1. A prisão cautelar de um deputado federal encontra dois limites constitucionais importantes. Primeiro: a inviolabilidade de seu direito à opinião; segundo: a existência de flagrância por crime inafiançável.
1.1. A inviolabilidade é a garantia que um congressista possa expor suas opiniões, ainda que duras, sem sofrer retaliações. Como quase toda garantia, encontra limites: uma garantia constitucional não pode ser escudo para veicular discurso que mine a própria Constituição.
1.2. Crime permanente tem 2 características fundamentais: a) reiteração da ação/omissão lesiva ao bem jurídico; e b) constante e renovada ofensa ao bj. Ambas presentes no vídeo do Deputado, que autoriza, em tese, prisão em flagrante.
1.3. Em que pesem as alterações sobre fiança pós-1988, o texto constitucional define como inafiançáveis, entre outros, os crimes "contra a ordem constitucional e o Estado Democrático".
1.4. Conclusão: estão presentes os requisitos autorizadores da prisão em flagrante.
2. Há, porém, questões que merecem análise mais detida. a. Prisão em flagrante não é (mais) causa suficiente para a prisão preventiva; b. A possibilidade de prisão de ofício; c. o conceito de permanência/flagrância em tempos digitais; e d. o papel do Parlamento.
2.1. Começo pelo final. Acho improvável que a prisão acontecesse se o Parlamento responsabilizasse os congressistas por falas anti-democráticas. A sinalização, porém, é que ao contrário de reprimi-los, deputados como Bia Kicis são cotadas para posições de liderança no Congresso.
2.2. O futuro imediato do Dep. está nas mãos do Congresso, q poderá esvaziar a ordem de prisão. Mesmo, porém, q se mantenha a ordem, entendo q a conversão em preventiva tem q atender aos arts. 311 e 312 do CPP. Retirado o vídeo do ar, vejo pouco fundamento para a mantê-lo preso.
2.3. A reforma do art. 311 do CPP, em 2019, foi expressa em retirar a possibilidade de prisão preventiva de ofício, isto é, sem provocação do MP ou da polícia. Assim, o STF, como vítima, deveria ter instado a Polícia Federal a realizar o flagrante, porém não via ordem de prisão.
2.4. Como calibrar a permanência nos crimes digitais? Poderia um(a) deputad@ ser pres@ em flagrante por vídeo anti-democrático de 1 ano atrás? Entendo que não. A manutenção do conteúdo deve integrar o dolo de mantê-lo vivo nas redes, seja pelo reenvio ou outras estratégias +
ativas de divulgação, seja pela opção de não removê-lo. Do ponto de vista penal, o tema mais palpitante desse episódio, sem dúvida.
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Aprofundando a polêmica: crime permanente e flagrante pela publicação de vídeos no YouTube (segue o longo, confesso, fio).
Os crimes permanentes têm duas características distintivas: (um) constância da conduta típica, seja comissiva, ou omissiva; e (dois) constância da lesão ou exposição a perigo do bem jurídico subjacente ao fato típico.
Há crimes “naturalmente” permanentes, como a associação criminosa. Alguns crimes, porém, podem ser incidentalmente permanentes. Ex: artigo 48 da Lei n. 9.605/98 - impedir a regeneração natural de florestas.
Meu pitaco sobre a polêmica do banimento de Trump do Tuínto (segue o fio).
Primeiro, temos que afastar as falsas equivalências. Barrar o acesso a plataformas por raça, origem, identidade de gênero etc. é diferente de excluir alguém por uso da plataforma em contrariedade aos termos de uso. É um ambiente plural, mas regrado.
Segundo, liberdade de expressão diz respeito, fundamentalmente, à liberdade de opinião, ou seja, fazer juízos de valor sobre fatos.
Direito penal para quem? Algumas lições do putsch frustrado de ontem (segue o fio).
Circularam fotos comparando a atuação da polícia no Capitólio em manifestação do Black Lives Matter versus a tentativa de putsch de ontem. Sem surpresa, os golpistas eram brancos e majoritariamente homens; muito diálogo, foto com os invasores, composição.
Evidente que eu não quero que eles sejam tratados com a mesma truculência reservada aos negros, porém que aos negros se lhes estenda a mesma civilidade. O privilégio branco, denunciado, entre outros, pelo @thiamparo, é uma face da seletividade racista do Direito Penal.
Feminicídio e júri. Pode o júri absolver com base na legítima defesa da honra? Se o fizer, pode a decisão ser reformada? (segue o fio).
A CF considera soberana o veredito, no júri. O que isso quer dizer? Não é simples responder a essa pergunta; para além da vagueza do termo, há leis anteriores e posteriores à CF que precisam ser analisadas em conjunto.
A resposta clássica à soberania é a seguinte: o mérito da decisão dos jurados não pode ser revisto, "salvo quando eles decidem de maneira manifesta contra a prova dos autos". Essa exceção, entre aspas, vem de uma alteração do CPP em 1948. Ela é constitucional?
A grande mídia vai morrer abraçada ao PSDB, não tem jeito. Repetem que o PT foi o 2o maior derrotado nas urnas desta eleição, depois de Bolsonaro. Dória é apontado como candidato natural à Presidência, por ser o Governador de São Paulo. Os dados contradizem essa leitura (segue).
O PT perdeu 71 prefeituras, cerca de 39%; o PSDB perdeu 264, o equivalente a 60%. Perdeu, proporcionalmente, 50% mais prefeituras que o PT. pt.wikipedia.org/wiki/Eleições_…
Ah, mas ganhou em SP. E daí? O último prefeito a se tornar Presidente foi... Washington Luis em 1926. Tem um tempinho, né? (Jânio foi Prefeito depois de ser Presidente).
Sem dúvida, o maior derrotado foi o bolsonarismo. Dos 13 candidatos a prefeito apoiados pelo PR, só 2 foram eleitos no 1o T e os 2 q foram para o 2o T perderam (Rio e Fortaleza). Foram eleitos com seu apoio os prefeitos de Ipatinga (46 mil votos) e Parnaíba/PI (52 mil votos).
Difícil comparar com Lula, já que Bolsonaro espertamente deixou morrer a Aliança e não abraçou nenhuma legenda, justamente para que hoje ficasse difícil medir sua derrota.