#FarmacoNumTweet
Como um antibiótico mata as bactérias sem me matar?

De modo geral, antibacterianos "matam" bactérias sem causar danos excessivos às nossas próprias células.

Como isso acontece? Spoiler: Seletividade de ação!
Segue o fio.
O termo antibiótico vem da capacidade de um microorganismo inibir o crescimento de outro (antibiose). Foi assim que a penicilina foi descoberta: em uma placa onde bactérias deveriam crescer, mas que foi contaminada com um fungo do gênero Penicillium.
Esse fungo produzia uma substância que não permitia o crescimento bacteriano à sua volta. Essa substância foi chamada de penicilina. De lá pra cá ampliamos o número dessas substâncias, extraídas de microorganismos ou sintetizadas e assim montamos nosso arsenal de antibacterianos
Isso aumentou nossa expectativa de vida absurdamente. Infecções que beiravam os 100% de letalidade, passaram a expressar valores como 5% ou até menos.

Mas como um antibacteriano "sabe" que deve matar células bacterianas e não as nossas próprias células?
Nós aproveitamos que bactérias são um pouco diferentes de nós (são células procariontes), para mirar em alvos mais específicos. Em estruturas características de bactérias.
Por exemplo, bactérias possuem uma parede celular, que nossas células não tem.
É um reforço que ajuda a bactéria a manter sua estrutura em um ambiente pouco amigável (nosso corpo). Se um medicamento, como a penicilina, possui afinidade por componentes da parede celular e impede a sua correta formação, essa bactéria perde sua capacidade de sobreviver.
Mas nossas células continuam vivas, porque elas não possuem (e nem precisam) de uma parede celular. Muitos antibióticos funcionam assim. Outros possuem afinidade ribossomos bacterianos ("máquinas" de produzir proteínas), que são diferentes dos nossos ribosomos.
Sem fabricar proteínas essenciais, a bactéria deixa de se reproduzir. Alguns atrapalham a formação de ácido fólico, importante para a síntese de DNA. Azar das bactérias, pois a gente consegue nosso ácido fólico pela alimentação. E por aí vai.
É por isso que efeitos adversos de antibacterianos geralmente são mais leves que de quimioterápicos usados no câncer. Nesse último caso, estamos tentando destruir células (tumorais) que são muito parecidas com nossas células normais, então é mais difícil ser seletivo.
Por fim, lembre que antibacteriano foi feito pra tratar infeções por BACTÉRIAS e não por VÍRUS. Então não adianta usar pra tratar gripe ou Covid.

O uso indiscriminado favorece a seleção de bactérias resistentes e nosso arsenal pode se tornar ineficaz em tratamentos futuros.

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10 Apr
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(continua)
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