1. Foi bom aprovar a PEC Emergencial? Do lado positivo, finalmente, sairá do papel a autorização para o auxílio (ainda dependendo de MP ou Lei). Do lado negativo, muitas complicações no texto constitucional para pouco ajuste fiscal, na prática. É muito barulho por (quase) nada.+
2. Este fio não tratará do "juridiquês" da PEC, mas das diretrizes da proposta e de suas eventuais consequências fiscais (e econômicas). Então, vou falar de: auxílio, ajuste da União e ajuste dos estados. +
3. O auxílio emergencial poderia ter sido feito há 2 meses, por meio de crédito extraordinário. A Constituição garante isso qdo há imprevisibilidade e urgência, binômio presente no caso em tela. Ou alguém projetava que chegaríamos a mais de 2.300 mortes diárias? +
4. Bem ou mal, optou-se por alterar a Constituição para promover o auxílio. Criou-se um arcabouço complexo e que vai gerar problemas para eventuais edições de novos créditos extraordinários no futuro. O "medo" vai crescer e esse instrumento ficará ainda mais prejudicado.+
5. O auxílio estará limitado a R$ 44 bilhões, o que deve permitir financiar 5 meses de auxílio para algo como 45 milhões de pessoas, a R$ 250/mês, já fazendo a conta líquida dos benefícios pagos, atualmente, no âmbito do Programa Bolsa Família (R$ 190/mês). +
6. O auxílio deve, então, produzir algum efeito sobre a demanda agregada, além de socorrer as famílias. A depender do ritmo da vacinação, será insuficiente. O efeito vai ser de 0,6% do PIB, bem menor que os 4% de 2020, c/ escrevi com @rbacciotti aqui 👇 www1.folha.uol.com.br/mercado/2021/0….
7. Sobre a parte fiscal da PEC, começo pela União. Criou-se nova regra fiscal, que deverá conviver com: meta de déficit primário, teto de gastos (que não foi revogado, mas ficou sem sanção) e limite de dívida pública (novidade da PEC). +
8. A nova regra fiscal determina que, se a despesa obrigatória da União ultrapassar 95% da despesa primária total, ambas sujeitas ao teto, uma lista de medidas automáticas de contenção de despesas (gatilhos) será ativada. +
9. Mas, o problema original que a PEC pretendia resolver remanesce. Os gatilhos, que já existiam na regra do teto, não podem ser acionados na Lei Orçamentária Anual. Agora, sim, poderão, mas por nova regra, a dos gastos obrigatórios/despesas primárias, ambas sujeitas ao teto. +
10. O teto, por sua vez, ficou sem sanção. Rompê-lo não dispara mais medidas de ajuste (gatilhos). Descumpri-lo, portanto, a meu ver, ensejaria crime de responsabilidade. A regra para disparar ajuste fiscal, agora, é o tal limite de 95% de despesas obrigatórias sobre primárias. +
11. Ora, dada a importância que, claramente, a nova regra ganhou, ela deveria, no mínimo, estar adequadamente calibrada. Não está. A despesa obrigatória sujeita ao teto dividida pela primária total sujeita ao teto só atingirá 95% em 2025. Que ajuste emergencial é este, então? +
12. Em 2022, a PEC não gerará ajuste algum. Repito, ajuste zero para a União como consequência dessa PEC. Inclusive, a depender da inflação do fim do ano em relação à do meio do ano, poderá haver espaço para conceder reajustes salariais, curiosamente, em ano eleitoral. +
13. Então, é muito barulho por nada. Se nós temos as contas, o governo também as tem. O %, para gerar ajuste em 2022, tinha de ter sido fixado em 93%, e não em 95%. A porta para aumentar gasto obrigatório, em 2022, estará aberta (dado o teto, claro). +
14. No cenário base da @IFIBrasil, o gasto de pessoal sai de 4,4% (2020) para 3,6% do PIB, em 2026. Para tanto, o gasto teria de crescer apenas pela taxa vegetativa, sem qualquer reajuste. A PEC, como aprovada, não garantirá isso, vale dizer. +
15. Nossa premissa baseia-se no fato de que reajustes só seriam concedidos a partir de 2027, porque a regra do teto permitirá alterar o indexador do limite no décimo ano (2026). Vale ressaltar: o superávit primário, no cenário da IFI, não retorna em horizonte de uma década. +
16. "Ah, mas qual o efeito da PEC?" Bem, para a União, zero a curto prazo. Quando puder fazer algum efeito, em 2025, já estaremos próximos da possibilidade de alterar o indexador do teto. Virtualmente, poder-se-ía dizer que a queda de pessoal representaria o "efeito da PEC". +
17. No caso das progressões e promoções, que devem sair dos gatilhos, agora, na apreciação da PEC neste segundo turno, na Câmara, seus efeitos seriam significativos, se pudessem valer já a partir de 2022. O gasto cresce de R$ 5 a 10 bi ao ano em razão das progressões. +
18. Passando, agora, aos estados e municípios. A regra é diferente da proposta para a União. O indicador de referência para acionamento dos gatilhos é a despesa corrente/receita corrente. Se ultrapassar 95%, podem-se acionar gatilhos. +
19. Além disso, há uma regra secundária, que permite acionar gatilhos a partir de 85%, mas c/ autorização do Legislativo do Ente. Para a regra dos 95%, se estiver enquadrado e não adotar as medidas, a sanção é não ter aval do Tesouro para eventuais novas operações de crédito. +
20. Pelas contas da Capag/Tesouro, o indicador de despesa corrente/receita corrente aponta que 14 estados estariam enquadrados nos 95%. Mas como isso dependerá de comparar os cálculos do Tesouro com os dos estados, é difícil antever efeitos fiscais. Além de não ser mandatório. +
21. As progressões e promoções não estarão barradas pelos gatilhos, assim como no caso da União, pelo acordo feito e que será ainda concretizado no segundo turno (que acontece enquanto escrevo esse fio). Mas podemos fazer cálculos exploratórios para antever potencial impacto. +
22. A despesa com pessoal (ativo e inativo) dos Estados e Municípios, em 2018, foi de R$ 811,3 bi. Em 2019, R$ 839,7 bi. O crescimento foi de 3,5%. Se, neste total, o crescimento vegetativo correspondesse a 3%, o restante poderia ser atribuído a contratação/reajustes (0,5%).+
23. Assim, entre 2018 e 2019, se o crescimento tivesse ocorrido apenas por 3%, e não por 3,5%, no conjunto de todos os estados, municípios e DF, a despesa teria ficado R$ 4 bi mais baixa. Mas esta é apenas uma hipótese, de caráter preliminar e exploratório. +
24. A despesa dos estados corresponde a 63% dos totais acima. Então, supondo que metade dos estados adotasse as medidas da PEC - uma vez enquadrados e optando por esse caminho - o efeito da PEC sobre os estados seria uma economia anual de algo como R$ 1,3 bi. +
25. Claro, se mais estados adotarem os gatilhos e o cenário de referência para o cálculo não for parecido com o do período 2018/2019, a economia poderia ser maior. Tb há a questão da arbitragem do percentual de despesa corrente/receita corrente p/ os muincípios,vale dizer. FIM.
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1/5. Nesta tabela do RAF publicado em fev/21 pela @IFIBrasil, veja a evolução do gasto de pessoal. Em 2021, gastos adicionais com os cerca de 50 mil cargos do PLOA (2,4 bi) e alta de 3% (taxa vegetativa). Até 2026, só 3% de taxa vegetativa, sem redução líquida de quantitativo.+
2/5. A aprovação da PEC Emergencial não vai produzir efeitos sobre este cenário até 2025. Isso porque o gasto obrigatório representará mais de 95% da despesa primária (ambas sujeitas ao teto de gastos) só em 2025. O que poderá acontecer é o inverso.+
3/5. Sem gatilhos no ano que vem, se houver espaço no teto, o caminho para reajustes estará aberto. Então, não há efeito fiscal imediato com a aprovação da PEC. Isso precisa ficar claro. Nos estados e municípios, a coisa pode ser diferente, mas isso depende... +
1/10. A complementação de voto do relator, Senador @marciombittar, veio com algumas mudanças, mas nenhuma que cause impacto fiscal ou retire gastos do teto para além do auxílio emergencial. +
2/10. Dentro dos gastos tributários, a redução a ser aplicada, em 8 anos, conta nova exceção: renúncias ligadas a bolsas de estudo para estudantes de cursos superiores. São, portanto, cinco exceções: Zona Franca, Filantrópicas, Fundos Constitucionais, Cesta Básica e esta nova. +
3/10. Também no artigo 115 do ADCT, agora se incluíram normas que preconizam a avaliação dos gastos tributários e sua redução, ao longo do tempo, para além da regra geral (redução nominal de 10% no primeiro ano e convergência a 2% do PIB em 8 anos). +
1/n. Fio sobre os novos cenários da @IFIBrasil, que divulgamos, ontem, no Relatório de Acompanhamento Fiscal (RAF). Também simulamos o custo do auxílio emergencial.
2/n. a A atividade econômica deve pautar-se, em 2021, por uma recuperação lenta, marcada pelo carry-over elevado, em razão da recessão. O PIB deve crescer 3%, pelas nossas contas. A IFI já estava na ponta mais pessimista, entre analistas e mercado em geral, vale dizer. +
3/n. Os indicadores de indústria, comércio e serviços mostram desempenho pouco homogêneo. O auxílio parece ter influenciado muito o comércio (PMC), temporariamente, a indústria (PIM) segue recuperação mais consistente e Serviços (PMS), na pior situação, como se vê no gráfico. +
1/n. Sobre o texto que circulou, hoje, da PEC emergencial (ainda não foi formalizado e, portanto, pode mudar), ficam aqui meus dois centavos para o debate. Vale dizer, são muitas alterações, com elevada complexidade técnica, isso sem entrar na questão política. +
2/n. A primeira mudança é no art. 6º da Constituição. Inclui-se, nos direitos sociais, parágrafo único para mandar que seja "observado, na promoção e na efetivação dos direitos sociais, o equilíbrio fiscal intergeracional.” +
3/n. A segunda mudança refere-se aos gastos com previdência e pensionistas do Poder Legislativo Municipal. Eles passam a ser incluídos para fins dos limites do art. 29-A da Constituição. A saber, os limites variam de acordo com o tamanho do Município. +
1/6. Muitas perguntas sobre por que preço não pode ser controlado. Vou tentar falar aqui de maneira didática. +
2/6. Preço é resultado da demanda e da oferta. Quando a procura é maior do que a oferta, em termos relativos, o preço aumenta. O inverso é válido também. Isso vale para qualquer mercado, como regra geral. Ao fixar preço, essa lógica é maculada. +
3/6. Quem ofertaria, ao preço de mercado, pensará duas vezes se vai ofertar ao novo preço, agora fixo. Se um produtor não pode cobrar o preço de mercado, ele produz menos do que a quantidade que os consumidores estão dispostos a comprar. +
1/n. “Não tem onde cortar?” Um escrutínio da proposta orçamentária de 2021, em debate na Comissão Mista de Orçamento (CMO), mostra que há muita coisa disponível à tesoura ✂️. +
2/n. O orçamento de subsídios sujeitos ao teto de gastos está em R$ 14 bilhões. Por que não cortar R$ 4 bilhões desta rubrica? Seria preciso revisar programas que estão sob esse guarda-chuva, claro, com custo político (observação que vale para os próximos itens também). +
3/n. No PLOA, há R$ 7,1 bi de alta para pessoal militar (lei 13.954/19). Trata-se de exceção à lei complementar 173/20, que impediu reajustes a todas as outras carreiras. Por que esse tratamento diferenciado? A foto é da exposição de motivos do PL que deu origem aos reajustes. +