Ontem, chegou de surpresa a notícia de que o Bonsucesso não vai jogar a Copa do Brasil em 2020: desistiu da disputa sem avisar ninguém. Todo mundo só ficou sabendo porque a CBF divulgou os potes pro sorteio de amanhã. Parece estranho e realmente é.
Só por jogar a CdB, o clube já embolsa R$ 500 mil. Pra quem está na 2ª divisão do Carioca, isso é uma fortuna. Então, por que a desistência quando o mais racional aponta para montar um time e jogar, mesmo caindo logo na primeira fase? A resposta: o Bonsucesso, hoje, é uma zona.
Pra jogar a Copa do Brasil, é preciso ter, entre outras exigências pedidas, jogadores cumprindo contratos há pelo menos três meses da disputa, exatamente pra afastar times "aventureiros". O Cesso foi campeão da Copa Rio em agosto, escolheu a Copa do Brasil e dispensou todo mundo.
Rola uma história de que só uma pessoa do grupo gestor atentou pra esse detalhe, mesmo com a Copa do Brasil sendo prioridade absoluta na hora de escolher a competição nacional (o campeão da Copa Rio escolhe CdB ou Série D). Optou-se por dispensar todo mundo e a conta chega agora.
A questão é que o Bonsucesso não se pronunciou oficialmente - nem no dia, nem até agora - sobre os reais motivos da desistência. Se não tem time e ninguém treinando, claro que não joga mesmo. Mas ninguém do clube ou da gestão botou a cara pra dizer algo aos sócios ou à torcida.
O 2019 do Bonsucesso foi todo nebuloso. Em abril, eu fui à Teixeira de Castro saber informações sobre a pré-temporada. Faltava um mês pra Segundona e nada de notícia; ninguém sabia de nada, quem era jogador, técnico, nadinha. E depois eu soube que não queriam mesmo que soubessem.
Lá chegando, o então gestor me viu, fez um telefone sem fio pro vice-presidente, que me chamou na sala dele e disse que eu não podia fazer imagens ou registrar algo porque "não tinha nada oficial". Nem discuti porque quem diz isso não entende que jornalista tá lá é pra trabalhar.
Depois, mais calmos, eles foram explicando que não queriam divulgar nada porque isso ainda dependia de "algumas questões". O grupo tinha vários jogadores rodados no futebol do Rio. Detalhe sempre bom de lembrar: faltava por volta de um mês pro começo do campeonato.
Fui identificando: quem comandava o futebol era um grupo que tinha acabado de trabalhar no Mageense, campeão da Quartona no ano anterior. O técnico era inclusive o mesmo: Maurinho (aquele do 1º de abril). O time fez alguns jogos-treino e o gestor até me passou alguns reforços.
Tudo isso mudou em 12 de abril, plena Sexta-Feira Santa. Sem aviso oficial, o então grupo gestor abandonou o Bonsucesso. Uma discussão entre o grupo e Marcelo Salgado, uma espécie de "gestor principal", teria sido o motivo. Maurinho foi demitido e 18 jogadores, dispensados.
A maior surpresa veio quando soube que já havia um novo técnico. Luciano Quadros assumiu a equipe já na segunda-feira seguinte, trazendo vários atletas e uma comissão técnica inteira. Um novo grupo de gestores tomou o comando e foi com ele que o Cesso começou a temporada.
Com a bola rolando, sucesso total. Quatro jogos, quatro vitórias e o melhor começo de campeonato em anos para o Bonsucesso. Aí, um dia depois da vitória sobre o Friburguense, Luciano Quadros recebe uma proposta do Sampaio Corrêa, então lanterna da Segundona. Aceita e vai embora.
Ninguém entende nada. O Bonsucesso emite uma nota oficial em tom de alfinetada: "Nossa história é rica e mais do que centenária, as pessoas passam e o Bonsucesso FC fica". Vale lembrar que o anúncio de Luciano veio num domingo à noite e a proposta do Sampaio seria "irrecusável".
O Cesso contrata um novo técnico a toque de caixa (Emanoel Sacramento) e segue invicto por mais oito jogos. Luciano Quadros tira o Sampaio da lama, colocando o time na briga pelo acesso e até eliminando o tradicional America da Copa Rio. Mas o Bonsucesso de 2019 é só surpresa.
Exatamente um mês depois da troca, já com o Sampaio Corrêa em condições de brigar para subir, Luciano Quadros teria recebido uma nova proposta do Bonsucesso, esta bem melhor... E voltou pro Bonsucesso, deixando o Sampaio da noite pro dia. Reestreou num jogo da Copa Rio.
Como se nada tivesse acontecido, o Bonsuça postou assim, no Instagram, a notícia do retorno de Luciano. E, com ele, o time seguiu ganhando, ganhou a Copa Rio e só perdeu o acesso à primeira divisão para o America, perdendo em dois jogos. 
A parada é que, nesse meio de caminho, os sócios e os torcedores mais próximos do clube tiveram razões pra ficarem insatisfeitos. O Estádio Leônidas da Silva ficou fechado o campeonato inteiro e o jogo decisivo contra o Goytacaz foi transferido para Saquarema, campo do Boavista.
A boa relação entre o grupo gestor e o Boavista - onde alguns dos membros já tinham trabalhado - ajudou nisso, mas a torcida não curtiu, já que não contava em ter que ir tão longe no jogo mais importante da temporada. No fim, o Cesso ganhou por 1 a 0, com gol aos 51 do 2º tempo.
Na Copa Rio, como falei, o Bonsucesso foi o campeão e escolheu a Copa do Brasil, que começa antes mas dá mais dinheiro. Mesmo que jogasse uma vez só, o time embolsaria meio milhão. Mas, aparentemente, não cumpriu os requisitos e desistiu. A torcida só ficou sabendo ontem.
Vale lembrar que esse mesmo torcedor e sócio do Bonsucesso não vê jogos em Teixeira de Castro desde 2014. O clube ficou sem presidente por cerca de três anos após a descoberta de irregularidades numa eleição. A Justiça nomeou Marcelo Salgado como uma espécie de "interventor".
Só em 2017 é que o Bonsucesso elegeu um novo presidente: Ary Amâncio. Mas Salgado, que é empresário e investidor principal, é quem segue dando as cartas no futebol do clube. Nem ele, nem os gestores terceirizados deste ano comentaram, até agora, sobre a desistência.
Ainda por cima, quem herdou a vaga do Bonsucesso na Copa do Brasil foi o Boavista, terceiro na Copa Rio. Ao Bonsucesso, resta jogar a Segundona a partir de maio, sem saber com que time e com quais gestores. Certo, porém, é que o futebol será terceirizado de novo.
