Bom dia. Ontem, aqui no Twitter, recebi um pedido para fazer um fio sobre a decisão do PT em apoiar Baleia Rossi para a presidência da Câmara de Deputados. Prometi que faria. E começo a cumprir a promessa. Lá vai:
1) A bancada federal do PT, por uma pequena maioria de 4 votos, decidiu apoiar Baleia Rossi, do MDB, aliado do DEM, para a presidência da Câmara dos Deputados. Foi um alívio para o PSB e Ciro Gomes que discutem se unir em 2022 numa chapa com o Centrão.
2) Em seguida, mais rápido do que um raio, foi composta formalmente a aliança de 11 partidos, liderada pelo DEM. O centro-esquerda, incomodada com sua imagem externa, divulgou uma carta para justificar os seus aparentes 119 votos (já que 41 desse bloco são contra o apoio)
3) O que diz a carta assinada pelo PT, PSB, PDT PCdoB e Rede? Pautar o direito à vida e à saúde, garantindo o acesso universal à vacina; a renda emergencial e/ou a ampliação do Bolsa Família; a geração de emprego e o fim do arrocho salarial; a segurança alimentar (continua)
4) (continuação): "com apoio à agricultura familiar e assentamentos da Reforma Agrária, garantido comida barata ao povo; tributos sobre a renda dos mais ricos; defesa dos direitos das classes trabalhadoras, com liberdade para organização e modernização de entidades sindicais"
5) Cá entre nós, é preciso uma dose cavalar de fé no Centrão – aquele que votou pela reforma da previdência e pela reforma trabalhista – para acreditar que esta agenda será a pauta de Baleia Rossi.
6) Antes, lembremos os 23 deputados federais do PT – a maior bancada da Câmara de Deputados – que foram contra o apoio ao Baleia: deputados que comandaram o partido – como Rui Falcão -, com amplo trânsito e respeito em processos de negociação política – como Elvino Bohn Gass
7) Deputados com muito destaque em seus Estados – como Maria do Rosário, Odair Cunha, Reginaldo Lopes, Paulo Teixeira, entre outros. Os vitoriosos decidiram divulgar aos quatro cantos que “agora vai”.
8) “Quem deu golpe viu que deu ruim”, se adiantou a presidente oficial do PT, Gleisi Hoffman, revelando mais do que imagino que desejaria. A frase é mais um ato falho que uma declaração positiva. Chamou a atenção para a aliança com os golpistas
9) Mas, o que os partidos de centro-esquerda ganham com este apoio ao Centrão? Lembremos que a aliança dos 11 partidos possui teóricos 280 votos, que sem os 50 votos do PT ainda superam e muito os 160/170 votos de Arthur Lira. Então, se não havia tanta necessidade deste apoio
10) O discurso oficial é de que a aliança derrotará Bolsonaro na Câmara e defendendo as instituições e, ainda, o centro-esquerda ganha a 1a. Secretaria na Mesa da Câmara. A 1ª secretaria é responsável por decisões administrativas, como a organização das despesas da Casa
11) Mas, qual o peso deste cargo na definição de pauta da Câmara? O que a luta pelas instituições e derrota de Bolsonaro ganha com esta função? O que garante em relação às pautas até aqui caras para a esquerda como impeachment de Bolsonaro, a não independência do Banco Central?
12) Analisemos quem é Baleia Rossi para entender melhor se se trata efetivamente de ataque frontal à Bolsonaro.
Luiz Felipe Baleia Tenuto Rossi, mais conhecido como Baleia Rossi nasceu em junho de 1972. É empresário e presidente nacional do MDB.
13) Baleia é vinculado à Michel Temer. Rossi foi ministro da Agricultura dos governos petistas de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, entre 2010 e 2011. Pediu demissão diante de denúncias de irregularidades na pasta.
14) Em 2014, foi eleito deputado federal e dois anos depois virou líder do MDB na Câmara, quando se aproximou de Rodrigo Maia (DEM-RJ). Lembremos que Michel Temer, padrinho de Rossi, é cotado substituir Araújo no Ministério das Relações Exteriores.
15) Também pode refrescar a memória o fato do MDB ter convidado Bolsonaro para se filiar na sigla. O convite foi feito em outubro do ano passado pelo senador Eduardo Braga (MDB-AM).revistaforum.com.br/politica/mdb-c…
16) Baleia foi anunciado como candidato de Rodrigo Maia em 23 de dezembro. Até aquele momento, também era cogitado o nome de Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) para disputar o cargo. Então, fica a dúvida: apoiar Baleia não é apoiar Temer que é cotado para ser ministro de Bolsonaro?
17) Este tortuoso caminho das forças de centro-esquerda do país indica uma dubiedade estratégica que faz recordar aqueles enredos de espionagem em que vários personagens aparecem de um lado e do outro da disputa, muitas vezes tantas vezes de um lado e de outro que acabam zonzos
18) Deve ter algum sentido para este jogo de esconde-esconde. Eu, sinceramente, só percebo garantia de visibilidade e algum poder na Câmara de Deputados, talvez, na composição do comando de algumas comissões permanentes. Talvez.
19) Parece mais coisa de disputa interna ou de movimentações pouco nobres no caminho de 2022, de maneira rebaixada, acanhada, derrotada.
20) Décadas atrás, o PT descortinou uma nova forma de fazer política pela esquerda. Ao invés dos acordões, ações de massa vinculadas à agenda de luta popular; ao invés de ingressar em frentes amplas por baixo, ofensivas de rua, atropelando aliados à direita
21) Agora, no apagar das luzes de sua história de lutas, algo em torno de metade mais quatro de seus deputados, uma maioria quase invisível, decide se aliar numa carreira de jockey ameaçado. Uma maioria que parece ver o que não enxergamos, nós, mortais
22) Viram que “quem deu golpe viu que deu ruim”, algo que não tínhamos percebido. Não tínhamos percebido que Temer, Rodrigo Maia e Baleia haviam feito mea culpa. Não percebemos nada. Nós, que ainda acreditamos que Bolsonaro não é apenas adversário, mas inimigo.
23) Nós apenas vemos que a aliança dos 11 partidos selou uma aliança para 2022 em que o Centrão será protagonista. A aposta, parece, é de um novo golpe no comandante do Executivo Federal, será desfechado sobre a liderança do Centrão. Mais uma vez.
24) Aquele Centrão que derrubou Dilma Rousseff. Porém, até o novo golpe, o Centrão fará o que sempre fez: o “toma lá, dá cá”.a Rousseff. Porém, até o novo golpe, o Centrão fará o que sempre fez: o “toma lá, dá cá”. (FIM)

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6 Jan
Bom dia. Decidi fazer um fio para entabular algumas hipóteses explicativas sobre o motivo de chegarmos a este "Mundo do Centrão" em que nos metemos. Afinal, Centrão virou situação e oposição e domesticou esquerda e Bolsonaro. De onde veio isso? Image
1) Uma hipótese possível é a do resultado político do lulismo. Lula criou um governo "omnibus" onde cabiam todos. A diferenciação se desfez. Daí, essa dificuldade para o brasileiro médio em entender como houve golpe se os golpistas estavam no governo. Image
2) Com o lulismo, a esquerda permaneceu como uma referência teórica, como ideário, mas perdeu o ímpeto de mudança. A decorrência para os dias de hoje é que a esquerda brasileira existe como ideário, mas perdeu o ímpeto oposicionista. Image
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2 Jan
Bom dia. Perdemos, ontem à noite, uma dessas pessoas imprescindíveis: padre Ticão. O fio de hoje é sobre ele.
1) Algumas pessoas parecem imortais. Pela sua energia, pela firmeza, pela paixão, parecem indestrutíveis, líderes de tarefas sucessivas, urgentes, sem fim. Padre Ticão era uma dessas pessoas e confesso que a notícia de sua morte parece inverossímil.
2) A última vez que estive com ele o encontrei na entrada da igreja de São Francisco de Assis, em Ermelino Matarazzo. Ele ouvia, em silêncio, uma senhora que parecia angustiada. Logo depois, entramos na sala em que recebia os visitantes, abarrotada de panfletos e jornais.
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27 Dec 20
Bom dia. Prometi um fio para hoje tendo como tema central o possível ocaso da forma-partido. Para começar o fio, recordo como os partidos surgiram no mundo político. Vamos a ele.
1) Farei uma breve referência inicial à dois autores clássicos nos estudos sobre partidos políticos: Maurice Duverger (“Os Partidos Políticos”) e Giovanni Sartori (“Partidos e Sistemas de Partidos”). Há muitos outros autores de referência nos estudos sobre partidos, lembremos
2) Sartori alerta para a transição do que se denominava “facção” para o conceito de “partido” que ocorreu na passagem do século XVII para o XVIII. Em 1782, Voltaire demarcou a diferença entre facção e partido
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16 Dec 20
Prometi um fio sobre os motivos para o Senado derrubar o golpe que a Câmara de Deputados deu nos recursos do Fundeb. Lá vai. Será um fio curto.
1) Uma primeira causa foi a enxurrada de mensagens aos deputados com argumentos técnicos. Parece pouca coisa, mas parte dos senadores não está acostumada a aprofundar análises sobre financiamento da área social e seus impactos na vida dos seus eleitores.
2) Outra iniciativa foi uma ação articulada na grande imprensa. Mas, a ação principal foi o corpo-a-corpo que, nos EUA, chama-se lobby. O PSDB acabou rachado. E houve intenso trabalho envolvendo PDT, MDB, PSD e Rede. Todos senadores se reuniram com os articuladores pró-Fundeb.
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15 Dec 20
Bom dia. Farei um mini fio analisando como empresários, Centrão e Bolsonaro decidiram mirar nos fundos públicos da educação e saúde neste último período e o papel do Centrão na manutenção dos índices de aprovação do governo federal. Lá vai fio:
1) Postei agora há pouco uma nota de Daniel Cara em que se revela o desvio de recursos públicos do Fundeb para a iniciativa privada: quase 16 bilhões. Não se trata de uma "ajuda" ao Sistema S ou às escolas filantrópicas. Trata-se de disputa por recursos públicos pelos empresários
2) O texto de Daniel Cara informa que "Em 2019, conforme análise de dados da Receita Federal produzida por João Marcelo Borges (FGV), concluiu-se que as entidades filantrópicas e confessionais receberam 6,37 bilhões de dinheiro público (...) e o Sistema S recebeu R$ 21 bilhões."
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13 Dec 20
Vou começar o fio sobre o Fundeb que prometi fazer nesta manhã. Começo explicando a história que desaguou no Fundeb. O fio será grande. Lá vai.
1) O financiamento foi para a educação foi entendido como vinculação constitucional de um percentual mínimo de recursos para a educação a partir da Constituição Federal de 1934. O princípio da vinculação de recursos esteve presente nas Constituições Federais seguintes
2) A Carta de 1937 determinou que o direito à Educação se constituía num dever da família, e ao Estado era definido um papel secundário. Esta concepção retornou, em certa maneira, no discurso da Escola Sem Partido, para quem educação é papel da família
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