Faz um tempo, eu tava morando em Jaboatão dos Guararapes, em Pernambuco, e as coisas estava bem estranhas, sabe?
Foi logo no início da pandemia, e vocês imaginam passar por toda aquela loucura, só eu e minha filha, tendo que aguentar as incertezas desses tempos doidos.
Especialmente minha filha, a Juju, estava sofrendo muito.
Apesar de sempre termos sido caseiros, com a chegada da pandemia acabamos nos trancando mais, isolados de tudo e todos, o que certamente a deixou bem nervosa, e eu sentiu tudo também, porque sempre fomos muito ligados.
Nunca achei que fosse loucura, mas Juju começou a falar muito sobre um anjo... uma espécie de anjo da guarda que queria se aproximar e estar ao lado dela naquele momento. Um ser de luz que dizia estar ali para nos proteger.
Eu perguntava sobre ele, mas Juju não sabia falar nada.
Inclusive, ela pedia, implorava, nas suas rezas, para que ele aparecesse, que nos desse uma luz de sua existência, e assim foi por alguns dias...
A vizinhança:
A vizinhança parece que não vivia a pandemia. Especialmente nos finais de semana, era festa sempre.
E aquelas festas, aquela gente que parecia alheia à realidade, mais nosso enclausuramento, nosso medo, tudo isso fazia Juju ficar cada vez pior.
Até que ela adoeceu.. do nada, começou a ficar mofina, mas sem sinal de febre, sem sinal de covid...
Me senti desamparado.
Porque aquela moleza, aquela dor na alma, crescia cada vez mais, ao mesmo tempo que crescia meu medo e minha raiva, e o barulho da festa dos vizinhos, e os gritos de alegria, as gargalhadas, tudo isso rolando enquanto o mundo se acabava lá fora... era terrível.
Foi nessa época que Juju intensificou seus pedidos para que aquele pretenso anjo de luz nos protegesse, que ele surgisse e desse, ao menos, um sinal de sua existência.
Quanto mais as coisas desandavam, mais Juju se apegava a isso, até que, certa noite, algo aconteceu.
Outra noite como aquelas tantas, de angústias e som alto...
Do nada, uma batida no portão da frente de casa. Pelo buraco do cadeado, por onde passava uma mão, eu vi olhos secos que vasculhavam nossa morada.
- Ju, fica aqui que vou ver quem é.
E sai..
De cara, fiquei com medo.
Já era tarde da noite e logo pensei que pudesse ser alguém mal intencionado.
Só que, ao chegar no portão, minha impressão foi completamente outra.
Ali estava um homem velho, todo vestido de preto, forte e firme, mas cansado.
Em Jaboatão, moravamos em uma enorme ladeira. Da minha casa para o fim da serra tinham somente outras quatro casa.
Aquele senhor cansado, que me esperava na entrada, certamente havia subido a ladeira toda.
- Boa noite...
- Boa... a senhora pode me dar um copo de água?
- Um segundo, já volto com a água...
Mais tranquilo, entrei em casa, peguei o copo e levei a ele, que, curiosamente, estava sem máscara, o que estranhamente, não me irritou tanto.
- Obrigado pela água, dona.
Mas algo ali não estava certo.
É que, na casa do lado, havia uma festa torando, portão aberto e gente na calçada. E na frente de casa, a mesma coisa... Porque aquele homem teria vindo justamente à minha casa, toda fechada, escura, recolhida...
- Tem mais água?
Precavido, tinha levado a garrafa.
- Tava com sede, né?
- Tava sim.
- Subir essa ladeira não é simples, né?
- Mas eu não subi a ladeira... eu vim de cima.
E, ao falar isso, ele olhou para cima, como se a procurar uma simples núvem de chuva.
- De cima? De lá? - Apontei para o fim da rua.
Sem me responder, o homem me entregou o copo, sorriu e disse:
- Em vim de cima. Nem sempre bebo água lá...
E antes que pudesse falar qualquer coisa, ele continuou:
- A menina vai ficar bem, acredite. Vocês têm um ao outro. Tudo isso vai passar...
Nessa hora eu fiquei tão aturdido, como se tivesse levado um soco.
Ainda zonzo, senti a mão do homem na minha, uma mão fria e forte, e ele recomendou:
- Melhor você entrar. O que tinha que fazer, já fiz.
Sem questionar, virei, fechei o portão e entrei.
Foi já na porta de casa que comecei a ouvir o choro da Juju.
Desesperado, como se tivesse acordado de um transe, corri para a sala e encontrei minha filha rindo, feliz, com os olhos cheios de lágrima, num puro e sincero choro de felicidade.
- Pai... eu to tranquila agora.
- Agora eu tenho certeza, pai. Esse anjo que tenho sentido, que tenho visto... não sei como, pai, mas agora tenho certeza. Vamos ficar bem.
Rapidamente, contei a ela tudo que tinha acabado de me acontecer, e corremos para a porta para procurar aquele homem, mas não havia mais.
Sem entender nada, ainda fui até os vizinhos, eles todos na rua, curtindo a pandemia na calçada, e perguntei se tinham visto o homem que estava agorinha na frente de casa. Para onde tinha ido... mas, meio assustados, todos responderam que não viram nada, nem ninguém.
Segundo eles, somente tinham me visto... eu tinha saído, e realmente tinha algo nas mãos, mas parecia só ter observado a rua e entrado, e mais nada.
Se houve um anjo, algum ser, qualquer ser, não era desse mundo e somente eu vi, e somente Juju sentiu...
Do que ele vaticinou, foi assim: não enlouquecemos, tivemos um ao outro e passamos pela pandemia, e ainda passamos, seguros. Perdemos muitos no caminho, e choramos, mas seguimos aqui, firme e fortes, certos de uma presença estranha que, por qualquer razão, nos guarda.
Fim
Essa história e baseada no que aconteceu com a @zonadeconfete e coma filha dela, a Juju, a @ice_queennie, de fato, em Jaboatão, numa enorme ladeira do bairro da Vista Alegre.
Das tantas coisas que ninguém consegue explicar nesses tempos loucos.
Dick Rowland, um jovem engraxate negro, de 19 anos, adentra no único prédio do centro da cidade que dispunha de banheiro liberado para "pessoas de cor"
Isso, nos EUA onde vigoravam regras racistas horrendas e desumanas.
Quando Dick entra no elevador, encontra a operadora da cabina, Sarah Page.
Existem muitas versões dos fatos, mas sobre duas coisas se tem certeza:
1. Eles se conheciam, mesmo que minimamente, e se reconheceram.
2. Logo após Dick entrar no elevador, Sarah deu um enorme grito.
Seguido ao grito, por qualquer razão que talvez jamais seja elucidada, Dick correu do prédio.
Muito provavelmente por saber que, naquela época, naquele lugar, diante do grito de uma mulher branca, um rapaz negro provavelmente seria acusado de alguma coisa.
Na história de hoje, vou mostrar como pessoas simples podem fazer uma enorme diferença no mundo, e como, por vezes, as reações humanas são mais estranhas do que podemos supor!
Para começar, vamos para Inglaterra, final do Século XIX:
Lá nasceu Elsie Knocker, em 1884. Seguindo o roteiro da época, se formou em enfermagem, se casou e, em 1907, nasceu seu único filho, Kenneth.
Com o casamento fracassado, Elsie tentou se divorciar e se deparou com a total impossibilidade diante das leis da época.
Sem alternativas, e diante do medo de reprovação da sociedade, ela saiu de casa com o filho, foi viver do pouco de seu trabalho e disse a todos que seu marido havia morrido.
"Viuva", Elsie deu total atenção à sua grande paixão desde a infância: as motocicletas.