Criticar as atuações individuais hoje é chover no molhado. Jogo terrível do Flamengo em todos os aspectos. Além dos muitos erros, um tanto de azar e coisas inexplicáveis como dois pênaltis MUITO mal batidos e assistência de goleiro.
Na verdade, acho que dá pra dividir o jogo em quatro momentos distintos.
Nos primeiros 15 minutos, o Flamengo foi superior, conseguiu manter a bola, controlar o São Paulo e variar a saída curta e longa. Abriu o placar merecidamente e continuou fazendo seu jogo...
Mesmo assim, um problema persistia. O mesmo problema de sempre. A compactação defensiva, é claro.
Quando não tinha a bola, o time subia para pressionar, mas a defesa não acompanhava ou até recuava. Ficava, como tem ficado, um buraco. A questão era o São Paulo saber explorar.
Filipe Luís disse depois do jogo: "eles dominaram o meio-campo, sempre tinham um jogador a mais ali e isso forçou nossa defesa a recuar. Aí sempre sobrava um espaço entre as linhas"
É verdade. Mas tem sido verdade sempre, até quando o time joga bem.
Aos 17 minutos, o Flamengo foi punido justamente nesse espaço.
O SPFC troca passes no meio-campo, mas não há pressão na bola. Três adversários se colocam entre as linhas, mas o lançamento sai na esquerda. Quando Natan corta, é óbvio que o rebote é são-paulino naquele latifúndio.
Aí começa a segunda parte do jogo. O Flamengo parecia ter sentido o gol, deixou de encontrar espaços, alguns jogadores começaram a errar mais, mas o jogo ainda era equilibrado.
Dá até pra dizer que o Flamengo estava melhor.
Isso até o pênalti.
Aos 27 minutos, o árbitro precisa do VAR para ver um pênalti claríssimo que pode reestabelecer o Flamengo na liderança, coroando a atuação mediana, mas suficiente até ali.
Mas a péssima cobrança de Bruno Henrique abala o time como um terremoto. Começa aí a terceira parte.
O São Paulo passa a ser o time calmo, que controla o ritmo. Passa a controlar a saída do Flamengo — tanto a curta quanto a longa — e começa a rodar a bola. Não gera perigo, mas roda e começa a encontrar espaços...
O Flamengo parece perdido, torcendo pelo fim do primeiro tempo.
Não deu tempo de chegar no vestiário com um empate. Volpi dá um chutão, o Flamengo devolve a segunda bola, o SPFC troca passes de maneira quase despretenciosa na esquerda e sai o cruzamento.
Mais uma vez, a defesa está exposta. São 4-contra-4 na área.
Além de exposta, mal posicionada. GH não está virado para a bola, para o campo, ou colado no atacante. Está virado para o fundo, preparado para cortar APENAS um cruzamento fechado.
A bola vem nas costas e ele precisa dar TRÊS passos para ajeitar o corpo antes de tentar cortar.
Uma defesa exposta é forçada a jogar sempre no limite.
Mas a defesa do Flamengo — essa defesa do Flamengo — não pode jogar no limite.
Vão forçar e ela vai quebrar. Prova isso mais uma vez...
Ainda mais em momentos decisivos, contra times que têm qualidade.
Se já estava mal, a virada consolidou o momento ruim. O time voltou muito mal do intervalo.
Mais uma vez exposto, GH é facilmente envolvido por Brenner, que aciona Igor Gomes e o chute sai para fora. O escanteio mal marcado gera uma bola pingada na área e GH faz o pênalti.
A partir daí, acabou o terceiro momento do jogo. Na verdade, efetivamente acabou o jogo.
O Flamengo desanima, praticamente desiste e a quarta parte é meramente protocolar. Domenec começa a tirar os pendurados já pensando no próximo jogo.
Depois do terceiro gol do SPFC, nem precisa de análise. Não tem futebol para analisar.
O Flamengo simplesmente foi morrendo, o jogo foi ficando morto, mas mesmo assim deu tempo de perder um segundo pênalti e tomar mais um gol fruto de péssimo posicionamento da defesa.
Aliás, perder dois pênaltis em um jogo dá até gastrite, mas perder dois pênaltis batidos assim dói até na alma.
O Flamengo está no meio da principal sequência do campeonato. Essa sequência pode fazer o time perder o título ou ganhar o título.
São jogos decisivos que fazem a diferença. Até aqui, empate no último minuto contra o Inter e derrota acachapante hoje.
É claro que o pênalti consagra o goleiro, é a cereja do bolo.
Mas essa defesa aqui é a mais impressionante. É o que define Neneca com perfeição.
A primeira defesa é incrível. O reflexo, seriedade, precisão e explosão pro rebote são de outro mundo!
A maneira como ele reajusta constantemente o posicionamento é fenomenal. A cada movimento de um jogador do CAP, se recoloca e prepara para explodir.
Compare com Lomba. O goleiro colorado só se prepara para defender no último momento. Resultado: nem pula
Ele é muito grande, mas parece um grande boxeador, sempre com um jogo de pernas afiado, sempre calibrando a distância e perfeitamente atento a cada pequeno movimento do adversário. Tem um tempo de reação absurdo por isso.
Até aqui, uma trajetória absolutamente impressionante!
O Flamengo errou duas vezes na saída de bola, acabou cedendo dois gols ao Inter e despertou mais uma vez o debate sobre a saída de bola no futebol brasileiro.
Há quem ame, há quem odeie, mas minha sincera impressão é que daí nasce um debate que precisa ainda ser aprofundado.
Esse tipo de situação, a bola roubada lá na frente que gera perigo, não é novidade para o torcedor rubro-negro. A diferença é que nos acostumamos a ver o Flamengo do outro lado, sendo o time que faz a pressão e força o jogo a entrar em um ciclo perene.
Em 2019, isso era comum. Em 2020, o Flamengo se impôs contra o Corinthians, na semana passada, pressionando bastante no campo de ataque. Com um pós-perda muito organizado, o time parecia um enxame de abelhas. Apertava, recuperava e seguia atacando.
Assim que Domenec Torrent colocou a caneta no papel e assinou com o Flamengo, temi que um possível debate sobre o tal jogo de posição ficasse totalmente perdido.
Tentei, por isso, dar a minha singela contribuição lá atrás.
Um dos pontos importantes, inclusive, é esse: os analistas parecem ser mais dogmáticos que os próprios treinadores.
Domenec adapta suas ideias? Sim.
Isso é surpreendente? Claro que não.
Uma das características de quem quer trabalhar em alto nível é saber se adaptar.
Portanto, é muito estranha essa noção de que às vezes (normalmente quando dá errado), ele "manteve suas convicções" e em outras vezes (quando dá certo), ele "abriu mão do que acredita".
As falas do próprio Domenec antes de chegar ao Fla indicavam um caminho de adaptação...
Com o time praticamente titular, gramado excelente, alguns jogadores mais descansados e opções no banco, o contexto um pouco mais favorável fez o Flamengo nadar de braçada contra o Corinthians.
Nenhum rubro-negro ficou feliz com o empate contra o Red Bull Bragantino. Dentro de um contexto surreal, os três pontos e a liderança provisória seriam importantes para a sequência que vem a seguir...
Desde a viagem para o Equador, há exatamente um mês, o rubro-negro não teve um dia de paz. O surto de coronavírus, uma série de lesões, uma sequência insana de jogos, convocações...
Em uma temporada já atípica, o Flamengo viveu um mês de pandemônio.
Neste mês, o Flamengo conseguiu seis vitórias e dois empates. Resultado exemplar, até acima do esperado com tantos problemas.
Mesmo assim, não dá para deixar os resultados mascararem o desempenho: o time teve maus momentos em todos os jogos e mostrou que ainda precisa evoluir.