Como você lida com as coisas: impõe seu jeito ou se adapta à situação?

O Palmeiras se adaptou.

E saiu da Argentina com uma vitória construída a partir de um ajuste de Abel Ferreira: uma linha de cinco defensores.

Como Abel chegou nessa ideia? Por que deu certo? Segue o fio 👇
Quando você procura se adaptar às situações da vida, o mais importante é ler bem o momento. Entender o adversário e mapear seus pontos fortes e fracos.

Analisar.

Esse jogo não começou ontem. Começou nas reprises que Abel Ferreira e sua comissão assistiram nos últimos dias.
Nas reprises, Abel viu que o River tem um ponto muito forte. Um mecanismo que cria diversas situações de gol.

São as tabelas por dentro. Ignazio, Suárez, Borré, De La Cruz e Carrascal jogam próximos, tocam rápido e giram para tirar um zagueiro de lugar e abrir espaço na área.
A própria escolha do esquema de Gallardo, o 4-1-3-2, é feita para potencializar esse mecanismo.

Enzo Pérez faz a saída de três. Laterais dão amplitude.

O resto brinca de jogar curto, arrastar zagueiro da área e criar espaço. É assim em 2020, 2019, 2018...modelo de jogo!
Abel queria neutralizar as tabelas e escolheu montar uma linha de cinco defensores bem nítida no jogo: Menino como ala e M. Rocha como zagueiro.

Matemática: 5 defensores contra os 5 por dentro do River. Se Danilo ou Patrick ajudassem, o Verdão tinha superioridade numérica aí.
Mas a real sacada foi na forma como essa linha neutralizou as tabelas.

O que é uma tabela? O famoso "2-1" que escutamos nas escolinhas de futebol?

É uma forma de criar espaço atraindo um jogador na bola e tocando para quem se desloca naquele espaço.
Imagina assim: você está com a bola e quer ir para frente. Então toca para um companheiro e corre para frente.

O companheiro que recebe vai, em 99% dos casos, chamar um marcador. Alguém vai deixar um espaço e tentar roubar a bola.

Se você recebe a bola naquele espaço, já era.
O que a linha de cinco do Palmeiras fez foi impedir que quem saía para pressionar a bola desse espaço. Se Marcos Rocha saía, dois zagueiros estavam lá para cobrir ele. Se Viña saía, três caras estavam protegendo a área.

Aqui, o River se prepara para tabelar na frente do gol.
Veja que o jogador que está com a bola posiciona o corpo em lateral para tocar e correr no espaço. Rony e Patrick já começam a correr para pressionar a bola, mas eles estão um pouco distantes.

A única forma de impedir que o adversário receba é um zagueiro caçar lá no meio.
Pois é exatamente o que acontece. Quem pressiona a bola é Marcos Rocha, que deixa a linha de defesa.

Desorganização? Que nada. Intencional!

Marcos só pressiona porque sabe que o Palmeiras tem mais quatro atrás para criar uma outra zona de cobertura nas tabelas do River.
Ter esses quatro jogadores é muito, muito importante. Se o Suárez se desmarca, Gómez poderia acompanhar e Empereur ficaria na cobertura. Tem Menino e Viña para cobrir a área se algo der errado.

A linha de cinco criava várias muralhas ao River Plate: pressão na bola, cobertura...
Acontecia pelo lado esquerdo também. Quem saía da linha e pressionava, como Viña aqui, ganhava uma cobertura imediata.

E assim o Palmeiras ficava seguro. Mantinha a identidade de ir correndo pressionar a bola, mas não abria espaço lá atrás.
Agora que você entendeu a lógica, é preciso ver o que deu certo e o que deu errado. Isso é analisar: de forma fria, sem ficar criando narrativa.

O River foi bem superior nos quinze minutos iniciais....porque conseguia quebrar a tal linha de cinco que o Abel tinha feito.
Quebrava como? Jogava mais direto e conseguia criar uma indefinição em Gabriel Menino, que estava distante de Marcos Rocha.

Como o Marcos entrou programado para caçar quem estivesse perto, ele fazia isso mesmo sem a proteção de Menino, como aqui.
O resultado era que o Palmeiras perdia aquela outra barreira de proteção quando alguém saltasse dos cinco defensores. Gómez e Empereur tinham que caçar mais, sair mais da área e deixar espaços que o River quase aproveitou, como nesse lance.

Puramente tático.
Cada jogo tem uma história. Abel viu tudo isso, e lá pelos quinze minutos, ajustou o Palmeiras.

Puxou a linha de defensores para baixo e compactou o time. Assim o River ficou mais com a bola, tentando jogar por dentro.

E Rocha podia pressionar sem se preocupar, como na imagem.
Ok, essa foi a estratégia. Agora entram os gols. Fruto do elenco mais forte do que Luxemburgo pensava, com Rony se projetando e acreditando no rebote para abrir o placar, o pivô magistral de Luiz Adriano no segundo gol e a bola parada à lá Borussia.

Detalhes formam o placar.
Esses detalhes o treinador não controla.

Ele controla a estratégia. Que começa no estudo do adversário, vai pro treino, é conversado e debatido com os jogadores e depois executado em campo. Quando o jogo acaba, o técnico revê a partida e olha o que deu certo e o que deu errado.
Por isso precisamos falar mais dessas estratégias. Do modelo de jogo de um e do que o técnico fez para neutralizar. Se deu certo ou não, é do jogo...

Deu muito certo ao Palmeiras.

É uma vitória imensa, inquestionável.

É 3 a 0 no River, na Argentina. Histórico.
Uma vitória que começa ainda em 2020. Na salinha da análise de desempenho. No café do treinador com sua comissão. No estudo do adversário e na busca por maneiras de enfrentá-lo. Um jogo que começa na mente do técnico do Palmeiras, Abel Ferreira.
Essa thread está publicada lá no meu blog no @geglobo com muito mais detalhes, imagens e explicações da linha de cinco defensores e de como ela neutralizou o River Plate. Dá uma lida👇

glo.bo/3955lj7

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