Téo Benjamin Profile picture
19 Feb, 28 tweets, 8 min read
O Inter de Abel Braga conseguiu uma sequência de nove vitórias consecutivas, assumiu a liderança goleando o São Paulo e chega à penúltima rodada mais vivo do que nunca. A final de domingo promete. O rubro-negro agora se pergunta: como joga o Inter?
Para começar, vamos olhar os números — sempre fazendo aquela ressalva importante de que as estatísticas são muito úteis para entender o jogo, mas precisam ser analisadas levando em conta o contexto de cada equipe e do campeonato.

Já surgem algumas conclusões interessantes...
A começar pela posse de bola. O Flamengo é, ao lado do Atlético-MG, o time que mais gosta da bola no campeonato. O Inter aparece em quinto, quase empatado com o Grêmio, por exemplo, que é considerado um time de muito mais posse…
Mas existe um detalhe importante. Se fizermos um recorte usando apenas os 10 últimos e os 5 últimos jogos do Inter, veremos que ele tem uma das menores médias de posse do campeonato!
Assim como o Flamengo, o Inter trocou de treinador, mudou jogadores e alterou seu estilo ao longo do campeonato. Portanto, esse recorte será muito importante. A partir de agora, todos os números incluirão os 10 últimos e 5 últimos jogos dos dois times.
Um parâmetro interessante é o que costumo chamar de “Quebra da posse”. Ele mostra o quão picotada é a posse de bola do time. Afinal, você pode ter uma posse contínua de 1 min ou 12 posses de 5 segundos. O tempo de posse total será igual, mas o jogo será radicalmente diferente.
Dá para ver que o Inter não apenas tem cada vez menos a bola, mas também tem a bola de forma mais picotada. Sinais de um time que vem se tornando cada mais direto.

A mesma conclusão pode ser vista no número de passes trocados por jogo.
Muito se fala na imposição física do time. De fato, é um time forte e intenso que, com esse jogo mais direto, coloca a bola em disputa lá na frente o tempo todo e depende dessa imposição para criar alguma coisa.

(Lembre-se que o Inter tem cada vez menos posse)
O jogo aéreo preocupa a torcida rubro-negra, mas é bom lembrar que o Fla é o time com o melhor aproveitamento no quesito, especialmente naquelas bolas lançadas e disputadas ali na intermediária. A diferença é que o Inter coloca a bola muito mais vezes em disputa.
Sem a bola, o Inter se consolidou como a defesa menos vazada do campeonato, tendo levado apenas oito gols nos últimos dez jogos.

Conseguiu fazer isso casando seu estilo direto com a bola e uma defesa bem recuada. Um clássico time de contra-ataque.
Cada vez mais, o Inter se fecha bem, deixa o adversário trocar passes por fora do bloco de marcação e não força a quebra da posse. Enquanto o outro time tem a bola, o Inter espera o momento certo para o bote e se sente confortável assim.
E quando digo “espera”, é um pouco isso mesmo. A marcação é ativa e concentrada, mas aquela imagem de um Inter frenético que disputa cada bola e atropela os adversários fisicamente já ficou no passado.

O objetivo é fechar o meio e forçar o adversário a jogar por fora. A partir daí, encurralar o adversário pelo lado, com a saída do lateral, do ponta e do meia saindo para cercar e fechar o avanço, mas só tentar roubar se a situação for favorável.
Mesmo tendo cada vez menos a bola, o Inter faz cada vez menos tentativas de roubada e enfrenta cada vez menos duelos defensivos. Isso, somado aos bons resultados, mostra um time cada vez mais consciente na hora de se defender.
E aí chegamos na estatística mais impressionante do Inter desde o início do campeonato. É um time que simplesmente não deixa o adversário contra-atacar. Apenas 9% dos contra-ataques do outro time geram finalização e esse número vem caindo!
Isso tem a ver com a maneira de jogar, claro. Um time que se defende mais recuado tende a oferecer menos chances no contra-ataque. Mas também tem a ver com a forma como o Inter vem construindo a história de seus jogos.
Nos últimos dez jogos, o Inter só teve posse de bola maior que o adversário em dois: Sport (62%) e Grêmio (51%).

Foram os dois únicos jogos em que o time comandado por Abel tomou o primeiro gol. Não é mera coincidência.
O Inter abriu o placar em 7 dos últimos 10 jogos.

Em 4, fez o primeiro gol antes dos 10 min: VAS (10’), RBB (4’), SPFC (8’) e FOR (4’ e 10’)
Nos 3 restantes, fez o gol no finalzinho do 1T ou comecinho do 2T: GOI (43’), CEA (53’) e BAH (45+1’ e 48’)
(O outro foi 0x0 contra o CAP)
Ou seja, se não é mais ligado no 220v como era o time de Coudet, que chegou no campeonato fisicamente muito acima dos outros e jogava todas as partidas numa rotação acima do adversário, atropelando fisicamente, o Inter de Abel sabe usar sua energia.
Começa sempre com uma blitz alucinante. Se abre o placar, dá a bola para o outro time, se fecha e segura o resultado.

Se não der certo no início, “guarda” (entre muitas aspas) energia para uma nova blitz no final do primeiro tempo/início do segundo ou para quando toma um gol.
Uma dinâmica mais ou menos parecida com o que vimos no jogo do primeiro turno. Mas ali, ainda com Coudet, o Inter foi muito mais incisivo na marcação-pressão ao longo de todo o primeiro tempo.

Há pouco tempo, esse seria um alerta vermelho gigantesco para o Flamengo. Afinal, o time parecia demorar para engrenar nos jogos e quase sempre tomava um gol cedo. Nos últimos tempos, no entanto, o problema vem se diluindo.

Com esses números gerais, dá para ter uma ideia bem razoável do modelo de jogo e do que Abel pode propor. A partir daí, podemos estudar as formações, escalações e mecanismos específicos de jogo, mas isso é assunto para outro post...
A estratégia é um ponto interessante sobre esse jogo. Afinal, a vitória dá o título ao Inter, mas o empate não é nada mal. Será que o time colorado vai tentar sua blitz inicial — que naturalmente envolve algum nível de risco — ou vem fechado de início?
É bom lembrar que a defesa do Inter vai ao Maracanã bastante desfalcada. Isso seria um incentivo para sair mais para o jogo — não confiando em uma atuação defensiva tão sólida — ou se fechar ainda mais — tentando proteger mais a zaga?
Times que colocam a bola o tempo inteiro em disputa acabam deixando o andamento do jogo mais aleatório, mas os resultados mostram que não há muita aleatoriedade nesse Inter. O time sabe o que está fazendo e tenta se impor desse jeito.
Não é um modelo de jogo muito sofisticado. Não é um time que se propõe a dar espetáculo. O Internacional compete. E compete muito!

Com o peso de 41 anos na fila, o time vem com sangue nos olhos.

O Flamengo é melhor, mas vai precisar mostrar isso dentro de campo.
Ah, todos os números são baseados nos dados do @InStatFootball

• • •

Missing some Tweet in this thread? You can try to force a refresh
 

Keep Current with Téo Benjamin

Téo Benjamin Profile picture

Stay in touch and get notified when new unrolls are available from this author!

Read all threads

This Thread may be Removed Anytime!

PDF

Twitter may remove this content at anytime! Save it as PDF for later use!

Try unrolling a thread yourself!

how to unroll video
  1. Follow @ThreadReaderApp to mention us!

  2. From a Twitter thread mention us with a keyword "unroll"
@threadreaderapp unroll

Practice here first or read more on our help page!

More from @teofb

24 Jan
Jogo é jogado e lambari é pescado. Não dá pra garantir resultado no futebol. Nesse campeonato, então, não tem jogo ganho.

Mas não dá para perder assim. É inacreditável ver o time indo de inoperante a inexistente ao longo de 90 minutos. Não há lógica que explique.
É um erro analisar o time só com base no que a gente quer.

Precisamos tentar entender o que o time quer. Isso envolve tanto o treinador quanto os jogadores.

Mas o que o Flamengo quer?!
Tomar decisões em um campo de futebol é difícil justamente porque cada decisão tem consequências.

Do sofá de casa, a gente diz "era só fazer isso", mas a nossa ideia não é testada pelo cruel encontro com a realidade. O treinador e os jogadores, sim, vivem essa pressão.
Read 12 tweets
21 Jan
Essa foto circulou mais cedo pela internet. Abel Ferreira, treinador do Palmeiras, estudando vídeos dos jogos do Flamengo.

Um detalhe não fugiu do olhar dos mais atentos: o nome do vídeo. "Perda Zona Alta" era o título do compilado.

O que pode querer dizer?
É comum que os bons treinadores estudem adversários usando vídeo.

Muitas vezes, compartimentam o jogo em vários pequenos pedaços para encontrar padrões. Ao separar um compilado de "perdas de bola em zona alta", o Palmeiras está procurando detalhes de uma situação específica.
A tal "perda em zona alta" representa nada mais do que todas as vezes que o Flamengo perdeu a bola no chamado "terço final", ou seja, a zona de ataque.

Abel e sua comissão querem saber como o time se comporta nessas situações para encontrar onde estão as brechas.
Read 13 tweets
6 Dec 20
O São Paulo venceu com uma jogada ensaiada de escanteio. Mérito dos jogadores e também de Fernando Diniz e sua equipe.

Mas o detalhe mais legal passa despercebido: a jogada foi pensada especificamente pra esse jogo...
Fernando Diniz e sua equipe técnica estudaram direitinho o adversário.

Veja os escanteios cobrados contra o Sport nos últimos quatro jogos. Veja onde sempre tem um buraco na marcação...
O que o SPFC fez? Usou cinco caras arrastando a defesa para perto do gol e colocou Luciano (canhoto) longe do bloqueio. Na hora certa, correu para o espaço vazio.

O espaço que SABIAM que estaria lá.

A cobrança veio aberta e rápida, perfeita para a finalização.
Read 6 tweets
5 Dec 20
Todo mundo sabe que o principal desafio do Flamengo é ajustar a defesa. O problema não vem de hoje: desde o início do ano o setor não vem bem. Mas agora, no momento mais agudo da temporada, é uma necessidade latente, a prioridade número 1 de Rogério Ceni.
Há problemas coletivos, envolvendo o time todo. Se a marcação na frente não está ajustada, a bola chega limpa para cima dos zagueiros. Se há muito espaço entre os setores, a zaga fica exposta… Todos já sabemos disso

E quando o coletivo não funciona, a bola chega muitas vezes, a zaga joga no limite e os problemas individuais acabam gritando.

Goleiros, laterais, volantes e até meias e atacantes também têm sua parcela de culpa, mas hoje o foco está nos zagueiros, que vêm falhando demais.
Read 50 tweets
2 Dec 20
A eliminação do Flamengo beira o inexplicável.

Um roteiro tão bizarro que chega a ser angustiantemente previsível.

Uma noite muito triste. Aliás, mais uma.
Na Argentina, oscilou, teve altos e baixos, passou perrengue no começo dos dois tempos, mas conseguiu empatar logo depois de tomar o gol e levou o 1x1 até o fim.

O Racing foi cansando e o Flamengo cresceu muito na segunda metade do segundo tempo.
Faltando 20 min de jogo, o time já controlava a posse e ditava o ritmo. Preocupado, Beccacece recuou o time, fez uma substituição para fechar o lado direito... Parecia que a virada viria naturalmente.

Até que Thuler foi expulso e tudo mudou.

Os minutos finais foram de sufoco.
Read 12 tweets
28 Nov 20
O Flamengo foi à Argentina, empatou com o Racing e voltou para casa com um resultado vantajoso, porém perigoso.

Um jogo de altos e baixos, alguns momentos de perrengue e escolhas curiosas. Quero mergulhar justamente nas escolhas de Rogério Ceni!
Olhar para as escolhas de um treinador pode ser mais complicado do que parece. Segundo o @luis_cristovao, sofremos de uma doença coletiva chamada “treinadorismo”, que nos leva a analisar cada decisão unicamente a partir das nossas próprias ideias.

luiscristovao.com/2019/01/08/tre…
Ou seja, se você não gosta de um determinado jogador ou esquema tático, decreta que o treinador “errou” ao fazer aquelas escolhas.

Todo mundo pode (e deve) ter as próprias opiniões, claro! Mas analisar passa por tentar se colocar na cabeça do outro.
Read 30 tweets

Did Thread Reader help you today?

Support us! We are indie developers!


This site is made by just two indie developers on a laptop doing marketing, support and development! Read more about the story.

Become a Premium Member ($3/month or $30/year) and get exclusive features!

Become Premium

Too expensive? Make a small donation by buying us coffee ($5) or help with server cost ($10)

Donate via Paypal Become our Patreon

Thank you for your support!

Follow Us on Twitter!