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O Brasil é, foi ou será neoliberal? Nesse fio eu respondo isso, com MUITOS dados. Começamos pelo Consenso de Washington (CW). O CW é, grosso modo, representado por 10 “mandamentos” (Williamson, 1989). Quantos o Brasil seguiu? (1/n)
É bom lembrar que a agenda neoliberal foi promovida em parte pelo FMI, que condicionava empréstimos a países emergentes reformarem suas economias, mesmo que parcialmente, o que aconteceu no caso brasileiro. (2/n)
Os dez mandamentos:
(1) Disciplina fiscal
(2) Reordenamento de gastos
(3) Reforma fiscal
(4) Taxas de juros livres
(5) Câmbio flexível
(6) Abertura comercial
(7) Abertura a investimentos estrangeiros
(8) Privatizações
(9) Desregulamentação
(10) Direitos de propriedade.
(3/n)
Começamos com (1) disciplina fiscal. É fácil mostrar que isso nunca foi nosso forte, mesmo com Lei de Responsabilidade Fiscal e a Lei do Teto. A figura abaixo mostra o crescimento do gasto primário em do governo federal relação ao PIB. Subiu em todos os governos. (4/n)
Claro que análise de um gráfico é capenga (no Twitter, não dá pra escrever uma tese sobre o assunto). Mas a questão é simples. Disciplina fiscal significa impedir aumento de gastos. Quando o fizemos, metemos os pés pelas mãos, reduzindo investimento. (5/n)
Também reduzimos os gastos recentes em várias rúbricas importantes, incluindo educação e saúde (não necessariamente por causa do teto). Não tivemos disciplina fiscal desde 1994. Por esse critério o Brasil nunca foi neoliberal. Mas calma, isso não é tudo (6/n)
O segundo mandamento é o reordenamento de gastos públicos, com menor gastos com subsídios e maior gastos com políticas sociais e pró-crescimento (educação, saúde e infraestrutura). Em tese, o neoliberalismo não é assim tão malvadão. Fizemos? (7/n)
Um pouco, mas muito aquém. Aumentamos o gastos em educação (no passado) e, mais importante, fizemos o Bolsa Família (melhor programa da nossa história). Mas nosso déficit de infraestrutura é na casa de trilhões e a saúde empaca. (8/n)
Nesse critério, continuamos sem ser neoliberais, pq os subsídios não diminuíram. Ser neoliberal de verdade significaria acabar com a Zona Franca de Manaus (com os custos que isso acarretaria), o Simples e vários outros subsídios industriais. (9/n)
O terceiro critério é uma reforma fiscal, que aumentaria a base de pagamento de impostos, tornando o sistema simples, não regressivo e abrangente. Essa nem precisa de gráfico. A reforma fiscal é sempre pra amanhã. Mas o próximo critério é diferente (10/n)
Taxas de juros livres significam que o mercado determinaria os juros reais no Brasil. Nisso somos neoliberais, vide nossos juros escorchantes (figura traz as taxas de empréstimos no mundo), embora o crédito direcionado (BNDES, imobiliário, agrícola) não seja neoliberal. (11/n)
O quinto critério é taxa de câmbio flexível. O Plano Real tinha como base um sistema de câmbio fixo. Mas o real sofreu um ataque especulativo (em grande parte, contaminação da crise asiática de 1997 e russa de 1998) e o governo cedeu. Mas o câmbio não se tornou flexível. (12/n)
Em janeiro de 1999, o governo deixou o câmbio flutuar mas temos, desde então, um sistema de câmbio flexível “sujo”, ou seja, sujeito a intervenções do Banco Central. Nessa, somos meio neoliberais – câmbio flexível pero no mucho (13/n)
O sexto critério é abertura comercial. É fácil de mostrar que nunca abrimos nosso mercado. As tarifas aplicadas a importações (em %) são muito maiores que em outros países emergentes ou na comparação com países ricos (ver figura).(14/n)
O resultado é que o Brasil tem a corrente de comércio (exportações mais importações) mais baixa do mundo, como % do PIB (como mostra a figura). (15/n)
Nem mesmo na época do ciclo da commodities, isso mudou muito. A corrente de comércio chegou a bater 25% do PIB mas rapidamente recuou (na figura, evolução do comércio em % do PIB). Fomos, somos e seremos fechados ao comércio mundial. Mas! (16/n)
No sétimo quesito somos totalmente neoliberais. Abimos a conta de capitais para investidores estrangeiros e nunca mais fechamos. Capital, seja produtivo ou não, pode entrar e sair à vontade do país. Investimento direto estrangeiro é, ao ano, cerca de U$70 bi. (17/n)
No quesito privatizações, fomos mais ou menos neoliberais durante os governos FHC e mudamos nos governos petistas. Privatizamos alguma coisa, mas certamente menos do que o receituário neoliberal (pro bem e pro mal) requer. (18/n)
Na questão de desregulamentação, o padrão é o mesmo. Houve pouca desregulamentação de mercados no passado, mas acabou. O sistema financeiro continua hiper regulado (concentração bancária na figura). Barreiras à entrada com apoio estatal abundam (19/n).
Finalmente, no último mandamento, de direitos à propriedade, somos razoavelmente neoliberais. Não estatizamos empresas, as pessoas não perdem direito à seus bens normalmente etc. O único senão é direito de recuperação de crédito (ver figura) (20/n)
Outra forma de ver isso é olhar os resultados do índice de competitividade do país (entre 150 países do mundo). Em todos os quesitos “neoliberais”, como infra e eficiência de mercados, estamos muito atrás do resto do mundo (1a coluna é nosso ranking e a segunda o score. (21/n)
Veja, não há juízo de valor. Algumas prescrições do Consenso são ok, outras (câmbio flexível) são fracas. Mas o resumo é: não fomos ou somos neoliberais economicamente. Por um tempo (FHC) nos aproximamos mais do receituário, mas! (21/n)
Foram poucos os “mandamentos” que seguimos ao longo do tempo (direitos de propriedade é exceção). O governo nacionalista de hoje tb não fará grandes reformas neoliberais (economicamente). Mas e fora da economia? (22/n)
Neoliberalismo é sobre poder, sobre transferir as decisões da sociedade para os “MERCADOS”. Tb não fizemos isso. O Brasil é um país oligárquico, fechado e oligopolista, com o governo claramente influenciado por empresas, mas não é neoliberal. (23/n)
Neoliberalismo é sobre mercados E competição empresarial. Não há competição de verdade no Brasil. Estamos muito mais para um governo feudal ou capitalismo de compadres do que neoliberalismo selvagem. (24/n)
Por exemplo, grande parte do “CAPITAL INTERNACIONAL” malvadão não está no Brasil, já que o sistema financeiro é fechado. Bancos estrangeiros SAÍRAM do Brasil nos últimos 20 anos. Mercados aqui estão longe de serem livres (25/n)
Nessa, ainda esperamos o choque de capitalismo de que falavam na década de 90. Esse governo tb não vai fazê-lo. O Brasil não foi, é ou será neoliberal, economica ou politicamente, pro bem e pro mal. Tivemos um pequeno movimento para isso na década de 90 mas se esvaiu. Fin.
Mais um fio que pode interessar a @claudiolucinda, @_pinheira, @elenalandau, @tatiroque, @goescarlos , @lmonasterio, @NPTO, @marcelo_meds, @GabrielNemer_, @drunkeynesian, @dannielduque, @pfnery, @winniebueno etc. Como sempre, aberto a criticas, sugestoes etc.
@claudiolucinda @_pinheira @elenalandau @tatiroque @goescarlos @lmonasterio @NPTO @marcelo_meds @GabrielNemer_ @drunkeynesian @dannielduque @pfnery @winniebueno @SamuelSilvaFB eu estou particularmente interessado na sua opiniao sobre o tema desse fio. Se meus argumentos nao te convencem, eu gostaria muito de saber pq.
@lauraabcarvalho gostaria muito de saber sua opinião sobre esse fio. Se você discordar é pq fiz algo de errado
Outra pessoa que eu gostaria da opinião é a grande @bollemdb
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