Thread by @mani_wara

o "pardo" tbm pode ser indígena: a thread

tuitei isso no dia da consciência indígena, e rendeu. assunto espinhoso, faz 3 anos que escrevo sobre e não termino, por isso resolvi desafogar aqui. texto completo vem em alguns meses por conta de um projeto.

#VISIBILIDADEINDÍGENA

é difícil saber por onde começar, mas já deixo claro que o raciocínio parte de uma perspectiva amazonense/nortista

isso pq o norte:
1) tem um histórico de colonização bem diferente das regiões costeiras

2) tem maior concentração de população indígena (declarada)

e, pior:

3) ainda sofre com uma mentalidade de "colonizado", enquanto o sul/sudeste ainda tem esse papel "colonizador". o que ganha voz (e o que já tem voz, como a academia) no sudeste, invariavelmente é tido como o padrão. com essa discussão não é diferente.

MAS VAMOS LÁ

segundo o censo de 2010, o norte é a região com menos pessoas brancas do brasil, e com a maior população parda e indígena. historicamente, o norte recebeu menos mão-de-obra negra. predominava a mão de obra indígena

fonte do censo: biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/p…

um parênteses: nesse documento, os dados sobre indígenas estão espalhados em outros gráficos...

#VISIBILIDADEINDÍGENA

segundo o IBGE, a porcentagem da população indígena é pífia em relação às outras (perceba que isso serve bem à ideia de que "há muita terra para pouco índio")

por que isso acontece? e como a população parda se constitui maioria no norte?

antes, precisamos entender como o IBGE chegou nessas categorias atuais.

no 1o. censo (1872) as categorias raciais eram: branco, preto, caboclo (= indígena) e pardo (o que sobrava)

depois, pardo foi substituído por mestiço (guarda essa informação pra mais tarde)

de lá pra cá, "pardo" foi retirado e renomeado diversas vezes. no censo de 1940, "pardo" era novamente uma categoria residual, onde também se incluíam indígenas.

política EXPLICITAMENTE ETNOCIDA do Estado brasileira.

SÓ EM 1991 (ou seja, um dia desses), a categoria indígena foi incluída no censo.

vou deixar essa informação assentar por uns minutos.

política explícita de apagamento e etnocídio. racismo. reafirmação da narrativa da miscigenação. quem é do amazonas sabe bem desse discurso.

claro, o censo é uma ferramenta da política do estado. porque para além das classificações, mesmo com a inclusão tardia do termo "indígena", há a problemática de QUEM É indígena.

para o Estado, só é indígena quem tem território, etnia, língua.

as pessoas indígenas que foram expulsas de suas terras, que fugiram de conflitos e foram para as periferias urbanas, foram obrigadas a deixar para trás suas identidades. no Amazonas, a nomenclatura "caboclo" perdura até hoje, por sinal.

a questão da declaração indígena é complexa também pq ela não é só étnica, ela é ÉTNICO-RACIAL. pq quem não sabe a sua etnia mas é reconhecido como "índio" pela branquitude continua sofrendo racismo. o marcador do fenótipo também existe.

isso tudo tem tantas camadas que no Amazonas até se criou um movimento pela "identidade mestiça". ora, se as pessoas não se encaixam no que é a negritude, mas não podem se dizer indígenas (porque não é de interesse do Estado), então eu sou o quê?

o pardo é interessante para o Estado porque ele não é o índio indolente, nem o índio preguiçoso ou ganancioso. o pardo é filho do colonizador com a índia pega no laço, a linda morena que se submeteu ao conquistador.

a sua indigenidade é só uma memória distante.

& this is my ted talk shjhlaf

é isso, tem coisa pra aprofundar e fatos históricos pra adicionar, mas como eu disse, não posso soltar o texto que eu queria agora. por enquanto, fica o convite pra reflexão e diálogo.