Luan e Isla, separados por quilômetros e dias, foram eleitos culpados pelos gols sofridos por Palmeiras e Flamengo no final de semana.
Quando alguém erra, o que é mais produtivo fazer: eleger o culpado e pronto ou entender o motivo do erro?
Segue o fio pra pensar um pouco 👇
Vivemos numa cultura que individualiza e dramatiza a culpa como causa dos nossos insucessos.
Se existe um dano, você aponta o culpado e basta eliminar a causa de todo o mau que tudo segue seu curso regular e virtuoso.
É o que acontece em todas as eleições, por exemplo.
A psicologia aponta que eleger culpados é uma forma inconsciente de lidar com a frustração. É uma defesa da mente, como se fosse um muro criado para livrar um pouco a carga de reflexão e desprendimento que a aceitação do erro leva.
Estamos falando de um movimento muito humano.
O futebol é tão coletivo e interdependente (assim como a sociedade, a política e até nossa vida) que, no fim a falha de Luan e Isla são apenas um fragmento de um amontoado de erros.
É preciso entender esse amontoado para entender o erro.
No caso de Isla, ele se afasta do alinhamento defensivo para marcar Claudinho, que joga como ponta-esquerda e está sempre buscando o centro. Éverton Ribeiro marca o jogador que aproxima.
Aqui o Flamengo cumpre seu objetivo, é fechar a área. Tanto que o Bragantino recua a bola.
Como reinicia a jogada, o Braga faz a saída de três com Raul entre os volantes e Éverton Ribeiro deixa aquele lado e circula por dentro.
Começa aqui o amontado de erros. Bruno Henrique e Gabigol deixam o Braga fazer a saída com bastante conforto e virar o lado.
O Flamengo, com Ceni, se caracteriza por uma marcação bem agressiva. Nem sempre o time mantém isso, porque o cansaço bate e nesse momento, a equipe escolheu marcar numa linha mais baixa.
Tudo bem...
A questão é que a troca de lado com muito conforto "engana" Éverton Ribeiro.
Engana pois ele resolve encostar em Uillian Corrêa e não percebe que o Braga está MUITO organizado para atacar com um jogador bem aberto do outro lado.
Mas isso não seria problema se Bruno Henrique e Arrasca pressionassem Léo Ortiz.
Lembra que o Flamengo estava jogando num bloco mais baixo? A ideia é proteger a área. Léo invadiu o campo do Flamengo e tinha que ser pressionado. Arrasca e Bruno demoram, e o zagueiro faz um lançamento brilhante vendo a amplitude do outro lado.
Éverton, que ficou muito por dentro, era o único jogador do Flamengo que poderia neutralizar a amplitude. Se Isla fizesse isso, ele deixaria o artilheiro do Brasileirão totalmente livre.
Ele vê o lançamento e busca neutralizar rapidamente...mas a curva da bola vence ele.
É muito fácil dizer que Isla falhou. É muito cômodo, porque a decepção pelo empate que tirou o Flamengo da liderança ganha um rosto.
Agora, não é melhor entender por que ele não alcançou a bola?
Assim, no próximo treino, o técnico corrige o posicionamento de todo o time.
Com Luan é ainda mais grave: ele fez um pênalti na semifinal do Mundial. É claro que ele falhou, e ninguém está falando diferente.
A questão é o porquê das coisas.
Por que Luan fez o pênalti? O que precisa ser arrumado para ele não ser exposto daquele jeito?
Vendo a jogada, quem tem a bola é o Palmeiras, que sai jogando com a dupla de volantes por dentro. Eles tentam criar uma tabela para que Zé supere Carioca e Pizarro.
Só que Zé, sozinho, perde a bola. Há um espaço imenso na costas dos volantes que o Palmeiras, o time, não ocupa.
Teoricamente era Veiga que deveria aparecer por lá. Mas o Menino poderia surgir, o Luiz Adriano também.
Fato é que Zé buscou resolver um problema que o jogo lhe deu e não conseguiu. Aí o Palmeiras tem que trocar de mentalidade (estamos atacando, agora vamos defender).
Carioca e Aquino trocam quatro passes bem curtos.
Esse toque de primeira, que a gente vê tanto em times europeus, tem um sentido claro: dar tempo para que o time se reorganize no ataque.
Quem ultrapassa é o lateral, que vê espaço entre os volantes e a linha defensiva.
Perceba a situação: volantes não pressionam a bola, linha defensiva está exposta. Hora do Palmeiras encaixar a marcação e manter todo mundo pressionado. Veja que Gómez já começa a sair da defesa para evitar que aquele jogador receba livre.
Só que Gignac e Aquino se movimentam TANTO que Gómez acompanha e fica meio atordoado. Não consegue botar o pé na bola, não impede.
Veja que Zé e Danilo perderam a bola, deixaram Carioca livre e estão parados, mesmo com a área precisando de cobertura com Luan e Rocha sozinhos.
Não apenas os volantes, mas Veiga chega atrasado na marcação do lateral que ultrapassou e Aquino consegue girar o corpo com a bola dominada. Viña, que cuida daquele setor, apenas vê e não diminuiu o espaço.
É um amontoado de erros.
Quem individualizar?
Quem culpar?
O mérito do lateral do Tigres é tão grande nesse lance que ele se desloca por dentro, para confundir ainda mais Viña e sair da zona de Veiga. Aquino dá o passe para ele, que toca para a área.
Luan, que ficou sozinho no lance, não tinha outra opção ao tentar parar o desmarque.
E perceba Zé e Danilo. Continuam longe da área num momento muito crítico, quando o melhor zagueiro do Palmeiras teve que sair para marcar um atacante móvel como Gignac.
E se eles, ou ao menos um só, tivesse fechado a área? Luan não teria a necessidade de puxar a camisa.
Luan cometeu o pênalti, e isso não muda.
Mas ao invés de simplesmente tirar ele do time, não é melhor entender a cadeia de situações que o levou a tomar uma decisão equivocada?
Assim o técnico corrige toda a situação, ao invés de descartar um jogador...que é uma pessoa.
Penso ser normal e natural de um esporte que mexe com a paixão do torcedor que existam sempre os vilões, os culpados, aqueles que "entregaram".
Mas a real é que está cada vez mais difícil apontar culpa sem entender a situação por completo. Sabe o que isso chama? Julgar.
Não vejo BBB, mas acompanho por tabela nas redes sociais, e parece que a tal da "turma do mal" fez isso com o cara lá que pediu pra sair. Já com política, veja o que aconteceu culpar um lado e tirar ele sem delonga.
Julgar sem entender é a pior coisa que podemos fazer.
O exercício de apontar vilões jamais irá mudar. Na dramaturgia, o vilão muitas vezes é mais interessante e corajoso do que conseguimos ser. No futebol, ele é muito cômodo, pois dá um alívio para a frustração cortante da derrota.
Mas sempre será mais produtivo fugir do julgamento barato e entender a situação por completa.
Luan e Isla erraram.
Mas estão longe de serem os únicos culpados num esporte que impossibilita análises individuais sem levar o coletivo em conta como o futebol.
Quando um time joga mal, um clichê comum é dizer que "falta padrão de jogo". Que o time é uma bagunça.
É o que acontece no Flamengo.
Mas não é pelo tal do padrão. O Flamengo tem uma ideia de jogo, até que bem clara. Só que ela não tá sendo executada como deveria. Segue o fio👇
Primeiro de tudo, o que é esse tal de padrão de jogo?
Diz o dicionário que o termo "padrão" significa "Aquilo que serve para ser imitado como modelo; protótipo".
Logo, padrão é algo a ser seguido. Algo para se espelhar e REPETIR ao longo do tempo.
Padrão é algo para você se basear.
Um padrão de jogo é um posicionamento ou movimentação que os jogadores devem seguir nos momentos do jogo (ataque, defesa, transição) para todo mundo chegar no mesmo objetivo: a vitória.
Você já parou para pensar como que técnicos, analistas e jogadores trabalham for do jogos?
Como que é o dia-a-dia quando ninguém está vendo?
O técnico Maurício Barbieri eu uma pista dessa rotina: é feita de estudo e treino visando unicamente uma coisa: a vitória. Segue o fio 👇
Todo mundo no futebol quer vencer. Não existe uma única alma que não se empenhe ou entre em campo para perder.
Vencer é o que nos move. Todos querem, só que só tem pra um time.
Então o que resta é tentar. Chegar perto. Fazer o máximo para alcançar os três pontos.
O futebol não seria apaixonante se ele não fosse tão subjetivo assim. No fim você não tem muita fórmula ou jeito de fazer as coisas certas. Você tem que unicamente tentar.
E uma das formas de tentar é estudar o adversário e procurar, antes do jogo, formas de vencê-lo.
Como você lida com as coisas: impõe seu jeito ou se adapta à situação?
O Palmeiras se adaptou.
E saiu da Argentina com uma vitória construída a partir de um ajuste de Abel Ferreira: uma linha de cinco defensores.
Como Abel chegou nessa ideia? Por que deu certo? Segue o fio 👇
Quando você procura se adaptar às situações da vida, o mais importante é ler bem o momento. Entender o adversário e mapear seus pontos fortes e fracos.
Analisar.
Esse jogo não começou ontem. Começou nas reprises que Abel Ferreira e sua comissão assistiram nos últimos dias.
Nas reprises, Abel viu que o River tem um ponto muito forte. Um mecanismo que cria diversas situações de gol.
São as tabelas por dentro. Ignazio, Suárez, Borré, De La Cruz e Carrascal jogam próximos, tocam rápido e giram para tirar um zagueiro de lugar e abrir espaço na área.
Rony é o melhor jogador do Palmeiras, semifinalista da Libertadores.
É quem mais cresceu com Abel Ferreira, que melhorou o time no resultado, desempenho e nos detalhes.
Sim, detalhes, como a posição do corpo do Rony ao receber a bola, explicam essa crescente. Segue o fio 👇
Quando a gente assiste um jogo, por diversão ou não, é natural olhar só a bola. Ela é o centro do jogo! Valorizamos o que ele faz, como maneja e controla.
Mas lembrem: futebol é interação. Quem tem a bola depende de quem não a tem para o time continuar o jogo e chegar ao gol.
Vamos fazer um teste?
O que você espera desse lance aqui? Que o Veiga, que tá com a posse, faça algo de mágico: drible todo mundo, dê um super lançamento ou ao menos uma troca de passes rápida que torne o time bonito, certo?
É o que separa a atuação do São Paulo contra a LDU, que custou vaga na Libertadores, do 4 a 0 no Botafogo que reforça a liderança do Brasileirão.
O elenco é o mesmo, o técnico é o mesmo....
Sabe o que mudou?
O tempo. Logo ele, que teimamos desrespeitar. Segue o fio👇
Para muitos, futebol é um exercício simples onde 22 pessoas chutam uma bola até fazer o gol. Então basta contratar as melhores pessoas em cada tarefa dentro de campo (que são as posições), juntá-las e pronto! O time vence. Não é errado pensar assim, parece uma conclusão lógica.
Só que precisamos lembrar que o futebol é uma atividade humana. Seria muito mais fácil se não tivessem pessoas na equação, com suas diferenças, visões e mentalidades diferentes. Então não basta simplesmente juntar os bons. É preciso que eles formem um time.