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Se você precisa criar fotos falsas, falar que a Greta "precisa de sexo", ou ficar reclamando de quem financia os projetos dela, me desculpe, mas você não passa de um pedaço podre do debate político brasileiro.
Também focar no fato de que ela está no espectro autista (Asperger's) não é suficiente. A gente pode falar como isso afeta a postura dela e tratar do abuso feito pelos pais dela e pela mídia aqui, mas isso por si só não desmerece os seus argumentos.
Greta está errada não porque é fianciada pelo Soros (mas pode ser financiada justamente por defender uma posição errada), não porque tem Asperger's, não porque tem sido vítima de abuso pela mídia e pelos seus pais. Ela está errada porque defende ideias incorretas. Segue o fio:
O mundo não está acabando. Não vivemos uma crise catastrófica climática nem estamos à beira de uma extinção em massa. Não estamos numa situação em que os políticos devem tomar o controle das nossas vidas, caso contrário não teremos justiça e nem a solução total dos problemas.
Greta cresceu com pânico das mudanças climáticas que são absurdamente exageradas pela mídia e por ativistas. Com isso ela desenvolveu suas posições radicais. Aqui, a ideia de supervalorizar algo "para gerar debate" tem cobrado um preço muito caro. Ela ou amedronta ou aliena.
Quando alguém vê que a catástrofe prometida por gente como Al Gore não aconteceu, essa pessoa pode ficar totalmente cética sobre os argumentos e radicalizar para a posição oposta ("eles todos estão mentido").
Ou ela pode ficar com mais medo ainda achando que quando vierem, os efeitos vão ser mais catastróficos ainda (tipo "Dia depois de amanhã" ou 2012).

O maior problema é que essas duas posições bem radicais fazem um crowding out do debate e ferram tudo...
Sim, o clima está mudando. Isso é um fato básico e achar qualquer coisa ao contrário é um erro tanto de esquerda como de direita. O clima sempre mudou e sempre vai mudar, efeito antropogênico ou não.
As pessoas que acham que a gente consegue voltar ao clima dos anos 80, tidos como referência em praticamente todo modelo (não sei porque, btw), e parar o relógio estão erradas. O mundo mudou em muitas escalas, é impossível reverter quase 40 anos de desenvolvimento.
Pessoas que acham que o clima só é afetado por efeitos exógenos ao homem, que todos os modelos são mentirosos e que tudo não passa de uma conspiração internacional também estão erradas.

Cortar uma árvore na frente de casa já gera mudanças, porque isso não aconteceria em escala?
O homem contribui para as mudanças climáticas de forma mais ou menos significativamente conforme o modelo escolhido para atmosfera, para as correntes, para as respostas da vegetação, etc. Mas é inegável que ele afeta o sistema. O quanto? Há debate sobre isso.
E cada modelo valora os elementos de forma diferente porque há incertezas sobre suas contribuições. Pode ser que todos os modelos estejam *totalmente* errados, mas é muito mais provável que eles apenas sigam a regra clássica de modelagem e sejam parcialmente certos.
Nessa hora é interessante analisar como os diferentes modelos atribuem os efeitos das variáveis que a gente consegue medir, e, muitas vezes, tentar fazer uma média dos resultados deles. A gente fica com um benchmark para comparar com o que realmente acontece.
Também há debate se CO2 é o *grande* responsável por tudo que a gente vê, ou se o que acontece é uma combinação de diversos fatores, sendo o CO2 um dos principais fatores. Mas que há efeitos do dióxido de carbono há e o homem é responsável por parte deles.
A gente deve fazer um trabalho contínuo de continuar validando os modelos, testando para ver se as predições de anos atrás se concretizaram ou não e alterando o que for preciso para melhorar a sua qualidade. Mas descartá-los por si só é ingênuo.
Depois que a gente chega às conclusões de que:
- O clima está mudando e o homem tem influência

A gente fica com várias perguntas como:
- As mudanças são boas ou ruins? Por quê?
- Há algo para fazer sobre elas? Vale à pena fazer? Qual o custo?
- Quem deve agir? Quando? Como?
E nesses pontos que Greta está mais errada. As mudanças em si são neutras
- Os níveis dos oceanos se alteraram diversas vezes, as temperaturas já subiram e desceram, espécies já foram extintas e surgiram, entre tantas outras coisas.
As consequências dessas mudanças que podem ser problemáticas se a gente considerar um sistema estático: que exige que as coisas não mudem. Como assim?
Ex: a gente acha que as cidades beira-mar devem continuar como são ou que as pessoas devem sempre morar nos lugares em que estão.
Muitos dos modelos e das propostas dos ativistas desconsideram a capacidade do ser humano de perceber como as coisas mudam e reagir a isso. Com exceção de coisas raras e catastróficas como erupções de vulcão e terremotos, o ser humano consegue precificar efeitos e se adaptar.
Como a gente sabe disso? Olhando a história: cidades nasceram, cresceram e morreram ao longo de todo o tempo conforme a situação mudou. Ninguém achou que elas deveriam permanecer no mesmo lugar e do mesmo tamanho ad eternum (hoje tem muita gente que acredita nisso).
Ruínas africanas, greco-romanas e mesmo asiáticas estão aí de prova. Cidades fantasmas nos EUA também. Pessoas mudam de uma região para outra conforme o lugar de origem deixa de ser atrativo ou passa a ser arriscado.
Se o mar subir 1 m a cada década, quem mora na beira-mar pode se mudar aos poucos e de forma (quase que) organizada para lugares mais vantajosos. Ninguém é burro de ficar esperando o oceano subir e tomar a própria casa -- a menos que a gente crie incentivos para tal.
Ah... Mas e se elas quiserem ficar na beira-mar? A gente pode lidar com isso também: construir barreiras de enchentes, aterrar regiões costeiras e aprofundar outras no oceano, por exemplo. Mas em grande parte o custo deve ficar com quem tira benefícios da situação.
Mas quando a gente define a política pública de que o estilo de vida daquelas pessoas deve ser subsidiado -- com uma medida de "combate à elevação do oceano", por exemplo --, a gente reverte esse processo orgânico e pacífico.
Como os modelos tendem sempre a estar errados em alguma medida, uma mudança mais drástica num período geraria custos imprevistos e isso ferraria todo o processo, levaria a alvoroços e mais urgência de controle por parte de burocratas "bem intencionados".
E por que o custo deve ficar com quem tira os benefícios? Porque subsídios cruzados tendem a gerar distorções de preços e incentivos. Por exemplo: se o cara que mora numa casa bem construída na montanha paga o seguro enchente do ribeirinha, mais gente tende a virar ribeirinha.
O mesmo vale se a gente forçar alguém de Cuiabá a pagar pra manter o apartamento do global no Leblon protegido de "danos climáticos". Mais gente vai querer ser subsidiado na praia. O Rio que seria uma cidade menos atrativa passa a ser legal por causa dessa distorção dos preços.
Isso quer dizer que a gente não pode fazer nada a nível nacional? Não! Há na teoria liberal uma situação clara em que o governo nacional pode intervir que são as externalidades negativas e aqui uma taxação de carbono pode ter valor.
O problema é que pra vender politicamente uma medida dessas há de se mostrar o efeito negativo sobre todo mundo e não ficar focando nos benefícios mais concentrados. Mas como as mudanças de verdade são pequenas, graduais (3C até 2100, e.g.) e dispersas é bem difícil fazer isso.
Há também muito espaço para melhorias tecnológicas e avanços em fontes alternativas de energia -- dentre elas e em especial a nuclear --, além de uma reorganização natural da sociedade para lidar com essas mudanças.
Pra isso a gente deve tirar muita política pública ruim de campo. Por exemplo: conter a verticalização das cidades aumenta o deslocamento das pessoas e torna mais energeticamente caro se viver em centros urbanos. Com isso, há mais poluição. Resultado: mais mudanças climáticas.
O mesmo vale para subsídios do governo dados à indústria automobilística. Ao se retirá-los, parte da dinâmica muda: quem sabe transportes coletivos ou o bom e velho pé não fiquem mais atrativos?
A gente também deve lidar com subsídios agrícolas e pecuários, acabando com eles de uma vez. Muitas vezes plantações/pastos aumentam e degradam mais o meio ambiente para caçar benesses estatais e não atender demandas de mercado.
Aqui vale também os subsídios à agricultura familiar e a movimentos sociais como o MST através de políticas de reforma agrária via força estatal. Se a prefeitura não garante que vai comprar sua produção, você pensa duas vezes antes de plantar ou antes de continuar na área rural.
Beleza... Mas e o que isso tudo tem a ver com a Greta?

Ela é contrária a usar mecanismos de mercado para reverter parte do curso das mudanças climáticas (carbon tax). Ela é contrária a energia nuclear. Ela é favorável à estatização ainda maior da economia.
Ela quer dar o controle de todo o sistema para os mesmos caras que "estão roubando o [seu] futuro". Ela é favorável a abolir o sistema que vem deixando o mundo proporcionalmente mais limpo em prol de adotar aquele que o sujou (tipo a China hoje em dia).
E nesses vários aspectos ela está errada. Ela está errada não porque é adolescente (Al Gore, di Caprio e Obama são bem grandinhos e defendem as mesmas coisas). Não porque tem Asperger's (a maior parte dos ativistas não o tem e defendem as mesmas coisas).
Não porque "falta sexo" (George Clooney e outras várias celebridades defendem as mesmas coisas erradas) -- e, pelo amor de Deus, que argumento estúpdio, misógeno, ignorante, preconceituoso do radialista.
Não porque está sendo financiada pelo Soros (Tom Steyer e Ted Turner são bilionários e também defendem as mesmas coisas).

As ideias de Greta são independentes das características da guria e são ruins por si só. Podemos combatê-las sem nos rebaixar a ad hominem e insultos.
E não precisamos negar nenhuma das premissas (corretas) de que há sim mudanças climáticas e de que o homem tem efeito nelas para fazer isso.
Um debate de verdade precisa de mais fatos e menos estridência. Isso é chato, não é midiático e dificilmente vai ser atrativo para o público médio que, corretamente, tem mais o que fazer da vida. Mas temos ido na direção contrária e a prominência da Greta é sintoma, não causa.
E um detalhe muito importante, se ela quer reclamar de alguém roubando o futuro da geração Z, a gente nem precisa entrar nos detalhes sobre o clima que são sim muito nebulosos. A gente pode focar nas dívidas que as gerações mais velhas estão deixando de presente.
Os custos não pagos do estado de bem estar social dos avós, pais e conterrâneos dela tende a ter um custo muito maior para o futuro de Greta do que o aumento de temperatura de 3-4C até 2100.
Os subsídios cruzados e as distorções de incentivos desse modelo político também geram muito mais peso porque elas colocam as responsabilidades sempre em terceiros - aqueles que financiam e aqueles que gerenciam - e não na gente. E esse debate é mais urgente do que o do clima...
Em especial porque esse tipo de organização estatal criou distorções nas sociedades que impactam nas mudanças climáticas, sejam elas na questão de demanda por um "certo padrão de vida" ou na distribuição de pessoas e recursos.

Mas isso é tema para outra thread...
PS: esse artigo (forbes.com/sites/rogerpie…) do professor Roger Pielke mostra como os debates sobre a política climática estão enviesados por causa de um cenário extremo que tem incorretamente sido usado como a previsão do que vai acontecer.
O mais interessante é que o próprio cenário, ainda usado em modelagem, pode estar bem errado por trabalhar com a ideia de uma participação muito maior de carvão entre as fontes de energia. E os resultados de modelos com esse cenário são os principais argumentos/medos da Greta...
Dr. Pielke, Bjorn Lomborg, Michael Shellenberger e Ryan Maue são alguns nomes sensatos no debate sobre o clima. Os próprios relatórios do IPCC são muito bons também, apesar de serem totalmente mal interpretados e mal reportados pela mídia...
Fecho com a minha listinha do que fazer nessa história:
- Políticas públicas: 1. reverter todas as coisas que geram incentivos ruins. 2. combater externalidades negativas claras e comprovadas
- Debate: 1. procurar gente com fatos e não estridência. 2. estudar, estudar, estudar
E acima de tudo ter humildade: político nenhum soluciona problemas de ordem espontânea e de nível global, nem tem conhecimento para isso. Além do mais, nenhuma pessoa deve ter a ousadia (e o direito) de regrar a vida de terceiros quando isso não afeta a sua própria.
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