Eu tenho muito investido no Brasil pra não poder torcer pra que qualquer governo dê errado. Todo meu dinheiro é investido aqui, minha família e maioria dos amigos estão aqui, quero criar meus filhos e morrer aqui.
Na parte econômica, "não dar errado" por enquanto é arrumar as contas do governo e manter a inflação baixa, pra ficar no mínimo. Pro país enriquecer no longo prazo, o primeiro requisito é não perder muito tempo com recessões.
Nenhum dos candidatos do segundo turno consegue me deixar tranquilo quanto a isso. Haddad segue defendendo um programa tresloucado, o Bolsonaro do Paulo Guedes é muito diferente do Bolsonaro histórico e do que ele trás pro governo.
Pra piorar, a eleição pro Congresso foi muito ruim do ponto de vista de conseguir aprovar reformas. Conseguimos sair com um Congresso ainda mais fragmentado, cuja segunda maior bancada é de um partido de aluguel que praticamente não existia até este ano.
Também acho que vai piorar a coordenação entre Câmara e Senado. Não fiz contas, mas também me parece que as corporações estão ainda mais representadas.
Apesar de ter muita gente no mercado financeiro que acha que o ouço fundo vai ser bom, acho que a maior parte da euforia é técnica -- havia muito pessimismo com o Brasil, só a passagem de "underweight" pra "market weight" tem grande amplitude.
Acreditar que o próximo governo vai ser bom exige uma "suspensão de descrença" enorme. O cenário-base pra qualquer governo no Brasil tem que ser de medíocre pra ruim, e acho que no próximo tem mais elementos pra achar que vai ser ruim do que só medíocre.
Outra coisa: renovação é uma delícia, etc., mas um mastodonte como o Estado brasileiro precisa muito de políticos profissionais. A próxima legislatura terá muito menos desses.
No mais, Paulo Francis tinha razão: pra quem vive de vender opinião, a melhor postura é anarquista: "hay gobierno, soy contra". O político médio tem que ser tratado na chinelada.
Nem estou muito pessimista com a economia ano que vem. O governo Temer fez um ajuste importantíssimo na economia. A recuperação segue por inércia por algum tempo.
A inflação está baixa, as contas externas estão bem, tem muita gordura nos preços de ativos que também pode ajudar no crédito (as tais condições financeiras).
O problema de fundo é mesmo o fiscal. Num cenário bom, o mercado global fica tranquilo e deixa o Brasil fazer um ajuste gradual, ainda que provavelmente de baixa qualidade (mais subindo imposto que cortando gasto).
Num cenário ruim, que, de acordo com muitos dos meus clientes, é o mais provável, gradualismo não vai resolver e o mercado vai pedir juros bem mais altos pra seguir financiando a dívida (isso, claro, também dificulta o ajuste).
Isso pra não falar da agenda totalmente esquecida de investimento público, educação, etc. Os desafios são colossais e temo não termos governo à altura pra enfrentá-los. É preciso estar atento e forte, etc. FIM.
