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Ariel Palacios @arielpalacios
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Na Argentina comemora-se hoje o “Dia del Hijo de Puta”, em homenagem ao natalício do ex-ditador Jorge Rafael Videla (nascido em 1925 nesse dia).
A data foi criada em 2011 pela revista satírica argentina “Barcelona”, cujos integrantes da Redação consideraram que os “hijos de puta” mereciam ser recordados com uma efeméride.
O 2 de agosto foi a data escolhida, já que consideraram que Videla era um emblema dos filhos da p.. da Argentina.
Nas redes sociais o assunto costuma ter grande sucesso.
Evidentemente, as mensagens do dia não são monopolizadas pela figura de Videla, já que também são realizadas declarações de “feliz dia do filho da p...” a parentes, chefes, empresários, políticos, entre outros.
Videla acumula uma substancial quantia de “milhas” como emblema dos “filhos da p...” da Argentina, já que possui um frondoso curriculum vitae de ações que o tornam merecedor do epíteto.
A seguir, uma breve lista dos pontos de Videla para conseguir o título em seu país:
Desaparecidos:
- Durante a Ditadura, militares e policiais argentinos assassinaram ao redor de 30 mil civis (segundo organismos de defesa dos Direitos Humanos argentinos e organizações internacionais), a maioria dos quais sem militância na guerrilha.
-A Comissão Nacional de Pessoas Desaparecidas (Conadep) reuniu o registro de 9 mil denúncias de pessoas desaparecidas.
- Os militares afirmam que assassinaram “somente” 8 mil civis (segundo declarações dos ex-ditadores Reynaldo Bignone e Jorge Rafael Videla)
Bebês sequestrados:
- Durante a Ditadura 500 bebês foram sequestrados, filhos das desaparecidas (segundo dados das Avós da Praça de Mayo)

- Mais de uma centena de crianças desaparecidas foram recuperadas ou identificadas por suas famílias biológicas.
Fracassos econômicos e militares:
– Além de ter sido a mais sanguinária Ditadura foi um fracasso tanto na área militar como na esfera econômica.
Fiascos Militares:
- Entre 1976 e 1978 a Ditadura colocou quase a totalidade das Forças Armadas para perseguir uma guerrilha que já estava praticamente desmantelada desde antes do golpe, em 1975.
Analistas militares destacam que este desvio das Forças Armadas argentinas (que havia iniciado no final dos anos 60 mas intensificou-se a partir do golpe) reduziu drasticamente o profissionalismo dos militares.
- Em 1978, Videla levou o país a uma escalada armamentista contra o Chile. Em dezembro daquele ano, a invasão argentina do território chileno foi detida graças à intermediação papal. O custo da corrida armamentista colocou o país em graves problemas financeiros.
- Em 1982, perante uma crise social, perda de sustentabilidade política e problemas econômicos, o então ditador Galtieri decidiu invadir as Malvinas p/distrair a atenção da população. Resultado:após breve período de combate,os oficiais do ditador renderam-se às tropas britânicas
Desastres econômicos:
- Em sete anos de Ditadura, a dívida externa subiu de US$ 8 bilhões para US$ 45 bilhões.
-A inflação do gov.civil derrubado pela Ditadura, q era considerada um índice “absurdo alto”pelos militares havia sido de 182% anual.Mas este índice foi superado pela política econômica caótica da Ditadura,q encerrou sua administração com 343% anual
- A pobreza disparou de 5% da população argentina para 28%
- A participação da indústria no PIB caiu de 37,5% para 25%, o que equivaleu a um retrocesso aos níveis dos anos 60.
- Além disso, a Ditadura criou uma ciranda financeira, conhecida como “la plata dulce”, ou, “o doce dinheiro”.
- Ao mesmo tempo em que tomavam medidas neoliberais, como a abertura irrestrita das importações, os militares continuavam mantendo imensas estruturas nas empresas estatais, que transformaram-se em cabides de emprego de generais, coronéis e seus parentes.
- No meio desse caos econômico, os militares provocaram um déficit fiscal de 15% do PIB.
Além de serial killer com cargo presidencial, Videla foi um piromaníaco, já que ordenou incinerações de livros.
Na lista de autores suspeitos dos jecas militares estavam escritores como Gabriel García Márquez, Julio Cortázar, Sigmund Freud
.... e até Marcel Proust, autor do burguês “Em busca do tempo perdido” (obra que para o regime de Videla era um panfleto “marxista” e “pervertido”).
O regime proibiu o ensino da teoria matemática dos conjuntos, por considerá-la “subversiva”. A palavra “vetor” também foi proibida nas escolas, já que os militares consideravam que era utilizada na terminologia marxista.
Em 1980 proibiu o livro “O pequeno príncipe”, do francês Antoine de Saint-Éxupery, por considerá-lo “subversivo” para as crianças argentinas.
Falando em crianças, Videla acumula mais pontos para ser o emblema dos “filho de p...” da Argentina por ter escondido durante décadas existência de um filho com problemas mentais, já que isso “envergonhava” a família.
O garoto, Alejandro Videla, foi criado em um asilo por duas freiras francesas, com muito carinho, até que morreu em 1971 aos 19 anos (na foto da capa dessa revista só aparecem os filhos que Videla mostrava ao público)
Cinco anos depois, já no início da ditadura, estas freiras, Léonnie Duquet e Alice Domon, que eram francesas, começaram a ajudar as mães dos desaparecidos, um pequeno grupo que depois seria conhecido como as Mães da Praça de Mayo.
Elas foram seqüestradas na Igreja de Santa Cruz. Videla foi informado de sua prisão. Mas nada fez para liberar as freiras que haviam tomado conta do filho que ele se encarregou de “desaparecer” em um asilo.
As freiras foram torturadas com descargas elétricas nos genitais e posteriormente assassinadas, arremessadas desde um avião sobre o Rio da Prata.
As torturas aplicadas pela ditadura do general Videla acumulavam diversas modalidades, entre as quais a “picana elétrica”, criada nos anos 30 na Argentina por Leopoldo Lugones Hijo, filho do escritor nacionalista Leopoldo Lugones.
A picana era o instrumento para assustar o gado com choques elétricos nos currais, e assim, direcioná-lo para o abate ou embarque. Aplicado a seres humanos, tornou-se no instrumento preferido de tortura na Argentina.
Outra modalidade era o “submarino molhado”, que consistia em afundar a cabeça de uma pessoa em uma tina d’água, cheia de excrementos humanos.
Os militares também aplicavam o “submarino seco”, que consistia em colocar a cabeça de uma pessoa dentro de um saco de plástico e esperar que ela ficasse quase asfixiada.
Além destes, as forças de segurança eram adeptas da modalidade “o rato no cólon”, que implicava na colocação de um rato, faminto, no cólon de um homem. Nas mulheres, o rato era colocado na vagina.
As forças armadas também praticaram sistemáticos estupros em homens e mulheres. As mulheres, ocasionalmente recebiam a opção de serem estupradas ou de serem eletrocutadas na parte interna da vagina e ânus.
Além disso, colocaram em prática uma modalidade aplicadas pelos indígenas argentinos até o século dezenove quando aprisionavam os colonizadores espanhóis, o “esfolamento”:
...os torturadores amarravam um prisioneiro em uma mesa e começavam a esfolar a pele da sola dos pés com uma gilette ou bisturi.
Além disso, aplicaram em diversas ocasiões o “empalamento” de homens com cabos de vassoura (a imagem é de uma gravura do barroco, para ilustrar)
Levando em conta o breve resumo citado acima, Videla teve um curriclum vitae frondoso de ações de “filho da p....” em volume suficiente para ser o merecedor desse título.
E embora a expressão “Hijo de puta” seja usada majoritariamente em sua versão “standard”, os argentinos utilizam um amplo leque de versões que que pretendem intensificar o epíteto.
Breve interlúdio musical: de Luigi Boccherini, as Sonatas para Harpa and Flauta:
Trabalhadoras sexuais explicam que, apesar do epíteto popular mundial, não são mães de políticos
Levando em conta o breve resumo citado acima, Videla teve um curriclum vitae frondoso de ações de “filho da p....” em volume suficiente para ser o merecedor desse título.
A expressão é um dos disfemimos (o oposto de ‘eufemismo’) mais hit parade no planeta, desde tempos ancestrais...
Essa é uma forma universal para explicitar o desagrado com alguém de forma indireta, ao indicar que a mãe de alguém exerce atividade sexual paga.
É uma peculiar ofensa elíptica, já que não é direcionada ao interlocutor ou alvo da crítica, mas sim à sua progenitora.
No entanto, o mundo dos insultos nem sempre tem uma lógica cartesiana.
E embora a expressão “Hijo de puta” seja usada majoritariamente em sua versão “standard”, os argentinos utilizam um amplo leque de versões que pretendem intensificar o epíteto.
Uma delas é “hijo de mil putas” (filho de mil putas), uma condição impossível, pois a pessoa seria filho de múltiplas mães (um milhar, neste caso).
No entanto, é uma licença poética permitida aos epítetos.
Outro formato é indicar que alguém é um “reverendo hijo de puta”. “Reverendo” é uma fórmula de tratamento que se antepõe ao nome próprio dos graduados de uma ordem religiosa.
Mas em espanhol é utilizada para intensificar uma qualidade negativa.
Por exemplo, “é um reverendo picareta!”. Bom, neste caso, pode ser usado como “reverendo hijo de p...” ou ainda no formato numérico como “reverendo hijo de mil p....”.
Alguns dicionários europeus citam a expressão “filho da p…” no século 17.
Aliás, aparece em “Rei Lear”, de William Shakespeare, em 1605 E o bardo de Stratfor-on-Avon usa mesma expressão duas vezes em um parágrafo.
Mas, por uma questão de edição e elegância, para não repetir o termo clássico, usa um substituto. Isso ocorre na parte da peça quando o personagem Osvald pergunta ao Duque de Kent o que acha dele.
E o duque responde: “Um canalha, um patife, um comedor de restos; um velhaco arrogante, estúpido, indigente, que tem apenas três roupas e meias fedorentas, um filho da puta covarde, sem sangue no fígado...
..., que foge da luta e se queixa à justiça, trapaceiro afeminado e sabujo. Um escravo que herdou apenas um baú, que presta serviço numa alcova, um alcoviteiro;
..no fim, uma mistura de canalha, mendigo, covarde, rufião, filho e herdeiro de uma cadela bastarda a quem eu espancarei até que estoure em berros, se negar a menor sílaba do que eu disse agora”.
Além dos clássicos da literatura, a expressão em alemão, “Hurensohn”, já aparecia em 1710 na ópera “Croesus”, de Reinhard Keiser:
Alguns especialistas sustentam que o insulto perdeu sua força nos últimos anos em todo o mundo, devido a seu intensivo uso cotidiano. Inclusive, porque ocasionalmente ele é usado como elogio.
Isso já acontecia no século 16, quando Miguel de Cervantes, em seu livro “O Quixote”, coloca na boca de seu personagem Sancho Pança uma explicação na qual indica que, eventualmente, a expressão não é um xingamento, mas sim um elogio.
E voltando ao séc 21: a pressa do mundo moderno fez que em vários países hispano-falantes a expressão original tenha se contraído, em algo que soa como “Jópú”.
O motivo desta thread é a comemoração, nesta 5afeira, do “Dia del Hijo de Puta”, em homenagem ao natalício do ex-ditador Jorge Rafael Videla (nascido em 1925 nesse dia).
A data foi criada em 2011 pela revista satírica argentina “Barcelona”, por considerar que os “hijos de puta” mereciam ser recordados com uma efeméride.
Nas redes sociais, evidentemente, as mensagens do dia não são monopolizadas pela figura de Videla, já que também são realizadas declarações de “feliz dia do filho da p...” a parentes, chefes, empresários, políticos, entre outros.
Há meia década, em 2013, quando faleceu, idela, protagonista da mais sangrenta ditadura da América do Sul no século XX,estava cumprindo prisão perpétua na penitenciária de Marcos Paz pelo seqüestro, tortura e assassinato de civis, além do roubo de bebês, filhos das desaparecidas.
Muitos generais morrem em campo de batalha, outros são assassinados em revoluções e golpes de Estado.
Alguns morrem na placidez do leito em suas casas dizendo (e alguns, com seu último suspiro, pronunciam alguma frase patriótica retumbante).
Mas, o ex-general Videla morreu em um âmbito de menor teor heróico: o vaso sanitário de sua cela.
Ali, o outrora todo-poderoso ditador, com calças do pijama arriadas, longe da pose marcial, foi encontrado pelos guardas, que o viram sentado, reclinado para a frente, ao lado do prosaico rolinho de papel higiênico.
Esta forma de encerrar a carreira não abunda na tradição militar...
...É um óbito que entrou - ipso facto - para os anais da História.
Breve interlúdio musical: de Julius Fucik, a valsa “Tempestades de inverno”, opus 184:
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