Thread by @thata_finotto

Vida de podcaster (de conteúdo pequeno) - a thread
Fiquei feliz hoje de ver que o assunto do dia no Twitter era produção de conteúdo e indicar ou não podcasts.
Nem todo mundo deve ter seu próprio cast, então queria contar um pouco como tem sido minha rotina nesses últimos 5 anos

Eu tenho um trabalho normal, que não tem nada a ver com a podosfera, onde fico pelo menos 9h do meu dia.
Como eu lanço um podcast por semana, passo a semana toda correndo atrás de convidados, agendando gravação, escrevendo pauta, marcando teste de áudio com convidado

Se sobram 5 minutinhos no dia eu já vou pesquisar alguma pauta que tenho marcada pro fim de semana.

Minhas gravações duram, no máximo, 1h30 e, pra ter esse conteúdo eu devo pesquisar, no mínimo 8h sobre o tema na semana, entre 10 e 20 páginas brutas.

Quando o episódio está pronto vai para o editor (por sorte conseguimos terceirizar com nosso dinheiro pessoal) mas ainda tem de aprovar e fazer marcação de correção.
Se tem convidado ensinamos a usar Audacity e conferimos o teste pré-gravação se não tem ruído vazando.

E não é só o episódio e a pauta, tem muita coisa que envolve, como cuidar de redes sociais, administrar o site, responder e-mails, procurar arte de capa, fazer uma arte legal que chame a atenção.
No Instagram, por ex, é um post por dia sobre coisas diferentes.

Fazer podcast é incrível, já lancei bem mais de 250 episódios só meus, acabei de começar meu 2º podcast sozinha sobre um tema que não tem no Brasil, já perdi a conta de quantos podcasts eu participei.
Mas dá trabalho, é caro, não tem retorno financeiro, dá gastos, mas é incrível.

Eu conheci meu namorado por causa de podcasts, ele começou a ouvir meu conteúdo, eu fui ouvir o que ele produzia e este ano completamos 4 anos juntos.
O relacionamento é à longa distância.
No pouco tempo que temos livre precisamos contornar agendas de gravação de um ou do outro!

Eu nunca recomendaria pra alguém não fazer podcast, pelo contrário, sou convertida na Palavra do Podcast
Chego de conversa em conversa entre amigos falando “você já ouviu podcast?” e recomendo algo que tem a ver com a pessoa.
Mas sempre podcast de produtor pequeno e bom.

Essa mídia já me trouxe muitos amigos de verdade, tem uma galera fantástica se você parar para conhecer de verdade as pessoas.
E não estou falando só de Podcasters não, mas ouvintes que têm histórias muito ricas também e ótimas sugestões.
Eles se importam com o que produzimos

Eu já cansei de ter brigas em família por causa de podcast.
Na minha casa já tive discussões por causa de horário de gravação que vai até de madrugada, volume da minha voz (pq eu me empolgo), falta de incentivo algum sobre ouvir meu conteúdo ou se interessar

Já fiquei até brava e tive discussões com o namorado por nossas agendas não baterem.
Raramente temos um tempo para nos falar durante a semana que não seja no WhatsApp e ainda dividimos com horas de gravação.

(Já decidimos que teremos um estúdio em casa, quando morarmos juntos)

E eu sei que o Brasil tem bem mais de 1.000 podcasts por aí, são pelo menos o triplo de pessoas que passam pelas mesmas coisas que eu com o @_pqpcast e o #TriboTDAH
Eu não sou diferente
Assim como a maioria, não tenho Padrin
Eu faço isso pq gosto, dá um propósito na minha vida

Quando falam para incentivar podcasts pequenos, como a @priskka fez hoje, não significa que alguém precisa deixar de gostar dos grandes.
Podcast é amor puro, nos envolvemos com quem está falando de uma maneira íntima, parecem amigos próximos.
Mas é legal incentivar os pequenos.

Cada pessoa que tem a coragem de começar um podcast do zero, sem incentivo, com família e amigos que provavelmente nunca ouviram falar dessa mídia “estranha” já merecia uma medalha só por tentar.
As barreiras são grandes, é difícil até convencer aquele amigo próximo que já ouve

Acredite ou não, mas até seus melhores amigos vão ter resistência para ouvir seu conteúdo. Mesmo que, por algum milagre, eles já saibam o que é um podcast
E essa luta fica ainda mais difícil se eles ouvem os grandes, pq estão acostumados com a qualidade que vc ainda não conseguiu

Ter uma base de ouvintes demora anos
Meses gravando de madrugada, sem tempo pra descansar entre uma pauta e outra, dividindo atenção com a vida pessoal, profissional e familiar, investindo dinheiro sem retorno
São anos que o único pagamento são e-mails e comentários
E vale a pena

Quando finalmente vê o fruto de tanto trabalho publicado no feed, bonitinho, com capa e links certos e começa a receber as notificações de compartilhamento, comentários, pessoas que querem debater e curtiram em alguma mídia social a sensação é maravilhosa de trabalho bem feito

Se você chegou até aqui e ainda tem dúvidas sobre começar seu podcast ou retomar, eu só digo: vai fundo
Não desiste
Mas não espere ser convidado pra gravar no maior podcast do país em 3 meses só pq vão descobrir que vc é foda
Faz seu trabalho pra vc, algo que vc gostaria de ouvir

E vai ter haters sim, especialmente se você é mulher, LGBTTQIAP+ ou negro.
Vai ter gente que encontra o perfil do seu podcast e vem tentar falar um monte para humilhar, ou marca amigos para atacar em grupo só por diversão

E se vc for de minoria, talvez você seja questionado sobre a podosfera não ser um lugar para você, afinal as pesquisas falam que a grande maioria é só de homens.

Eu já ouvi que um podcast “não precisava convidar mulher, pq era cota e ia baixar a qualidade do conteúdo”

Mas, ao mesmo tempo, você vai ter apoio de pessoas que talvez você nunca conheça pessoalmente.
Você vai ter uma rede inteira de conexões novas, convites para gravar, vai convidar pessoas novas e encontrar seu nicho mesmo dentro dessa mídia nichada.

E hiatos podem acontecer, todo mundo precisa de férias ou tirar um tempo só para organizar a vida.
Nessas horas que os amigos e a equipe do podcast fazem a diferença, às vezes eles quem dão forças para continuar, ajudam a usar aquela última energia para conseguir seguir

Pode ter brigas, discussões, gente de cara virada por semanas, colegas que saem da equipe, gente nova que entra, quem se adapta como se sempre estivesse lá e quem prefere ficar no canto
Pessoas são de todos os tipos, são difíceis, e precisamos lidar mesmo que seja projeto pessoal

Eu faço podcast porque é importante na minha vida, faz sentido para mim e me divirto gravando.
Mesmo que tenha um mega trabalho de bastidor que é super invisível, sinto que vale a pena.
Se algum dia eu parar de acreditar no meu conteúdo, tudo perde o propósito

Eu não faço nada sozinha, eu tenho a minha parceira para todas as horas no @_pqpcast, a @NahMattos.
Ela cuida de coisas mega importantes que eu não sei fazer e nos complementamos.
Nossa dupla dá certa pq aprendemos as forças uma da outra e sabemos nossos pontos fracos

Já perdi a conta de quantas receitas de bolo ouvi “podcast só é podcast se tem feed”, ou “podcast é isso”, “não pode ouvir na velocidade xyz”, “só vale se tiver site”
A verdade é que a mídia no Brasil está se descobrindo e mudando a cada hora, não tem regra, faz o que vc quiser

Se você quiser e puder, tenta fazer diferente: se vc for um cara começando seu 1º ou 100° podcast, tenta convidar mulheres, pessoas LGBTs e negros
Sair da zona de conforto ajuda, nem que sejam só convidados
Não é regra, mas vc pode não ser um “podcast de homem que só tem homem”

E isso não é só pra podosfera, é para a vida.
Eu mudei muito nos últimos 5 anos, quando comecei na podosfera, pq eu tive contato com pessoas que não estavam próximas antes.
Ouvi histórias, aprendi sobre as vivências delas
Eu cresci por causa delas
E hoje eu tento espalhar vozes

Ter um podcast também é ter consciência que cada palavra que você fala tem um peso. Se há uma única pessoa que te ouve, ela já vai ser influenciada por isso.
Então eu tenho consciência que eu não posso informar qualquer coisa, espalhar ideias erradas, incentivar preconceitos

E, se nos anos que eu comecei a fazer podcast já consegui alguns ouvintes e um reconhecimentozinho entre os pequenos, eu sei que posso usar isso para ajudar.
Não precisamos dessa concorrência sem sentido, podemos fazer campanhas, incentivar quem começou, participar dos novatos

É muito legal apadrinhar um podcast que está começando, ou participar de vez em quando, conversar com a galera e tirar as mesmas dúvidas que você já teve.
Não precisa ser com grana (ela ajuda, claro), mas um incentivo pode ser tudo: tipo dúvidas de edição, feed e site!

De repente você nem acha que tem tanta notoriedade assim, mas alguém que entrou agora na podosfera tem a mesma visão sobre vc que vc tinha sobre outro.
E aquela sensação de “senpai me notou”, q o mentor está dando palavras de sabedoria
Pode ser algo básico pra quem tem mais tempo

Cada um tem seu jeito de ajudar, eu encontrei os meus.
Participo dos podcasts que convidam, se não conheço ouço o conteúdo da galera nova, troco informações sobre o que eu faço e aprendo também
E criei o @PodProcura pra tentar dar uma força
Pq ninguém está sozinho na podosfera

Sempre vai ter quem fale “já tem podcast demais, você vai ser mais do mesmo”
Talvez vc queira falar de um assunto que muita gente discute, mas do seu jeito, com a sua visão de mundo
Ou um nicho muito específico
Eu tenho um transtorno mental e não encontrava nenhum podcast sobre

Planejei bastante, procurei material, comecei a produzir, gravei 4 episódios adiantados e lancei meu 2º podcast em janeiro, meu primeiro conteúdo solo (que não era resposta de e-mail)
E estou aprendendo a me conhecer melhor com isso, me aceitar e descobrindo outros TDAHs por aí

E talvez você, que está lendo isso, nem saiba o que é Transtoeno de Déficit de Atenção e Hiperatividade e nunca tenha ouvido falar, mas nesses últimos meses eu ouvi histórias de pessoas que, como eu, se sentiam sozinhas no mundo e diferentes, desajustadas, sem voz

E, por causa desse podcast novo, eu descobri tanta coisa que afeta a minha vida diariamente e eu só achava que “era assim mesmo” e vi que histórias de milhares de pessoas no mundo com TDAH são muito iguais à minha
É um conteúdo pequeno, mas já fez diferença para mim e para outros

Não desiste, continua o seu podcast, começa um novo, deixa de lado a galera que não acrescenta
Mesmo que as pessoas da “vida real fora do computador” não entendam direito, vai ter sempre alguém na podosfera lá pra você e, de repente, essa pessoa pode se tornar um amigo pra vida