A ciência fala que o "tratamento x" não tem eficácia, mas quem usa ou prescreve esse tratamento diz que tem efeito sim.
E agora? Por que isso acontece com tanta frequência?
Tá na hora de entender a diferença entre a "eficácia científica" e a "eficácia coloquial".
Segue o fio!
Sai um estudo dizendo que o "tratamento x" não se mostrou eficaz para uma condição. Alguém publica essa notícia nas redes sociais.
Aguarde alguns segundos ou minutos e vai brotar nos comentários:
" Eu usei e funcionou"
"Sempre prescrevi e meus pacientes tem bons resultados"
Etc
Isso acontece porque popularmente dizemos que algo tem efeito quando observamos alguma melhora subjetiva após usar esse tratamento.
Já cientificamente, só podemos dizer que algo tem efeito, quando os efeitos observados são superiores aos observados em um grupo controle adequado.
Vamos supor que, após usar o "tratamento x", 60% das pessoas relataram algum grau de melhora no seu problema.
Legal. Mas foi o tratamento que fez isso?
"Claro que foi André, senão o que mais poderia ser?"
Poderia ser muita coisa. Olha só:
1) História natural da doença: São raras as doenças que evoluem sem possibilidade de reação. Nosso corpo tem capacidade de se se adaptar às adversidades e muitas vezes melhoramos sozinhos, como no caso da evolução natural de um resfriado ou períodos de melhora ou piora da asma.
2) Efeito Hawthorne: pessoas mudam comportamento quando sabem que estão sendo observadas. Só de saber que está sendo acompanhado por um profissional de saúde, pacientes podem melhorar hábitos de vida, aliviando sintomas. Ou dizer que melhoraram para não decepcionar o profissional
3) Regressão à média: parâmetros biológicos se agrupam ao redor da média e tendem a reduzir sua frequência conforme se afastam dela. Ou seja, uma pressão muito alta hoje, provavelmente estará mais baixa amanhã e vice-versa. Independentemente do uso de uma medicação...
4) Efeito placebo: Parte dos pacientes pode referir melhora da dor pelo fato de acreditar na intervenção e esperar melhorar com ela. O que se costuma chamar de "efeito placebo" é, na verdade, a soma de todos esses (e outros vieses) que a gente confunde como sendo eficácia.
Por isso que de maneira popular, tudo isso fará com que a pessoa ache que exista um efeito. Mas para a ciência, só há efeito, quando o tratamento é superior a todos esses vieses que nos confundem.
Por isso precisamos de um grupo controle adequado.
A eficácia intrínseca é aquela que supera todos esses vieses. Quando não supera, dizemos que a intervenção é ineficaz. Mesmo que pacientes e profissionais subjetivamente achem que houve efeito, muitas vezes apenas foram confundidos por esses vieses.
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Hoje quero convidar vocês a valorizarem um dos mais importantes instrumentos de justiça social já produzido no Brasil: o Sistema Único de Saúde.
Mesmo em meio a crises e a seu constante subfinanciamento, o maior sistema de saúde do mundo promove inclusão social e contribui com o aumento da longevidade e qualidade de vida da população, beneficiando a todos, mesmo aqueles que acreditam nunca terem usufruído de seus serviços
Em meio a pandemia, devemos lembrar que fazem parte do SUS os centros e "postos" de saúde, hospitais, laboratórios, hemocentros, bancos de sangue, além de institutos de pesquisa como a Fundação Oswaldo Cruz. E isso é só a ponta do Iceberg. Você vai ser vacinado graças ao SUS.
O Coronavírus está no ar - há muito foco nas superfícies. Infectar-se pelo coronavírus a partir das superfícies é raro. A Organização Mundial da Saúde e as agências nacionais de saúde pública precisam esclarecer seus conselhos.
Este é o início do editorial da Nature do dia 02/02
Antes que alguém venha dizer que eu estou sendo irresponsável e falando que não precisa mais usar álcool em gel ou desinfetar superfícies, deixa eu esclarecer o que diz o editorial:
- É plausível que pessoas se contaminem por superfícies, mas o risco real é a contaminação PELO AR
E por que é importante falarmos sobre isso?
Porque vejo muita gente altamente preocupada em ficar limpando tudo, passando álcool o dia todo e não usando corretamente a máscara, não mantendo distanciamento e não ventilando adequadamente os ambientes.
Hoje fui fazer alguns ajustes ergonômicos na minha bike, com o @CarlosPitrosky . Enquanto o Carlos fazia as diversas medidas antropométricas, as medidas na bike e observava as angulações da minha postura e movimentos, pensei em como isso se relacionava com as vacinas pra COVID-19
- Tá maluco, André?
Na verdade, me veio à cabeça que a ciência é de fato algo para ser usada no dia a dia. Na minha cabeça de ciclista iniciante, pra pedalar bastaria apenas subir em uma boa bicicleta com freios em dia e pneu calibrado.
Mas após observar um pouco da biodinâmica envolvida em tudo isso, foi possível entender por que meu joelho e meus pulsos doíam. Os ajustes deixaram a bike bem mais confortável e com melhor rendimento.
Quando afirmo a necessidade de ensaios clínicos randomizados (inclusive durante a pandemia) para demonstrar eficácia de medicamentos, eu ouço:
"André, é antiético usar placebo em um dos grupos". Ou "É antiético ficar parado e 'deixar o paciente morrer' ".
Será? Segue o fio..
Existe uma confusão enorme aí. A primeira é que assumiu-se ARBITRARIAMENTE que certos medicamentos funcionam. Ou seja, mesmo sem demonstração de eficácia, disseminou-se que ivermectina ou hidroxicloroquina eram eficazes. E já sabemos que isso é a inversão do método científico.
Como no imaginário popular do senso comum (que inclui muito profissionais da saúde 😢) foi popularizada a hipótese de que esses medicamentos funcionam, criou-se a falsa sensação de que fazer estudos com placebo ou não utilizar esses medicamentos na prática médica seria antiético.
Estudos científicos são o melhor modo de nos aproximarmos de verdades na área da saúde e a melhor forma de fazer essas verdades serem reconhecidas.
E foi empregando o raciocínio científico que uma jovem enfermeira revolucionou o sistema de saúde vitoriano.
Vamos de historinha!
Na primavera de 1820 nascia Florence Nightingale, em uma privilegiada família britânica. Ao contrário do que se esperava de uma dama inglesa da época, Florence dedicou-se à enfermagem
Chocando ainda mais a sociedade (e os pais), foi trabalhar nos hospitais da Guerra da Crimeia
Em 1854, administrando como voluntária um hospital da Turquia, desconfiou que a sujeira, falta de saneamento e a comida estragada eram mais responsáveis pela morte de soldados do que os ferimentos de guerra.
Parece loucura, mas na época, ninguém pensava muito nisso...
"Eu tive COVID-19 e me recuperei graças ao tratamento com Kit-Covid".
Sinto informar que que a frase está incorreta. O certo seria: "Eu tive COVID-19 e me recuperei, APESAR do tratamento com Kit-Covid"
A boa notícia é que você é um duplo vencedor. Venceu a Covid e a iatrogenia.
Iatrogenia: alterações patológicas derivadas de intervenções médicas. No caso do uso de medicamentos, são os efeitos adversos e consequências negativas não intencionais.
Se tem uma coisa que aquele ensaio clínico da Colchicina nos mostrou (volta lá no meu feed ver o vídeo) é que no grupo placebo (que não tomou medicamento nenhum), apenas 6% dos pacientes foram hospitalizados e 0,04% foram a óbito sem utilizar medicamento (ou kit-covid nenhum).