Existem duas contradições antagônicas centrais no Brasil. Uma delas afeta a burguesia, essa palavra fora de moda, a outra a "classe média". Elas derivam do projeto nacional de desindustrialização e conversão disso num plantation. Sigamos (1/10).
A primeira afeta a classe média. Ela majoritariamente aposta numa burguesia cujo projeto é desindustrializar o Brasil, transformando nosso país em mais um dos brinquedinhos barrocos: em um polo, um capitalismo financeiro high-tech, no outro, uma economia real primária (2/10)
Esse país não tem espaço para uma classe média moderna. A começar pela taxa de câmbio desvalorizada POLITICAMENTE que serve à mineração, agricultura e pecuária, mas te impede de comprar um note novo. Fundos de pensão e previdência privada não vão salvar nossa classe média (3/10).
Se a USP fechar ou for privatizada, quem se ferra, prioritariamente, é a classe média, não os trabalhadores. Então a classe média é refém de um projeto de acumulação selvagem da burguesia brasileira? Achou errado, otário (4/10)!
A burguesia brasileira ao topar uma economia primária, para se evitar das agruras de gerir um proletariado moderno, que nos empurraria para a reforma ou a revolução, se expõe a depender de mercadorias cujo preço variam muito (5/10).
Mais do que isso, o projeto político com força para produzir esse processo é o mesmo que, na geopolítica, se alia aos Estados Unidos, que concorrem com o Brasil também nesse setor. E que briga com a China, nossa maior compradora (6/10).
Isso além do dilema ambiental. Essa burguesia depende da expansão da fronteira agropecuária e de extração, o que pode provocar uma catástrofe ambiental e, antes de tudo, energética (já está acontecendo) (7/10).
O cenário atual não é acidental, foi acelerado mas não causado pela pandemia, tampouco é fruto de "incompetência", mas sim de um projeto, que não é capaz de gerar um sistema de equilíbrio desequilibrado. Ao contrário (8/10).
O Brasil pode piorar muito, mas setores burgueses e pequeno-burgueses estão em xeque, à beira de um curto-circuito entre a ideologia que eles professam e a realidade material (9/10).
A derrubada de Dilma, a prisão de Lula e a eleição de Bolsonaro de certa forma aceleraram esse processo, e anestesiaram a resistência, mas agora o cenário está prenhe de mudanças. E se não vier pelas eleições, virá como tempestade (10/10).
P.S.: se não houver um rearranjo institucional reformista, podemos nos tornar ou bem uma versão evangélica do regime talibã ou bem haver uma revolução -- com desdobramento que podem não necessariamente serem bons.

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17 Jun
Ainda sobre a China e EUA: se os EUA aceleram sua política expansionista, que lá é regra, basicamente, isso se converte em oferta de crédito para os consumidores americanos (e um grande ganho para o sistema financeiro local) (1/10).
O banco americano ganha mais. Mas o consumidor pode consumir. Isso acelera a produção nos EUA? Sim, mas os EUA se viciaram no privilégio exorbitante e vão lá absorver a oferta mais vantajosa (2/10).
Isso, paradoxalmente, não faz necessariamente a indústria americana crescer. O próprio sistema busca a oferta global, por uma demanda induzida por um sistema global de reciclagem de capitais (3/10).
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17 Jun
"Fosse boxe o esporte em questão, o resultado da reunião de cerca de 3 horas e meia, até 5 horas no plano da Casa Branca, seria um empate técnico ou uma apertada vitória por pontos para o russo" -- se a Folha disse isso, Putin venceu por nocaute. Mas vamos lá (1/10).
Putin e Biden não foram se reunir esperando rigorosamente, nada. Então, chiste à parte, não houve luta, apenas estudo de lado a lado. Todo o resto caminhará pelo tabuleiro geopolítico, de luta econômica e militar (2/10).
A Europa foi dobrada por Biden, mas isso não quer dizer que os alemães vão abrir mão do Nordstream 2. A provocação americano-ucraniana não deu em nada. E é evidente que a Rússia não seria amadora a esse ponto (3/10).
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15 Jun
"A forma mercadoria é um legado do capitalismo. Provisoriamente devemos conservá-la. A troca de mercadorias e a lei do valor não desempenham um papel regulador em nossa produção (1/4).
Na China, os que exercem uma função reguladora são a planificação, o Grande Salto para Frente planificado e o princípio da primazia da política. Stalin não fala mais do que de relações de produção. Não fala nem da superestrutura nem das rel. entre esta e a base econômica (2/4).
Entre nós, os quadros participam no trabalho manual e os operários participam na gestão das empresas. Enviamos os quadros para trabalhar no campo ou nas fábricas a fim de formá-los. Abolimos as velhas regras e os velhos sistemas (3/4).
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12 Jun
Em São Paulo, a esquerda tem sua maior chance desde 1998, quando Marta Suplicy quase foi a um 2º turno contra Maluf que ela venceria. Hoje, Haddad e Boulos estariam em primeiro, mas separados dividiriam votos (1/10).
Doria depois de sua desastrosa passagem pela prefeitura São Paulo, pegou a onda do Bolsonarismo, o que lhe custou caro. E há um stress dos paulistas em relação a ele à esquerda, que ele sempre combateu, e à direita, pela ação de Bolsonaro (2/10).
Mas há, pela primeira vez, uma mal-estar mais geral em relação à governança de direita no Estado. Como disse a pesquisa Atlas "a rejeição a Doria não tem relação direta com as restrições impostas pelo Governo durante a pandemia" brasil.elpais.com/brasil/2021-05… (3/10).
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12 Jun
Nos últimos dias, Freixo deu passos importantíssimos para virar governador do Rio. Ter ido para o PSB facilita sua vida, quando o natural seria ele ir para o PT. Mas a movimentação entre ele e Lula é local e nacional, local pois é estritamente nacional: o Rio é chave (1/10).
No PSB, Freixo é um nome de peso para a atração de nomes que venham do PSOL e do PC do B, na direção de uma fusão prática ou até mesmo formal ali. Isso mina o poder da Família Campos no partido e, também, atrapalha os planos de Lupi e Ciro que seria a grande fusão PSB-PDT (2/10).
Na eleição, Freixo teria o apoio do PT garantido e poderia atrair outras legendas. Isso esvazia o poder de fogo da Delegada Martha Rocha (PDT), que é uma candidata sim, forte -- e deixaria a direita miliciana sem um representante civilizado para servir de cavalo de troia (3/10).
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10 Jun
@PedroCastilloTe venceu, finalmente, a eleição peruana, embora ainda se falte apurar alguns votos. É uma vitória menor do que de Dilma contra Aécio aqui em 2014, mas muito significativa. Seu pequeno partido de esquerda radical venceu uma implacável e gigantesca máquina (1/10).
Dado curioso, é que mais gente votou no 2º turno do que no 1º. É raro isso acontecer. Mas Castillo mobilizou gente, e não foi pouca, para votar nele. O quórum pulou de 70% para 75%. Se isso foi o voto antifujimorismo apenas, pelo menos ele soube catalisar isso (2/10).
Keiko Fujimori concentrou os votos do poderoso Departamento de Lima, onde se reúne um terço da população e metade do PIB peruano. Sim, além de tudo, há uma brutal desigualdade regional no país (3/10).
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