Tô cansado de ver uma galera aí (incluindo médicos e outros profissionais da saúde), compartilhando o tal c19study.com e derivados como ivmmeta.com como "prova" que tratamento precoce com hidroxicloroquina e ivermectina funcionam.
Segue o fio pra entender.
Outro dia ouvi de alguém que esses sites sim eram "ciência de verdade" e que mostravam o resultado de boas "metanálises".
Uma metanálise é a "análise de várias análises", ou seja, é uma forma de analisar dados de vários estudos e conjunto, para extrair uma conclusão geral.
Só que existe método para isso ser feito. A metanálise é um recurso estatístico que está compreendido no campo das revisões sistemáticas. Ou seja, da mesma forma que uma revisão sistemática, precisa registrar o protocolo, estabelecer critérios de inclusão dos estudos etc...
Daria aqui pra fazer inúmeras críticas a esses sites, a começar pelo fato de ser um site anônimo. Sobre a parte técnica temos diversas questões: combinar dados que nem poderiam ser combinados, misturar diferentes desfechos, multiplicações pueris do valor de p, uso de pre-prints.
Mas uma das coisas que mais me incomodou foi o argumento de que esse "estudo" seria o mais imparcial e justo pois usou TODOS os ensaios clínicos (e artigos) com ivermectina e cloroquina disponíveis, ao contrário de outros estudos "tendenciosos" que "selecionaram" artigos...
O site traz: "To avoid bias in the selection of studies, we include all studies in the main analysis. " Tradução: "bota todos estudos lá, sem critério nenhum"
Tem gente fazendo confusãozinha entre "cherry picking" e critério de inclusão de artigo em revisão sistemática/metanálise
Cherry Picking: ficar escolhendo artigos que interessam apenas porque os resultados do estudo confirmam seu argumento - isso é péssimo.
Critério de inclusão: estabelecer critérios rigorosos a priori, para incluir na análise apenas estudos com boa qualidade - isso é fundamental.
Esses sites não estabeleceram critérios de inclusão, com a justificativa de que seria mais justo. É um argumento que soa coerente. Mas olha só: quanto menos rigoroso o estudo, maior a tendência em se obter resultados positivos. E a maioria dos ensaios clínicos tem baixo rigor.
Sendo assim, paradoxalmente, ao incluir todos os estudos sem critério, para ser imparcial, a análise passa a ser altamente enviesada e parcial, pois grande parte desses estudos possuem alto risco de vieses e estão ali apenas distorcendo as análises.
Esses sites NÃO SÃO metanálises. É um monte de "continha" com resultado bonito mas que não dizem absolutamente nada. Não à toa, praticamente tudo que analisam acaba tendo resultado positivo, de zinco a remédio pra piolho. Enquanto isso países colhem resultados com as vacinas...
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Essa semana jornais publicaram um anúncio pago sobre o "tratamento precoce". A história você já conhece:
"Não podemos ficar de braços cruzados enquanto pacientes estão morrendo. Precisamos tratá-los já"
Vamos conversar sobre tratamento precoce, medicina heroica e Dom Quixote?
Em 1860, o médico Oliver Holmes afirmou: “Se toda a matéria médica, como hoje é empregada, fosse afogada no fundo do mar, seria muito melhor para a humanidade – e muito pior para os peixes”.
Uma clara insatisfação à medicina como era praticada naquela época.
A assistência médica era baseada em práticas agressivas e sem comprovação. Essa fase foi denominada de "medicina heroica". A princípio pela bravura do médico tentando salvar vidas, mas onde ironicamente o herói era o paciente que sobrevivia ao tratamento e à iatrogenia...
"Eu não acredito na evolução, porque a Teoria da Evolução é SÓ uma teoria..."
Já passou da hora de entendermos a diferença entre o uso coloquial e o uso científico da palavra "Teoria".
Segue o fio de hoje...
Em debates da internet é muito comum ouvir esse tipo de frase, em especial de pessoas que negam algum aspecto científico.
Isso acontece em (falsos) debates sobre a "Teoria da evolução por seleção natural", a "Teoria da Relatividade" e até mesmo na "Teoria Heliocêntrica"
Na linguagem popular, "teoria" acaba sendo entendida como um conhecimento especulativo, de caráter hipotético. Em alguns casos, representa um conjunto sistemático de opiniões e ideias sobre um dado tema.
"Minha teoria é a de que o time de futebol X vai subir de série esse ano."
"Você pode argumentar o quanto quiser. Mas se a natureza (mundo físico) não concordar com você, você está errado."
Essa frase do Neil DeGrasse Tyson mostra a importância do método científico para diferenciar "verdades objetivas" de "verdades pessoais" (subjetivas)
Segue o fio.
"Você pode continuar acreditando no que quiser enquanto verdade pessoal" - ele continua - "mas a sua crença não faz com que isso se torne uma verdade objetiva."
Para estabelecer verdades objetivas precisamos testar ideias, usando o método científico.
Veja o exemplo do Neil:
Situação corriqueira: 1. Observação: Meu carro não liga. 2. Pergunta: A bateria descarregou? 3. Hipótese: Se a bateria descarregou, se eu carregá-la o carro vai ligar. 4. Experimento: Carrega-se a bateria 5. Resultado: O carro ligou 6. Conclusão: A bateria estava descarregada.
Hoje quero convidar vocês a valorizarem um dos mais importantes instrumentos de justiça social já produzido no Brasil: o Sistema Único de Saúde.
Mesmo em meio a crises e a seu constante subfinanciamento, o maior sistema de saúde do mundo promove inclusão social e contribui com o aumento da longevidade e qualidade de vida da população, beneficiando a todos, mesmo aqueles que acreditam nunca terem usufruído de seus serviços
Em meio a pandemia, devemos lembrar que fazem parte do SUS os centros e "postos" de saúde, hospitais, laboratórios, hemocentros, bancos de sangue, além de institutos de pesquisa como a Fundação Oswaldo Cruz. E isso é só a ponta do Iceberg. Você vai ser vacinado graças ao SUS.
O Coronavírus está no ar - há muito foco nas superfícies. Infectar-se pelo coronavírus a partir das superfícies é raro. A Organização Mundial da Saúde e as agências nacionais de saúde pública precisam esclarecer seus conselhos.
Este é o início do editorial da Nature do dia 02/02
Antes que alguém venha dizer que eu estou sendo irresponsável e falando que não precisa mais usar álcool em gel ou desinfetar superfícies, deixa eu esclarecer o que diz o editorial:
- É plausível que pessoas se contaminem por superfícies, mas o risco real é a contaminação PELO AR
E por que é importante falarmos sobre isso?
Porque vejo muita gente altamente preocupada em ficar limpando tudo, passando álcool o dia todo e não usando corretamente a máscara, não mantendo distanciamento e não ventilando adequadamente os ambientes.