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22 Feb, 30 tweets, 9 min read
A temporada 2007 marcava a volta do Flamengo à Libertadores da América.

Depois de alguns anos fora, o clube voltava a sonhar depois da conquista da Copa do Brasil em 2006. Transformou o título em obsessão e, numa doce ilusão, reforçou o elenco em busca do caneco.
Sim, o time titular do Flamengo em busca da América tinha Bruno, Léo Moura, Irineu, Angelim e Juan; Paulinho, Claiton, Renato Abreu e Renato Augusto; Roni e Souza.

Moisés, Jailton, Leandro Salino, Léo Lima e Juninho Paulista também eram peças importantes do elenco.
Olhando hoje, com a sabedoria que o distanciamento do tempo nos oferece, parece loucura, mas o rubro-negro iniciou o ano falando realmente em chegar longe na competição continental.

Por incrível que pareça (hoje), passou pela fase de grupos com a segunda melhor campanha: 5V e 1E
Enquanto isso, jogava um Campeonato Carioca que ainda tinha algum charme na participação das equipes menores, mais fortes do que hoje e favorecidos por um campeonato mais curto.

Em 2005, o Flu venceu o Volta Redonda na final. Em 2006, o Botafogo foi campeão em cima do Madureira.
Em 2007, a bola da vez era de novo o Madureira, que na última rodada da Taça Guanabara sapecou o Flamengo por 4x1 em Moça Bonita.

Marcelo Mariola, artilheiro do time, fez todos os gols do Tricolor Suburbano.
Ele foi o segundo jogador da história a marcar quatro contra o Flamengo no mesmo jogo. O primeiro foi ninguém menos que Ferenc Puskás, em 1957, pelo Honved.
Na final daquela mesma Taça Guanabara, Flamengo e Madureira se encontraram mais uma vez e Marcelo foi expulso logo no início do segundo tempo.

Mesmo com dez, o Madureira venceu por 1x0 com gol do jovem Maicon.

Mas ainda tinha o segundo jogo...
O Flamengo estava mordido. Ney Franco mostrava na preleção — em uma TV de tubo — imagens do capitão tricolor, Djair, dizendo que o time do Flamengo era muito estático, o que facilitava a marcação do adversário.
Com a desvantagem no placar agregado, o foco na Libertadores e um jogo importante pela competição nacional na semana seguinte, contra o Paraná, havia apreensão no clube, mas quase 58 mil rubro-negros foram ao Maracanã apoiar o Flamengo em um jogo louco.
Souza abriu o placar no primeiro minuto, Léo Fortunato empatou aos 3', Souza colocou o Flamengo na frente mais uma vez aos 8' e bateu no peito: "Sou foda!"

Renato Augusto ampliou aos 13' e, no finalzinho, Renato Abreu converteu o pênalti sofrido por Claiton e fechou o placar.
Concentrado na Libertadores, o Flamengo nem sequer se classificou às semifinais da Taça Rio. Enquanto isso, surgia um novo favorito ao título...
O Botafogo de Cuca fez 19 gols e sofreu 5, conquistando 15 pontos nos 6 jogos disputados. Com Lúcio Flávio, Jorge Henrique, Zé Roberto e Dodô — grande estrela da companhia —, aquele time passou a ser conhecido — entre os botafoguenses — como "Carrossel alvi-negro"
A final do Campeonato Carioca colocava, finalmente, os dois rivais frente a frente.

O Flamengo trabalhava em duas frentes e tinha as oitavas da Libertadores logo depois. O Botafogo, jogando melhor, queria o bicampeonato.
No primeiro jogo, um baile alvi-negro. O Flamengo simplesmente não viu a cor da bola no primeiro tempo e saiu perdendo por 2x0.

Ney Franco decidiu dar confiança ao time e não substituiu no intervalo.
O Fla voltou melhor, mas o jogo estava totalmente aberto.

Até que, aos 17', um lance muda tudo.

Souza acha um lindo passe para Renato, que dribla o goleiro e sofre pênalti. Júlio César é expulso e o Botafogo fica com um a menos e Cuca sacrifica Lúcio Flávio para colocar Max.
Renato converte, o Flamengo cresce, Léo Lima cruza, Max falha e Souza empata.

O Flamengo está vivo!
No meio da semana, o time vai ao Uruguai enfrentar o Defensor e volta com uma o peso da derrota por 3x0 na bagagem. Uma atuação deplorável, ainda pior que a do primeiro tempo na final do Carioca.
Para piorar, o Clube suspende o contrato de Juninho Paulista, que ficou revoltado ao ser substituído no intervalo no Uruguai e saiu xingando Ney Franco.

"Você não é ninguém para tirar um pentacampeão do mundo do time"

O Flamengo vê seu sonho ruir. Está em frangalhos.
Mesmo assim, 63 mil pessoas comparecem ao segundo jogo da final estadual. A cada dez, sete ou oito vestiam vermelho e preto.
O Flamengo não joga um futebol brilhante, mas abre o placar aos 11' do segundo tempo.

O gol, no entanto, acorda o Botafogo, que cresce, engole o adversário, vira em menos de seis minutos e continua colocando pressão.

Ainda há esperança?
"A torcida do Flamengo nos empurrou. Se não tivesse torcida, a gente não conseguiria virar", diz Claiton um tempo depois.

O volante, que havia jogado no Botafogo no ano anterior, conta uma história curiosa...
Lá para a metade do segundo tempo, há uma sequência de escanteios para o Flamengo.

Claiton é responsável por marcar Dodô na linha de meio-campo e fica alguns minutos ao lado do ex-companheiro.
"Ele olhou para a torcida do Botafogo atrás do gol, sentada, ganhando, com pouco tempo para ser campeão a torcida do Flamengo vibrando, cantando..."

O seguinte diálogo se desenrola...
"Pô, Claiton, é brincadeira..."
"Dodô, vou ser muito sincero contigo. Eu tô muito confiante!"
O Flamengo pressiona, mas não cria. Tem volume, mas não gera perigo...

Até que Renato Augusto, tão criticado por não saber finalizar, acerta seu famoso POMBO SEM ASA, o melhor chute de sua carreira.

"Eu achei que estava mais perto. Por isso arrisquei", disse depois.
A decisão vai para os pênaltis. O Botafogo, muito melhor nos 180 minutos, perde as duas primeiras cobranças. O Flamengo levanta o caneco e inicia a sequência do penta-tri.
Hoje o futebol brasileiro é muito diferente e, principalmente, o Flamengo é outro. Vive, de verdade, em outro patamar. Sonha com a conquista da América com elencos realmente valiosos e vê a distância para os rivais locais aumentar cada vez mais.
Mas ainda somos o Flamengo. Nosso espírito ainda é aquele: apoiar até o final.

Infelizmente, ainda estamos longe dos estádios — e sabemos o impacto que a falta da Magnética tem. Mas o Flamengo sempre foi nacional, sempre foi também sobre apoiar de longe.
O que os outros veem como soberba nada mais é do que confiança. É fé.

Não me venham com esse papo de "zica reversa".
O Flamengo é sobre acreditar. Sempre. Até o final.

Vamos com tudo!
PS: Os depoimentos e as imagens usadas no texto são do filme "Conte Comigo Mengão", da Fla-Filmes, que narra a história daquele Carioca através de entrevistas com os jogadores, com o treinador, com o grande @carlosemansur e imagens feitas diretamente da arquibancada.
PS2: de tanto acreditar, a Magnética levou na marra esse time (reformulado depois da eliminação na Libertadores) ao terceiro lugar no Campeonato Brasileiro.

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19 Feb
O Inter de Abel Braga conseguiu uma sequência de nove vitórias consecutivas, assumiu a liderança goleando o São Paulo e chega à penúltima rodada mais vivo do que nunca. A final de domingo promete. O rubro-negro agora se pergunta: como joga o Inter?
Para começar, vamos olhar os números — sempre fazendo aquela ressalva importante de que as estatísticas são muito úteis para entender o jogo, mas precisam ser analisadas levando em conta o contexto de cada equipe e do campeonato.

Já surgem algumas conclusões interessantes...
A começar pela posse de bola. O Flamengo é, ao lado do Atlético-MG, o time que mais gosta da bola no campeonato. O Inter aparece em quinto, quase empatado com o Grêmio, por exemplo, que é considerado um time de muito mais posse…
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24 Jan
Jogo é jogado e lambari é pescado. Não dá pra garantir resultado no futebol. Nesse campeonato, então, não tem jogo ganho.

Mas não dá para perder assim. É inacreditável ver o time indo de inoperante a inexistente ao longo de 90 minutos. Não há lógica que explique.
É um erro analisar o time só com base no que a gente quer.

Precisamos tentar entender o que o time quer. Isso envolve tanto o treinador quanto os jogadores.

Mas o que o Flamengo quer?!
Tomar decisões em um campo de futebol é difícil justamente porque cada decisão tem consequências.

Do sofá de casa, a gente diz "era só fazer isso", mas a nossa ideia não é testada pelo cruel encontro com a realidade. O treinador e os jogadores, sim, vivem essa pressão.
Read 12 tweets
21 Jan
Essa foto circulou mais cedo pela internet. Abel Ferreira, treinador do Palmeiras, estudando vídeos dos jogos do Flamengo.

Um detalhe não fugiu do olhar dos mais atentos: o nome do vídeo. "Perda Zona Alta" era o título do compilado.

O que pode querer dizer?
É comum que os bons treinadores estudem adversários usando vídeo.

Muitas vezes, compartimentam o jogo em vários pequenos pedaços para encontrar padrões. Ao separar um compilado de "perdas de bola em zona alta", o Palmeiras está procurando detalhes de uma situação específica.
A tal "perda em zona alta" representa nada mais do que todas as vezes que o Flamengo perdeu a bola no chamado "terço final", ou seja, a zona de ataque.

Abel e sua comissão querem saber como o time se comporta nessas situações para encontrar onde estão as brechas.
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6 Dec 20
O São Paulo venceu com uma jogada ensaiada de escanteio. Mérito dos jogadores e também de Fernando Diniz e sua equipe.

Mas o detalhe mais legal passa despercebido: a jogada foi pensada especificamente pra esse jogo...
Fernando Diniz e sua equipe técnica estudaram direitinho o adversário.

Veja os escanteios cobrados contra o Sport nos últimos quatro jogos. Veja onde sempre tem um buraco na marcação...
O que o SPFC fez? Usou cinco caras arrastando a defesa para perto do gol e colocou Luciano (canhoto) longe do bloqueio. Na hora certa, correu para o espaço vazio.

O espaço que SABIAM que estaria lá.

A cobrança veio aberta e rápida, perfeita para a finalização.
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5 Dec 20
Todo mundo sabe que o principal desafio do Flamengo é ajustar a defesa. O problema não vem de hoje: desde o início do ano o setor não vem bem. Mas agora, no momento mais agudo da temporada, é uma necessidade latente, a prioridade número 1 de Rogério Ceni.
Há problemas coletivos, envolvendo o time todo. Se a marcação na frente não está ajustada, a bola chega limpa para cima dos zagueiros. Se há muito espaço entre os setores, a zaga fica exposta… Todos já sabemos disso

E quando o coletivo não funciona, a bola chega muitas vezes, a zaga joga no limite e os problemas individuais acabam gritando.

Goleiros, laterais, volantes e até meias e atacantes também têm sua parcela de culpa, mas hoje o foco está nos zagueiros, que vêm falhando demais.
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2 Dec 20
A eliminação do Flamengo beira o inexplicável.

Um roteiro tão bizarro que chega a ser angustiantemente previsível.

Uma noite muito triste. Aliás, mais uma.
Na Argentina, oscilou, teve altos e baixos, passou perrengue no começo dos dois tempos, mas conseguiu empatar logo depois de tomar o gol e levou o 1x1 até o fim.

O Racing foi cansando e o Flamengo cresceu muito na segunda metade do segundo tempo.
Faltando 20 min de jogo, o time já controlava a posse e ditava o ritmo. Preocupado, Beccacece recuou o time, fez uma substituição para fechar o lado direito... Parecia que a virada viria naturalmente.

Até que Thuler foi expulso e tudo mudou.

Os minutos finais foram de sufoco.
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