É incrível a capacidade da Falha de tirar o corpo fora dessa "polarização".

Como o dever do historiador é lembrar o que os jornalões querem esquecer, segue uma compilação de evidências que mostram como a imprensa criou essa "polarização":
Quem lembra da ficha falsa da Dilma no DOPS, que ganhou capa de jornal? Isso foi em 2009, vejam bem.

"Fake news" antes do Whatsapp.
E quando noticiavam as delações premiadas na capa? Algumas dessas delações foram descartadas já pelo próprio MPF.
Capas como essa criaram a ideia de que Dilma e Lula sabiam de tudo e eram os grandes vilões da política.

O doleiro Youssef, por conta desse acordo premiado com a PF, já pode voltar a trabalhar com dólar.

O MPF não conseguiu provar que Lula sabia de nada. Muito menos Dilma.
A cobertura dos atos pelo impeachment feitos pela imprensa eram basicamente convocatórias. Tinham que cuidar para monarquistas e integralistas não aparecerem nas imagens e, claro, enaltecer os protestos.

"Maior da história", vejam bem...
Em alguns casos, a montagem das capas era meticulosamente pensada. Janot, procurador da República que ameaçou atirar contra um ministro do STF, fez a denuncia contra Lula e Dilma.

Na foto abaixo, com letras miúdas, as malas de Geddel, ministro de Michel Temer.
Em outros casos, a coisa depende de uma semiótica mais sutil mesmo. A foto de Dilma na sombra da chama/fogueira é certamente mais elegante que os adesivos obscenos dela colado nos automóveis dos partidários do impeachment.

Mas não muito melhor.
Por fim, só para dar uma palhinha, uma análise atenta dos editoriais talvez seja muito mais contundente como evidência de como os jornalões construíram a chamada "polarização".

Esse é do Estadão, março de 2016.

(Destaque para as tags)
Bônus: como o discurso de "polarização" é raso, é bom lembrar que a extrema-esquerda nem sequer chegou perto do poder durante esse período. Mas a extrema-direita, que agora governa, teve campo livre para se organizar graças aos jornalões.

Um exemplo: a declaração de Bolsonaro...
...no dia da votação do Impeachment, saudando o coronel Ustra, notório torturador da ditadura.

Qual jornal noticiou isso com destaque?

Nenhum.

Podem dizer que a grande notícia era o impeachment de Dilma, pelo qual torceram fragorosamente.
Torceram tanto que acharam por bem não dar destaque pela defesa pública de um torturador no voto contra uma ex-presidente torturada.

Cimentando, assim, o caminho pelo qual Bolsonaro poderia ser eleito presidente em 2018.
Em outras palavras, a Folha, o Estado de São Paulo e o Globo foram agentes dessa suposta "polarização" e normalizaram o antipetismo, o anticomunismo e o bolsonarismo.

Seu lamento não me comove. Prefiro seguir tomando meus cafezinhos.
PS: tem muitas outras capas e editoriais. Pessoal da comunicação já tem feito trabalhos sobre isso e não vale aqui me alongar.

Mas quem quiser dividir umas fotos de jornalões na década entre 2011 e 2020 e seu papel na "polarização", be my guest.

• • •

Missing some Tweet in this thread? You can try to force a refresh
 

Keep Current with Fernando L'Ouverture

Fernando L'Ouverture Profile picture

Stay in touch and get notified when new unrolls are available from this author!

Read all threads

This Thread may be Removed Anytime!

PDF

Twitter may remove this content at anytime! Save it as PDF for later use!

Try unrolling a thread yourself!

how to unroll video
  1. Follow @ThreadReaderApp to mention us!

  2. From a Twitter thread mention us with a keyword "unroll"
@threadreaderapp unroll

Practice here first or read more on our help page!

More from @louverture1984

27 Nov
10 livros para mostrar como capitalismo e racismo andaram juntos.

Cc. Livres.
1) Capitalismo e escravidão. Eric Williams.
2) A queda do escravismo colonial. Robin Blackburn.
Read 15 tweets
25 Nov
Gosto de pensar que quem me segue tem mais de dois neurônios funcionais, mas só para deixar óbvio.

A China não ameaçou o Brasil. Ela só disse que enquanto o filho do presidente ficar insuflando a extrema-direita para criticar o seu governo, eles...
... têm todo o direito para romper, ou mesmo recusar acordos bilaterais com o Brasil.

"Ai, mas não pode criticar".

Pode, claro. Assim como a China também pode não vender para o Brasil. Livre expressão, livre mercado, não é isso que tanto defendem?
Lembrando que a China já vem sinalizando que quer ficar menos dependente da soja brasileira nos próximos anos.

amp.scmp.com/news/china/dip…
Read 5 tweets
24 Nov
Respeito, mas discordo dessa ideia de civilização milenar. Pressupõe uma unidade inquebrável do que é a civilização chinesa, uma continuidade que deixa todas as rupturas opacas.
Mais: essa ideia de que possuem seus próprios valores e princípios éticos pode ser enganosa. Em relação a quem estamos falando? Ao Brasil, que também possui os seus próprios valores?
Aliás, isso me lembra um causo: no filme Corações e Mentes (1974), um general americano justifica os bombardeios no Vietnã alegando que os "orientais" possuem outros valores em relação à vida, à morte e a moral...
Read 7 tweets
22 Nov
Fiozin de domingo: Que o Jair é péssimo aluno de História, não é surpresa. Mas essa versão de uma natureza pacífica brasileira e que são elementos "políticos" ou "estrangeiros" (como disse o Mourão) que importam os conflitos é tão velha quanto o próprio Brasil.
Já na primeira constituinte a gente tem a elite senhorial brasileira apavorada em relação ao Haiti. Como Célia de Azevedo aponta, em "Onda negra, medo branco", o temor de que os conflitos vindos de fora acabassem com o Brasil ordeiro estavam na origem do país.
O @marcosvlqueiroz , que pesquisa sobre o tema, pode dizer melhor do que eu, mas a verdade é que isso resultava num paradoxo: o grosso da mão-de-obra vinha de fora, com milhares de homens e mulheres escravizados.
Read 13 tweets
20 Nov
O simbólico inexiste nesse país sem metáforas, em que um homem negro de 60 anos é espancado até a morte.

Essa é a Porto Alegre que elegeu a bancada mais negra da sua história, não faz cinco dias...
Lembro de amigos negros relatando coisas horríveis que passavam quando entravam em um supermercado, como o próprio Carrefour. O assédio e as violências simbólicas tavam sempre ali...
Lembro deles e sinto um aperto... Não podiam ser eles, então, sendo espancados até a morte por seguranças privados?

Hoje é 20 de novembro...e homens e mulheres negros não podem nem ir num supermercado em paz.
Read 5 tweets
6 Nov
Sinceramente, eu entendo essa ideia de igualar democratas com republicanos para quem não é americano. Mas há diferenças entre imperialismo em suas formas mais fascistas e um imperialismo que se mostra como "não-imperialista".
A diferença se dá na nossa própria correlação de forças políticas. Sem Trump, Bolsonaro poderia se tornar o fenômeno político que se tornou? Talvez sim, mas seria por outros meios e caminhos.

Trump e o trumpismo alargaram o campo do possível na política dos EUA.
E, consequentemente, em toda a América Latina. O chamado "populismo de direita" ganhou representação política em quase toda América do Sul, ainda que só no Brasil e nos EUA ele triunfou eleitoralmente.
Read 9 tweets

Did Thread Reader help you today?

Support us! We are indie developers!


This site is made by just two indie developers on a laptop doing marketing, support and development! Read more about the story.

Become a Premium Member ($3/month or $30/year) and get exclusive features!

Become Premium

Too expensive? Make a small donation by buying us coffee ($5) or help with server cost ($10)

Donate via Paypal Become our Patreon

Thank you for your support!

Follow Us on Twitter!