Um dos grandes problemas do Brasil é confundir análise com gosto pessoal.

Time bom ou ruim não depende de beleza, mas sim da execução de uma ideia de jogo.

O Palmeiras do Abel tá longe de ser "bonito". Mas executa fielmente sua proposta. Deve sim, ser elogiado por isso.🧵👇
Desde que chegou ao Palmeiras, Abel se caracterizou como um treinador adaptável. Ele prefere estudar o adversário, identificar pontos fortes e neutralizá-los para não sofrer gols. É o lema da "baliza zero".

Essa é uma escolha, que para muita gente, produz um futebol mais feio.
Só que essa escolha é válida, benéfica, boa ou qualquer adjetivo que você quiser colocar, desde que bem executada.

Tem regra impedindo isso? Não.
Tem regra falando que não pode jogar assim? Não.

Então pode atuar dessa maneira.
Não tem problema algum.
A exemplo do que fez contra River, Santos e São Paulo, Abel novamente mudou o time num jogo decisivo.

Lançou um 5-3-2 com Danilo numa função até inédita: um meio-campista pela esquerda, num trio com Raphael Veiga. Dudu e Rony mais à frente.
Veja: você pode achar isso uma bela retranca.

Esse é seu gosto. Que eu sempre farei questão de respeitar, porque gosto é individual, vai da sua criação, da sua visão de mundo.

Só que gosto não é análise.

Análise é entender a ideia do treinador e ver o quanto o time aplicou.
O 5-3-2 de hoje tinha como principal ideia neutralizar o ponto forte do Atlético, que são as jogadas de movimentação do Nacho circulando o campo inteiro e o Hulk saindo da área, levando um zagueiro e saindo na cara do gol.

Pensa nos gols contra Boca e River. Foram assim.
Mas pra eles receberem as bolas, Jair e Zaracho precisam jogar. E o Danilo entrou justamente pra pressionar alto e não deixar o passe cair limpo nos grandes criadores do Galo.

Além disso, os 3 zagueiros permitiam que Gómez pudesse acompanhar Hulk sem deixar a área vazia.
Em vários momentos, o Galo fazia sua saída de três com Allan por dentro e simplesmente não jogava.

Olha como o Palmeiras fechava qualquer linha de passe de quem se aproximava.
Sempre com o Danilo avançando mais, pegando o Jair, que é o cara que sai pro Allan recuar. Todo mundo marcado de perto, com o Veiga mais livre pra sair e se movimentar.
Teve muitos momentos que o Palmeiras ficou mais com a bola e fez uma saída em "3-1", com o Veiga circulando. A ideia era forçar as bolas pelo chão, rápidas, pra correria do Dudu e Rony.

O Galo parou na falta. Foram 11 no 1º tempo.
O momento de maior desconcentração do Palmeiras foi o gol.

Lembra que o Danilo pegava o Jair?

Foi um momento que ele deixou escapar, o Jair avançou e o Gómez teve que sair da proteção de Hulk. A área do Palmeiras ficou em igualdade numérica.
Nathan Silva faz ótima temporada, mas não jogou bem, principalmente após o cartão amarelo no 1º tempo.

O que o Abel fez? O que sempre faz: explora isso!

Verón entrou pra explorar a insegurança do zagueiro. Dudu, por buscar mais a bola, não explorava tanto o mano-a-mano. Gol.
No restante do jogo, absoluta concentração do Palmeiras pra fazer um time que costuma criar muito conseguir chutar muito pouco a gol em seu próprio estádio, com a torcida do lado.

Você não precisa achar isso bonito. Seu gosto.

Mas você precisa respeitar esse tipo de jogo.
Porque não existe uma maneira certa de jogar bola. Dá para você fazer as coisas certas pra jogar do jeito que você quer.

O Palmeiras joga assim, com estratégia e defesa forte.

Roger Machado e Eduardo Baptista tentaram mudar essa cultura e não duraram.
Não é por jogar assim que Abel extrai pouco do elenco.

Se você ver bem o elenco do Palmeiras, vai ver que é desse jeito que o time fez seus melhores jogos não apenas com Abel, mas com outros técnicos. Falta um volante que pense de trás, um camisa 10 que para mais a bola..
E, por jogar tão bem assim, muitas vezes o time peca em jogos que precisa enfrentar defesas. É o ponto que precisa melhorar com Abel. Contra o CRB e Cuiabá, foram muitas finalizações e pouca efetividade. Contra o Galo, foram poucas finalizações e muita efetividade.
Ponto esse que todo mundo sabe.

Mas não é por isso que ele "é ruim" ou "não tem capacidade", absurdos que a gente tem que ouvir. Gostos, no fim das contas.
O futebol cresce quando se respeita estilos que não gostamos de ver.

Porque o futebol é maior que o seu gosto. E o meu.

Dá pra aprender com o futebol com bola nos pés e com o futebol de defesa forte. Dá pra aprender com o retranqueiro e o técnico faceiro.
E dá pra aprender que é preciso separar gosto pessoal de análise.

Nem sempre gosto de ver o Palmeiras jogando. Mas sempre admiro quando um técnico estuda o jogo, aplica no treino, convence seu grupo e sai com uma classificação.

No caso, duas finais de Libertadores em 10 meses.
Resgatando uma coisa aqui, essa análise do Abel é a mesma que fiz do Cuca em 2016, a mesma do Felipão em 2018 e a mesma com qualquer técnico no mundo.

ge.globo.com/blogs/especial…
E o texto do fio lá no @geglobo ge.globo.com/blogs/painel-t…

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