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Fazia dias meu pai vinha reclamando do gato adotado pelo vizinho.

Acho que o bicho estava meio negligenciado por lá e, por isso, acabava indo frequentemente à casa de meu pai.
Vejam bem: meu pai nunca foi um amante de animais.

Tá certo que tivemos a Vicky, quando pequenos, uma cadelinha linda, e ele até chorou quando a ela morreu, mas, além disso, nunca o vi ir além disso.

Em especial, meu pai não gosta de gatos.

Nunca gostou!
- Isso é um problema. O gato vem miar aqui querendo atenção. Não posso ler meu jornal em paz. Não posso nem me embalar na cadeira, porque ainda vou esmagar as patinhas dele...
Meu pai seguiu reclamando todas as vezes em que nos falamos naquela semana.

Até que saímos para lanchar e ele novamente começou a falar do gato, que era um pobre gato, que o vizinho deixa ele sozinho, pobre bichinho...
- ...aí ele entra no pátio e deita no meu colo. Como posso ler jornal assim? Tenho que parar tudo para fazer carinho nele!

Eu ri:

- Pai, nunca pensei que ia ver o sr. apegado a um gato, rs
- Mas não estou apegado a ele! Ele que está apegado a mim. Não pára de miar na minha porta. Acho que não estão dando comida para ele... O que come um gato?

- Ração, pai. Compra em pet shop, em supermercado...

...e o assunto morreu, mas percebi que ele ficou pensativo.
Na volta para casa, já dentro do taxi, pediu uma parada no supermercado, rapidinho.

- Quero só ver uma coisa.

Internamento, sorri, já imaginando o que seria.

- Bora lá, vou com o sr.
A cena mais inusual, que nunca poderia ter imaginado: meu pai, velhinho, no supermercado, escolhendo cuidadosamente ração para o gato do vizinho.

- Qual é a melhor marca? Veja os sabores. Salmão deve ser mais gostoso, né?
Não satisfeito, comprou uma vasilha hiper moderna para dar a ração, outra para água.

Aí meu pai, que nunca gostou de gatos, que nunca os suportou, me dava outra lição sobre cuidados e amor, dentre as tantas que sempre me deu.
E que a ânsia de cuidar é bem maior do que antipatias.

Ele cuidava do gato que, mais tarde, enquanto estivesse lendo seu jornal, deitaria no seu colo para receber carinho.

Porque era o gato que estava apegado a ele.

Ele não estava nem aí pro bichano.
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