Ontem, a Federação Internacional de Jornalistas, a maior organização de jornalistas do planeta, publicou um relatório acusando a China de construir uma rede de jornalistas em veículos espalhados pelo mundo para elogiar Pequim.
Segundo o relatório, graças à pressão chinesa, num ano em que a pandemia de coronavírus prejudicou a imagem de Pequim globalmente, a cobertura sobre a China na imprensa internacional foi mais positiva em 2020.
Parte disso também porque a China está mais fechada para a cobertura internacional, dificultando a entrada de jornalistas estrangeiros no país, aumentando a dependência da imprensa internacional do "noticiário" estatal.
Segundo o relatório, países que recebem vacinas chinesas para a Covid-19 têm uma cobertura jornalística mais favorável a Pequim do que países que não recebem - estes tendem a focar em reportagens sobre o encobrimento da origem da pandemia em Wuhan.
Como conta o New York Times, em alguns países, jornalistas estão sendo pressionados a publicar mesmo discursos oficiais de Xi Jinping, já traduzidos.
A acusação a Pequim não é novidade. Em 2020, a mesma Federação Internacional de Jornalistas já havia publicado um outro relatório, denunciando o aumento da influência chinesa na cobertura da imprensa internacional.
Em 2019, outra importante organização da categoria, a francesa Repórteres Sem Fronteiras, já havia lançado um relatório de 52 páginas com as mesmas denúncias sobre Pequim.
Se você reparou, até aqui, nada dessa thread relata o meu ponto de vista, mas o trabalho das maiores organizações e veículos de jornalismo do mundo, com as devidas fontes.
Munido dessas informações, estas são as minhas impressões a respeito:
1. Nenhum partido político no mundo tem tamanha influência na imprensa internacional como o que controla o Estado chinês;
2. Essa influência dificilmente não está presente no Brasil;
3. Essa possível presença não apaga o fato de que há bons jornalistas no Brasil;
4. A China é a 177 em 180 países no ranking de liberdade de imprensa da Repórteres Sem Fronteiras. Dos grandes atores geopolíticos, a China é a que tem menos respeito pelo jornalismo profissional;
5. A influência chinesa no jornalismo mundial é uma ameaça à profissão;
6. Desconfie de todo jornalista brasileiro flagrantemente pró-Pequim - ou milita por ditadura, ou é bem pago para isso;
7. O que acontece em nosso maior parceiro comercial é sub-reportado pela imprensa brasileira, e esta negligência é uma ameaça às nossas próprias instituições;
8. Por óbvio, o partido que controla o Estado chinês nem de longe é o único a atacar o trabalho da imprensa;
9. Desconfie de todo governante que busca indiscriminadamente invalidar a importância do jornalismo profissional - esse é o caso de Jair Bolsonaro e Donald Trump;
10. Jornalistas também erram e não devem ser poupados de críticas. Há bons e maus profissionais em qualquer área. Mas não existe país livre sem imprensa livre. E a única forma de enfrentar ameaça ao jornalismo profissional é com a defesa do jornalismo profissional.
• • •
Missing some Tweet in this thread? You can try to
force a refresh
Além de fundar uma das maiores empresas do planeta, Jack Ma também controla a fintech Ant Group, controladora do serviço de pagamentos Alipay - a startup de tecnologia mais valiosa do mundo (mais usada que cartão de crédito na China).
Poucas coisas me impressionam mais do que ver a defesa do governo chinês por progressistas ocidentais.
Nenhuma nação tão influente no mundo rejeita com tamanha veemência os valores progressistas e persegue tão abertamente minorias quanto a China.
Quer ver só?
É LGBT? Má notícia.
O casamento gay e a adoção de crianças por casais LGBTs não são permitidos na China. Imagens de homens usando brinco podem ser borradas na tv pela censura como parte de uma agenda para reforçar as noções tradicionais de masculinidade.
A China proíbe representações LGBTs na tv como parte de uma repressão a “conteúdo vulgar, imoral e prejudicial à saúde”, comparável à "perversão sexual, agressão sexual, abuso sexual, violência sexual e assim por diante" (as aspas são do governo).
Trump, sobre a mudança da constituição chinesa que deu poder "vitalício" a Xi Jinping:
"Xi é um grande cavalheiro, agora é presidente vitalício. Ele é ótimo. E olhe, ele foi capaz de fazer isso. Talvez tenhamos que tentar isso algum dia."
@franciscorazzo É slogan de jovem tuiteiro de classe média. Virou mantra, discurso patriota do funcionalismo público, que fora desta bolha verde e amarela nacionalista do serviço público diz muito pouco.
@franciscorazzo Na vida real, a saúde pública é a maior preocupação dos brasileiros. Este é um país com uma série de problemas - nenhum deles é maior que a saúde pública para a própria população. E isso diz muito.
@franciscorazzo Não sem motivo, este é um povo que sonha com carteira assinada para ter a possibilidade de contar com um plano de saúde privado como benefício. Enquanto o jovem tuiteiro faz hashtag pelega, ascensão social para a dona Maria é ter Unimed.
Não é uma tarefa fácil alimentar 1.4 bilhão de seres humanos. Os números são descomunais.
Por ano, os chineses consomem 8 milhões de toneladas de carne bovina, 15 milhões de toneladas de peixe, 60 milhões de toneladas de porco e 143 milhões de toneladas de arroz.
Colocar comida na mesa de tanta gente exige muita logística. E é ainda mais difícil na China.
A China tem 9,6 mi de km², mas uma área cultivada de apenas 1,27 mi.
Ou seja, embora 18% da população mundial seja chinesa, a China só atende por 7% da área cultivada total do planeta.