1-Quando eu tinha 21 anos, a caminho da TV Manchete, atravessando o Rio Tietê sobre a Ponte do Limão, um rapaz armado me abordou e me mandou descer o canteiro lateral para ir debaixo da ponte. Na hora eu pensei “nem morta” e falei pra ele atirar que eu não iria a lugar algum
2-Ele ainda tentou me empurrar, mas eu o contornei e fiquei na calçada do lado da rua. Surpreso e desapontado ele puxou minha correntinha de ouro, tomou minha bolsa e apertou meu rosto com a mão, dizendo “então, você NUNCA me viu”
3-Atravessei as duas pistas com a perna bamba. Do outro lado tinha um Corpo de Bombeiros. Eu chorava TANTO que mal conseguia falar. Quando contei para os bombeiros eles perguntaram se eu tentaria achar o rapaz. Eu fui. Ele estava a umas seis quadras de distância
4-Os bombeiros o prenderam. Ele não tinha mais arma, nem bolsa, nem corrente e disse que era do exército. Veio um jipe especial para prendê-lo. PE. E eu tive que ir à uma outra delegacia, já que o primeiro delegado não podia atender
5- Tempos depois teve uma audiência, em Jundiaí, e eu fui sozinha (não contei nada pros meus pais, não queria que ficassem preocupados. Eu pegava o ônibus Cometa e descia na marginal em SP todos os dias, em qualquer horário) Contei pro juiz o que aconteceu. Sem drama.
6- O advogado do rapaz (senhor idoso) me fez uma única pergunta “que roupa você estava usando?” eu, ingênua, comecei “tênis, calça jeans e uma blusa azul” quando o juiz me interrompeu e disse que eu nao precisava responder aquela pergunta. O juiz deu uma dura no advogado!
7- Foi então que eu entendi o que tentam fazer com o relato das meninas, das mulheres. Desqualificam, minimizam, diminuem. Tentam inverter os papéis, como se a culpa fosse da vítima. A sedutora. A provocadora. A mentirosa. A vingativa. Na época só achei o advogado meio bobo.
8- No final o rapaz foi preso, assim eu soube. Agradeço muito ao juiz, que me protegeu sem que eu compreendesse exatamente do quê. Agradeço aos bombeiros e à Polícia do Exército que o levou dali. Ninguém precisou da “prova material” para acreditar em mim.
9- Me lembro claramente da cara dele e da roupa que ele estava usando. Loiro, olhos azuis, calça jeans, tênis branco e camiseta do Bart Simpson. Eu tive sorte.
