Thread by @GCasaroes

O PRIMEIRO SPEECH A GENTE NUNCA ESQUECE

Bolsonaro, em Davos, fez um brevíssimo discurso, que ele mesmo admitiu ter sido escrito a diversas mãos. Se, na superfície, a fala pareceu muito comedida e genérica o bastante para não desagradar, algumas coisas chamaram a atenção.

1) Houve uma clara tentativa de agradar aos interlocutores de Davos, ao trazer o tema ambiental. "Somos o país que mais preserva o meio-ambiente". Tratou, como esperado, preservação e desenvolvimento como temas "interdependentes e indissociáveis". O 🇧🇷diz isso há meio século.

2) Três ministros citados nominalmente: Moro, Guedes e @ernestofaraujo. Além de estarem na delegação, eles são importantes pq se encaixam na narrativa do Novo Brasil, de superação da crise ética (combate à corrupção), moral (antiglobalismo conservador) e econômica (liberalismo).

3) No mais, foi um discurso que contemplou o que venho chamando de "os cinco Bs do governo": além da bancada BBB (Boi/Bíblia/Bala), o B de bancos, referente aos liberais da equipe econômica, e o B de Bolsonaro, relativo a núcleo olavista/antiglobalista. Jogou p/ plateia interna.

4) Bíblia (evangélicos): falou em defesa da família, dos "verdadeiros" direitos humanos (conceito que não faz sentido em nenhum lugar do mundo), proteger o direito à vida (contra o aborto) e à propriedade privada (em referência, talvez, à questão das armas).

5) Boi (ruralistas): fez elogios à tecnologia da agroindústria, ao superávit gerado pela exportação de commodities e ao papel do Brasil na garantia da segurança alimentar do mundo. Falou sobre reforma da OMC, tema caro ao agronegócio, na única menção concreta à política externa.

6) Bala (agentes de segurança/militares): fez uma associação meio torta c/ turismo p/justificar "investimentos pesados em segurança". Ao falar que o 🇧🇷é um paraíso ainda inexplorado, escorregou p/retórica ufanista, típica dos militares. Elogiou biodiversidade e recursos minerais.

7) Bancos (Guedes/liberais): reforçou as pautas de equilíbrio fiscal e privatizações. Disse que abertura econômica é principal compromisso do governo. Na seção de perguntas, tocou, superficialmente, no tema das reformas da previdência/tributária. Falou muito em empreendedorismo.

8) Bolsonaro (antiglobalistas/olavistas): falou 3 vezes em acabar c/o viés ideológico da diplomacia e do comércio. Adiante, deixou claro que quer ver a América Latina e o mundo livres da esquerda e sinalizou coordenação com outros governos de direita na região 🇵🇾🇨🇱🇦🇷 p/este fim.

9) Minhas impressões gerais são as seguintes: foi um discurso muito curto, de pouco brilho e impacto. Deu as linhas gerais do "novo Brasil", mas ficou muito preso aos grupos internos. Não se preocupou em dar coesão à fala, que ficou fragmentada e desconexa, mesmo em 6 minutos.

10) Acertou em falar de meio ambiente, combate à corrupção, abertura. Talvez ñ saibam que há muitos negacionistas climáticos no governo. Também achei bom ele ter falado em incorporar "melhores práticas" da OCDE, sinal de que, na hora H, Moro e Guedes falam + alto que Ernesto.

11) Errou feio ao manter o tom de discurso de campanha, meio infantil, como ao dizer que a esquerda perder eleições "é bom para a região e para o mundo", no Fórum Econômico Mundial, ou falar que as relações internacionais do 🇧🇷 serão regidas pelo lema "Deus acima de todos".

12) Ainda assim, para os interlocutores internacionais, permanece o desafio de entender qual é o Brasil com que vão lidar nos próximos quatro anos.