A fala da Mãe Aline sobre as atitudes de sua filha de axé, a Lumena, sintetiza - ao mesmo tempo - uma das coisas que mais aprecio no fundamento e ataca um dos maiores problemas que temos hoje.

Certeira de uma forma que só uma ialorixá consegue ser.

bahia.ba/entretenimento…
É uma mensagem que fala sobre respeito e acolhimento. Respeito pelo tempo de cada um e pelo "direito" de errar, mais do que isso, sobre como o erro faz parte do processo de aprendizado. Por isso, aqueles que erram devem ser acolhidos e não excluídos, destruídos.
"Eu não concordo com o que ela falou ontem, eu assisti, mas por uma questão ética como mãe de Santo eu não posso virar as costas para um filho”.
E esse é um ponto crucial, uma ialorixá, um babalorixá, não são pessoas inalcançáveis, perfeitas, eles são modelos, exemplos de caminhos que nós, os mais novos, devemos seguir. No meu barracão, inclusive, se diz, "é aquele com quem caminhamos juntos".
Ou seja, sua atitude não é a de alguém superior, moralmente superior - como diz o bordão da internet de maneira jocosa, sempre -, sua atitude apresenta um modelo ético que podemos seguir no rumo do entendimento do mistério, do axé.
Uma matriz religiosa que se caracterizou por acolher os excluídos: dos excluídos, pelos excluídos e para os excluídos. Excluir não pode fazer parte do seu fundamento.
Penso aqui no itan onde Oyá chama Omulu, coxo, que tinha o corpo coberto de palhas por conta de suas chagas, para dançar o xirê. Mas poderiam ser outros, por exemplo, quando Oxalá (ou Obatalá) se recusou a fazer as oferendas para Exu no começo do mundo.
Este é um "erro" que, inclusive, fundamenta o preceito dos iniciados em algumas casas - não poder tomar café, sal, etc...
A fala da Mãe Aline fala, inclusive, sobre isso, sobre as outras vidas de sua filha de santo, da sua bagagem enquanto DJ, enquanto psicóloga... nada disso foi motivo de exclusão, muito pelo contrário, segue como motivo de acolhimento.
Um ponto importante: ela deixa claro que Lumena não é uma autoridade religiosa, pois, de fato, poucas pessoas o são. E ainda assim, ser uma autoridade religiosa numa religião de matriz africana significa algo bem distinto do que ser uma autoridade cristã.
Existe uma frase que aprendi e carrego para a vida: cada casa é um caso. Isso significa que o que acontece em um barracão (uma roça, um terreiro) não pode servir de modelo para o que acontece em outro.
Você pode ter dois candomblés que tiveram origem na mesma casa, as ialorixás (ou babalorixás) foram egbomi da mesma roça, no mesmo tempo, podem até ter sido irmãs (irmãos) de barco. As duas casas vão ser diferentes e não há nada de errado disso.
Desde que tudo tenha seu fundamento, naturalmente. Mas fundamento é diferente de escritura. E as casas, os cultos, os toques, se transformam, se adaptam conforme chegam os filhos e filhas de santo, conforme o espaço, conforme as próprias entidades.
Inclusive, esse é um ponto fundamental: tratam-se de religiões do múltiplo e não do um. Exu, aquele que vem na frente, é o senhor do espaço incriado, do mundo onde tudo ainda pode ser outra coisa: e esse é o próprio princípio do nosso mundo.
A nossa cosmogonia não começa na imposição do criação, da imposição de uma forma, uma identidade univoca ao cosmos, ela começa no espaço incriado. Por isso Oxalá (ou Obatalá) é alertado de que tem que fazer uma oferenda a Exu para que possa criar o mundo.
Eu, quando falo dos orixás no @BenzinaInc ao lado da @stephieborges, não falo enquanto autoridade religiosa - ser ogã é um cargo de responsabilidade e não de autoridade -, falo sobre como os orixás me convidam a imaginar uma outra forma de existir.
Contudo, sempre, sempre saliento de que o meu entendimento é o meu entendimento, de que se trata do resultado dos meus estudos, daquilo que aprendi com minha tia e/ou com os babás e ialorixás dos terreiros pelos quais (e nos quais) caminhei.
Sempre temos o cuidado de dizer "cada casa é um caso". Melhor, temos o respeito de lembrar disso. Pois isso foi uma das primeiras coisas que aprendi: não cabe a mim julgar se passa na casa dos outros.

Pelo contrário, acho fascinante como o axé se transforma.
Por isso a fala da Mãe Aline é tão precisa: ela nos alerta para esse fato, Lumena não participa do programa enquanto autoridade, mas ela tem responsabilidades pelo que fala e faz, e por isso vai ter que ouvir quando sair. E quem é do santo sabe o que isso significa.
E esse é um ponto que nós, que somos do axé, temos que levar para a vida, independente de nossos cargos, tempo de iniciação, não estamos no mundo enquanto autoridades, não nos cabe evocar isso. Contudo, temos responsabilidades e podemos/devemos ser cobrados por isso

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12 Feb
Para bom entendedor: trechos do livro do Villas Bôas deixam claro que (1) existia um "clamor" intervencionista entre empresários, (2) que a declaração sobre o julgamento do Lula foi feita com a alta cúpula e (3) tudo começou como uma reação à CNV.

outline.com/fLBA4N
Eu digo, insisto e repito: a primeira articulação virtual, implementação de táticas de ocupação de redes sociais que vi, no Brasil, foi justamente acompanhando grupos de intervencionistas em 2014, quando coordenava os trabalhos do GT Araguaia na CNV.
Na época vi uma verdadeira operação de contrainformação sendo montada na internet para conter o avanço do debate público e disseminação do material coletado e analisado pela Comissão Nacional da Verdade.
Read 12 tweets
10 Feb
Eu até compraria essa ideia de que o casting do BBB foi feito sob medida para esvaziar pautas sociais se todo santo dia, absolutamente todo santo dia, não tivéssemos exemplos de militantes agindo daquela mesma forma (e em absolutamente todas as causas/pautas).
Outro dia, inclusive, falávamos sobre isso por aqui, sobre como confundimos as redes sociais com "espaço público", ao ponto de achar saudável expor debates importantíssimos - como conflitos intrapartidários - ao escrutínio do algorítimo.
E esse me parece o ponto, tem pelo menos uma década que os debates políticos, as pautas sociais, a militância vem sendo afetada pelo sua relação com as redes sociais: um ambiente que estimula a beligerância, o voluntarismo e o personalismo.
Read 11 tweets
9 Feb
Nada do que está acontecendo no BBB é acidente (talvez apenas a desistência do Lucas): o casting da emissora foi preciso, seu intento era justamente criar esse espetáculo grotesco que estamos vendo ai.

Pois o ódio é o afeto que mais engaja.
Sempre bom lembrar de como nos últimos anos, políticos se elegeram dessa forma: Bolsonaro, Trump, etc.... todos eles cresceram mobilizando o ódio, tanto de seus apoiadores quanto o de seus contrários.

E esse é um efeito direto das redes sociais nas nossas vidas.
Sabemos, o algorítimo, a estrutura que organiza as redes, não registra se estamos falando bem ou mal de algo, registra apenas que se trata de uma interação - ou uma "meaningful interaction", como afirma o Facebook. E isso tem diversos efeitos.

fastcompany.com/90321304/faceb…
Read 20 tweets
9 Feb
Toda hora é um vídeo novo de pessoas ridicularizando as religiões de matriz africana no Big Brother, com direito a participação de quem se diz do axé, né?
Se tem uma coisa que se aprende em um barracão, talvez uma das mais fundamentais, é a de que, independente dos seus problemas ou diferenças com alguém, é fundamental respeitar os/as orixás e os/as guias daquela pessoa.
Eu, como ogã, por exemplo, jamais poderia me recusar a tocar para o/a orixá (ou entidade) desta ou daquela pessoa só por não concordar com as suas atitudes, jamais poderia me recusar a bater cabeça para ele. Zombar deles então, totalmente fora de cogitação.
Read 4 tweets
8 Feb
Eu amo o bairro onde nasci, subúrbio do Rio de Janeiro, e por isso vivo nele até hoje (não é uma escolha política, é de vida mesmo), mas se tem uma coisa que me consome é o medo constante de ser mais uma vítima aleatória da competência (sim!) policial.

g1.globo.com/sp/sao-paulo/n…
Quem mora em favela, periferia, subúrbio sabe muito bem como as ações da PM se desenham. Não importa a hora, não importa o local, a PM vai fazer o que sabe fazer (aquilo que foi criada para fazer), atirar para matar.

noticias.uol.com.br/cotidiano/ulti…
Pois foi para isso que as PMs foram "redesenhadas" durante a Ditadura Militar. A força auxiliar tem um papel muito específico na estratégia da guerra revolucionária (utilizada pela Ditadura): "procurar e destruir"

brasil.estadao.com.br/noticias/geral…
Read 16 tweets
7 Feb
Esse BBB realmente virou o espetáculo do grotesco, da violência e dos microfascismos que as "esquerdas/progressistas" secretam cotidianamente, pior, secretam utilizando as "boas causas" como desculpa.
Nada melhor do que ter uma boa causa como desculpa para exercer, secretar todo tipo de violência que costumamos atribuir ao que supostamente estão do outro lado do muro do espectro político.
O pior de tudo é que isso, esse espetáculo grotesco, esse massacre, é o cotidiano das redes sociais. Qualquer um que não chegou ontem aqui já deve ter visto centenas de episódios semelhantes.
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