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O tema da desigualdade de renda no Brasil tem sido frequente no Twitter, mas tem um aspecto negligenciado no debate, a desigualdade regional. Vou aproveitar pra fazer uma thread sobre o assunto. Segue o fio....
A desigualdade regional no BR remonta ao período colonial, quando a economia era baseada sobretudo em atividades agrícolas e/ou de exploração. A desigualdade tinha, portanto, uma forte correlação com os ciclos econômicos Werber Baer em A Economia Brasileira faz uma boa análise.
A preocupação dos policy makers com esta questão ganha evidência na década de 1960 com Celso Furtado. O marco é o famoso relatório GTDN: sudene.gov.br/images/2017/ar…. Uma boa análise das ideias de Furtado foi realizada por Clelio Campolina Diniz: scielo.br/pdf/neco/v19n2…
A análise furtadiana se baseava na diferença de renda per capita entre as regiões e sua recomendação de política foi realizar uma industrialização no Nordeste complementar à indústria existente no Sudeste. Porém mesmo com todas as políticas adotadas pela SUDENE ...
... e outras políticas regionais, como o Fundo Constitucional de Desenvolvimento do NE (FNE), as desigualdades regionais perduraram no Brasil. Mesmo assim, o interesse dos pesquisadores pelo tema não era grande, a ponto de Carlos Azzoni em artigo de 1997 afirmar que...
... o interesse dos pesquisadores brasileiros com a questão apenas retornou com os estudos sobre convergência de renda que se utilizam do modelo de Solow. Basta olhar os anais da ANPEC e ver a grande quantidade de estudos de convergência beta e sigma na década de 1990.
Contudo, a interpretação da desigualdade regional brasileira permanecia sob o prisma de análise desenvolvimentista até Samuel Pessoa escrever um corajoso artigo com o título: “Existe um problema de desigualdade regional no Brasil?” Pessoa argumenta que mesmo com ...
...todas as políticas adotadas a desigualdade regional persiste e defende que o BR não tem um problema regional. O argumento dele é que o problema é social e que a pobreza é regionalmente concentrada, logo políticas sociais bem focalizadas resolveriam o problema regional.
Raul Silveira Neto e Carlos Azzoni mostram que o Bolsa Família tem um grande impacto sobre a queda da desigualdade regional no Brasil (onlinelibrary.wiley.com/doi/abs/10.111…). Azzoni defendeu, inclusive, na sua aula magna da anpec 2017, que o BF foi a maior política regional já feita no Brasil.
Contudo, outro elemento importante ainda era negligenciado pelos pesquisadores: O capital humano. Poucos trabalhos tocaram no assunto, mas os que tocaram mostraram a importância da escolaridade para o nível e evolução da desigualdade regional de renda no Brasil.
O Alexandre Rands escreveu um livro onde ele defende que as políticas educacionais podem resolver o problema dos desequilíbrios regionais no país: amazon.com.br/Desigualdades-….
Utilizando métodos de decomposição, Eu e Raul mostramos que diferentes níveis de escolaridade importam para o nível e a evolução da disparidade de rendimentos: ppe.ipea.gov.br/index.php/ppe/…
Duarte e outros utilizam métodos de decomposição para mostrar que a educação importa: epge.fgv.br/files/1455.pdf
E mais recentemente mostro que a escolaridade importa mas importa mais após a década de 1990 e para os quantis mais elevados da distribuição dos rendimentos: bnb.gov.br/documents/1604…
Porém uma questão permanece: Devem existir disparidades de rendimentos reais? Isto é, considerando que não existem barreiras à migração, os salários nominais deveriam ser diferentes apenas para compensar diferenças nos custos de vida e de amenidades.
Esta é uma questão também difícil de tratar devido à inexistência de indicadores de custo de vida para cada município brasileiro. @goescarlos tenta avançar nesta questão: imf.org/en/Publication…
Atualmente estou finalizando um paper com Raul onde utilizamos os índices de custo de vida produzidos por Azzoni e Almeida (scielo.br/pdf/ee/v46n1/0…) e o método de decomposição proposto por Firpo e outros (mdpi.com/2225-1146/6/2/…) para avançar nesta literatura.
Os resultados indicam que a disparidade de rendimentos reais entre as RMS de SP e SSA é 54% menor do que a disparidade de rendimentos nominais (entre SP-REC 63% menor, SP-FOR é 52% menor e SP-Belém 32% menor). Ou seja, custo de vida explica parte das disparidade, mas não elimina.
Nossos resultados também sugerem que o principal fator que explica as disparidades regionais de renda real do trabalho no Brasil é o diferencial de escolaridade e de retorno à escolaridade nas RMS.
Ainda há muito para se avançar neste tema, mas parece que voltou a ser um tema relativamente negligenciado pelos pesquisadores brasileiros.
