID?

Todos usaram da ironia e sarcasmo para provar um ponto: você precisa parar de confiar em tudo que te mandam por aí.

Segue o fio pra entender.
Para desmentir uma corrente de zap que era visivelmente fake, eu segui o mesmo caminho do criador da fake. Decidi enviar para a New England Journal of Medicine uma receita que eu pessoalmente gosto muito: o bolo de laranja. Mas não qualquer um: aquele fofinho com calda. Image
Infelizmente o artigo não foi aceito (maldito peer review). Mas meu print com o logo da New England está assegurado! Ninguém no Zap me segura.

Depois veio a genial ideia dos cientistas Clor Kine, Iver Mectin e Nitax Zanida: países onde há ALHO não possuem vampiros… Image
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