Pequeno tutorial de como fazer QUALQUER terapia parecer ser útil (e lotar o consultório de pacientes enganados):
1. Mostre um mecanismo que explique o tratamento. Nem precisa ser real, basta ser simples o bastante pra fazer sentido na cabeça do leigo e do médico leigo.
2. Passe uma imagem de infalibilidade. Nada na Medicina é 100% eficaz e seguro, mas os pacientes não sabem disso e ainda bem! Que continuem sem saber.
3. Cometa cherry picking. Omita estudos de boa qualidade e mostre a seu paciente apenas aqueles que confirmam sua narrativa
4. Nomeie pelo menos três gurus (obviamente charlatões) que passam um ar de “a Medicina não sabe o que eu sei”. Quanto mais famosos atendidos no Instagram, melhor.
5. Passe um ar de vanguardista. O paciente não conseguirá perceber a diferença entre isso e irresponsabilidade.
6. Domine a arte das correlações espúrias. Confunda as pessoas mostrando simples coincidências como vitórias suas: por exemplo, foi meu remédio (e não o tempo) que lhe curou.
7. Se faça de vítima. Quando algum sem coração criticar a sua conduta, fale que ele está desatualizado
7. Foque nos desfechos subjetivos e nas “boas causas”: quem não quer melhorar seu bem estar? Quem é contra a cura do câncer (mesmo que a sua proposta seja uma fraude)? Quem não quer mais disposição para o dia? Chip milagroso?
Só pessoas obviamente maldosas se oporão a você.
8. Inverta o ônus da prova: passe a solicitar aos seus críticos que comprovem que sua terapia não funciona. Mesmo que nunca tenha se comprovado funcionar em primeiro lugar, faça isso. Ninguém liga. Cometem esse viés o tempo todo e sempre se safam. Compensa!
9. Por último, mas não menos importante: por não ter respaldo de nenhuma especialidade, crie uma nova, como “nutriendocrinologia”, “longevidade saudável” e outros nomes fofos que escondam os absurdos que você faz.
Ou nem seja médico. No final das contas, nem precisa.
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Mais um estudo de um proeminente “cientista” sobre ivermectina, um medicamento ineficaz contra covid, é despublicado por fraude. Toda a literatura sobre esse tema é composta por fraudes ou estudos fracos
Entenda essa fraude e aprenda a se proteger dos charlatões e manipuladores.
A Journal of Intensive Care Medicine despublicou o estudo de Pierre Kory e Paul Marik por indícios de fraude em sua pesquisa.
Nesse estudo, os autores apontaram uma mortalidade de 6,1% e compararam com a mortalidade da mesma população em outros artigos, que era de 15,6 a 32%.
Isso não engana qualquer pessoa que entende o mínimo de interpretação de estudos. Essa metodologia, mesmo antes da fraude, é podre.
Mais podre ainda é a fraude: a mortalidade dos usuários dos medicamentos foi de 28%, segundo o hospital onde estavam os pacientes.
Ednaldo dá entrada no PS com relato de síncope (desmaio).
Pela solicitação de um exame comum em emergências (troponina), Ednaldo implantou um stent em sua coronária.
Um erro foi cometido aqui e você, possivelmente, não percebeu. Porque é tão difícil detectar falso positivos?
No hospital em que Ednaldo resolveu ir, existe até um "protocolo" para pacientes que queixam de desmaio (ultrapassado e que objetiva o lucro do hospital, mas existe):
- Eletrocardiograma, ecocardiograma, Doppler de carótidas e TC de crânio, troponina.
Ednaldo que, na verdade, nem desmaiara, apenas se sentira tonto (mas ninguém perguntou) se sentiu bastante acolhido e aproveitou a oportunidade, afinal "exame nunca é demais". "O convênio está pagando mesmo". "Esse hospital é bom".
Wesley teve um diagnóstico falso em uma ida ao hospital.
Marrone é o médico que errou. Mas Wesley e Marrone não perceberam.
Pelo contrário, Wesley é grato ao seu médico. E Marrone acaba de adquirir uma experiência que causará dano aos seus próximos pacientes.
Quer saber por que?
Um dia antes da chegada de Wesley, o Dr Marrone passou por isso:
- O seu mentor solicitou uma angiotomografia para um paciente com escore de Wells baixo. Apesar de achar estranho, Wesley foi surpreendido pelo resultado positivo. O paciente tinha TEP*.
* Traduzindo:
- TEP: trombo-embolismo pulmonar, uma doença potencialmente muito grave.
- Angiotomografia: um exame indicado pra seu diagnóstico
- escore de Wells: um cálculo que fazemos para ver se o paciente tem indicação de fazer a angiotomografia. Só escores altos indicam.
O estudo da Prevent Senior já era inexpressivo antes de ser comprovado fraudulento.
Serviria, no máximo, para imprimir e usar as folhas para acender lareira. Esse fio lista as razões e também o grau de dificuldade de percebê-las.
1. É um estudo observacional. Isso significa que os pacientes não foram incluídos nos grupos por sorteio - maneira justa que reduz incidência de vieses e fraudes.
Observacional não tem poder de determinar eficácia de terapia nenhuma.
Nível de dificuldade: fácil
2. Não foi de pacientes com covid. Isso mesmo. O estudo cita que foi de pacientes com sintomas gripais que ligaram pra telemedicina da Prevent.
Esse critério de inclusão determina que nenhuma conclusão pode ser feita sobre covid.
Nível de dificuldade: fácil.
O mito do médico "experiente", mas que na verdade é um mecanicista..
O médico mecanicista é aquele que acha que conhece o efeito clínico de uma droga apenas por conhecer seu suposto mecanismo.
E esse método, apesar de agradável aos leigos, é ultrapassado. Segue o fio.
O conhecimento de como o corpo humano funciona e como os medicamentos atuam nele é mais nebuloso do que se imagina.
Na verdade, revistas de fisiologia, farmacologia e demais ciências "básicas" ainda são publicadas periodicamente trazendo suposições e novidades.
Não se publicam revistas sobre suposições de novas ruas na cidade de São Paulo porque isso é relativamente simples: um ser humano vai lá e constrói. Tudo registrado. Não há suposições a se fazer sobre isso.
Não fomos nós que construímos o corpo humano. Por isso a dificuldade.
Por que tantos brasileiros acreditaram no conto de fadas de tratamentos que nunca foram sequer promissores? Por que vc ponderou se deveria tomar isso? Por que tantos médicos e convênios se aproveitaram de você para enriquecer?
Fiz esse fio com algumas razões dessa ilusão coletiva
1. Você acha que toda doença tem um remédio.
A famosa frase "esse doutor é ruim, não passa nada" leva médicos a prescreverem algo mesmo que não haja necessidade pra garantir satisfação. O paciente e o médico (leigo) acham que houve benefício mesmo que o nada já fosse suficiente.
2. Como os médicos (leigos) nunca ponderam que um exame pode ser falso positivo ou falso negativo, é passada a falsa impressão que sempre acertamos tudo.
Leigos têm facilidade de reconhecer os falso negativos. Quase nunca reconhecem os falso positivos, igualmente danosos.