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Mar 2 12 tweets 3 min read
Está começando a residência médica de Cardiologia?

Por essa fase, você pode passar apenas de carona ou assumir o volante.
Se você quer assumir o controle e aproveitar ao máximo a residência, então segue esse fio que eu preparei 10 dicas pra você.
1. Seja humilde sobre ECG. Eu sei que você já fez cursos básicos, alguns de vocês eram os “mini-cardios” dos hospitais gerais onde fizeram Medicina Interna.

Mas ninguém sabe ECG. Nós estudamos, discutimos, revisamos, pesquisamos. Entender isso já te coloca à frente de muitos.
2. Não estude por livros de 20 anos atrás. Eu sei que tem aquele Braunwald 6a edição na salinha de reuniões da tua residência. Ou aquele livro de ECG tão antigo que nem fala sobre marca-passo ou eletrofisiologia.

A Medicina muda rapidamente. Esse livro não serve mais.
3. Se ainda não fez ACLS, faça. É importantíssimo. E se já fez, entenda que esse é um curso básico, feito para generalistas. Você, como especialista, precisa conhecer o manejo específico das arritmias no Pronto Socorro.

Lembra do algoritmo “chamar o especialista”? É você agora.
4. Antes de iniciar um estágio, estude as diretrizes daquele tema (americana, europeia e brasileira). Não é uma competição, é só para entender como elas lidam com as controvérsias.

Pesquise sobre os pontos divergentes e comece a criar bom senso.
5. Ainda para criar bom senso (afinal, essa será sua vida e você não quer ser um cardiologista leigo), leia os artigos que definiram as diretrizes. Eles estão citados ao lado da recomendação.

De onde vem o número 150? E 120? Porque NYHA II? Você vai entender e não decorar.
6. Entenda que a prova de título é mera decoreba de diretriz. Mas decorar diretrizes não faz de você um bom cardiologista.
Jogue o jogo, mas não imponha limites a si mesmo.

O bom especialista não decora diretrizes. O bom especialista critica as diretrizes, estimulando evolução.
7. Ausculte cuidadosamente seus pacientes. E faça muito ultrassom/eco.

Se sua residência não tem esses aparelhos em todos os corredores, compre um portátil e comece a treinar. É um investimento (nem o MEC, nem hospital nenhum te ajudarão), mas seu EU do futuro vai agradecer.
8. Estimule a formação de equipes de alto desempenho em paradas cardíacas. Pergunte ao seu preceptor se podes liderar a equipe ou assumir o ultrassom. Desestimule pausas nas compressões para intubar.

Resuma a parada com a equipe ao final. Aponte focos de melhoria com empatia.
9. Respeite todos. A equipe (e seus profissionais de todas as áreas) já estava lá quando você chegou e já sabe muito mais cardiologia que você.

Aprenda com todos, discuta respeitosamente com todos. Se tiver que ensinar, o faça com empatia e respeito.
10. Livre-se de dogmas. Aproveite esses 2 anos como devem ser: um momento único de intenso aprendizado e crescimento pessoal e profissional.

Se fosse pra ficar repetindo dogmas, uma aula de um dia só já serviria.
Bonus. Leia livros do tipo “tratados”. A fase de ler mini-manuais já passou: era quando você queria saber o básico de cardiologia porque também tinha que aprender o básico de reumato e endócrino.

Agora é cardiologia full-time. Não imponha limites ao seu potencial.

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Feb 27
O eletrocardiograma é o exame mais importante de toda a Medicina, pela sua versatilidade e utilidade no diagnóstico de doenças potencialmente fatais.

Sua história tem a ver com física e até cachorros. Nesse fio, eu conto como funciona o ECG através da sua história.
Em 1856, Kolliker e Muller descreveram a presença de potencial elétrico no coração. E não só isso: com uma pata de sapo, notou-se que a contração dessa pata precedia o batimento do coração na mesma solução.

Seria atividade elétrica a razão pela qual o coração bate?
O instrumento que mede corrente elétrica de pequena intensidade é o galvanômetro.

E um inglês chamado Augustus Waller usou um tipo específico de galvanômetro, o "capilar de Lippmann" para tentar monitorar e registrar a atividade elétrica cardíaca.
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Feb 26
O Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, localizado no Ibirapuera, em São Paulo, é um hospital público (com orgulho) cuja história se confunde com a história da Cardiologia no Brasil.

Segue o fio pra saber um pouco mais dessas duas histórias.
Antes de começarmos essa história, vale um breve contexto sobre como era a formação médica no começo do século.
Nas duas primeiras décadas do século XXI (não faz tanto tempo assim), não existiam especialistas em cardiologia, apenas em Medicina Interna (Clínica Médica).
O histórico Principles and Practice of Medicine, de William Osler, pai da Medicina Interna e precursor da MBE, de 1921 é o primeiro volume a trazer traçados de ECG em suas páginas.

O ECG era uma ciência em rápida evolução.
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Feb 24
O ECG é o exame mais importante da prática clínica, por sua versatilidade, impacto diagnóstico, disponibiidade e alcance.

O Manual Prático de ECG do Dante Pazzanese traz toda essa abundância de achados de forma concisa e ágil.
Dá uma olhada nesse fio pra conhecer a obra. Image
O Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, em São Paulo, é uma referência na Cardiologia nacional e está marcado na história dessa especialidade por diversos feitos, como o implante do primeiro stent farmacológico do mundo. Image
Os números do Dante Pazzanese são superlativos. Em um mês, são realizadas 40 mil consultas e exames e 2 mil cateterismos.
Seu pronto socorro cardiológico é o maior da América Latina inteira - mais de mil pessoas internam anualmente aqui por síndromes coronárias agudas. Image
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Feb 9
Você leva o carro a uma revisão e descobre que a pinça do carburador está quebrada.

Fica com aquela pulga atrás da orelha: essa peça existe mesmo?

Médicos ganham a vida inventando doenças que não existem e você acredita. Nesse fio eu disseco essa má prática médica.
O ato de “inventar” doenças é conhecido como “Disease Mongering”. O ato é complexo e orquestrado de maneira quase perfeita para que o leigo e o médico leigo não percebam onde mora o erro.

O charlatão conhece esse processo e se aproveita disso.
Começa pelo apelo óbvio à saúde. É que essa narrativa garante, quase que instantaneamente, um selo de aprovado pela comunidade e pela mídia.

Posicionar-se contra essas práticas é frequentemente confundido pela sociedade com ser contrário à Medicina ou à saúde.
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Jan 29
Reginaldo é recém formado especialista de um dos mais respeitados hospitais de ensino do país.

Não importa a especialidade nem carga horária, Reginaldo esteve em risco de concluir sua Residência Médica ainda como um leigo.

E assim foi: defendeu tratamento precoce para covid.
🧵
A Residência Médica é uma das maneiras pelas quais um médico pode se tornar um especialista.

Sua prova de admissão é um vestibular bastante concorrido e também criticável.

Suas questões são desconexas da realidade e não selecionam bons médicos com raciocínio crítico.
Reginaldo não foi ensinado sobre o que significa a frase “a clínica é soberana”. Pelo contrário, acreditou em memes que via no Instagram que diziam que soberana mesmo é outra especialidade.

Escolheu uma especialidade que “não precisava de clínica”.
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Jan 25
A síndrome de Wolff-Parkinson-White é um defeito embriológico do coração presente em 1 a cada 1000 nascidos. Neles, ocorreu uma falha quando o órgão ainda se formava na 4a semana de gestação.

Nesse fio eu vou explicar o que isso significa e quais as consequências desse problema.
A primeira coisa que você precisa saber pra entender a síndrome é que ela é um defeito no esqueleto do coração.
Sim, nosso coração possui um esqueleto.
Ele sustenta as valvas e os músculos e também serve como isolante elétrico entre câmaras do coração.
“Nosso coração tem eletricidade?”
Sim! E o caminho por onde essa eletricidade é conduzida é bem estudado por nós eletrofisiologistas.

Quando o estímulo elétrico percorre corretamente esse caminho, nosso coração bate na sequência perfeita: primeiro átrios, depois ventrículos.
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