Thread by @lucasmafaldo

Não escrevi mais sobre o corona porque não vejo nada que mude o que eu expliquei há algumas semanas: não dá para ter certeza do impacto ainda, mas o potencial de danos não-lineares ainda está aí.

A coisa fica ainda mais confusa porque não temos ainda análises confiáveis.

Com a mudança dos critérios de diagnóstico, a opacidade do governo chinês e a possível falta de equipamentos suficientes de teste torna impossível ter certeza da magnitude da coisa.

Além disso, nesse tipo de evento, há uma distância enorme entre o pior e o melhor cenário...

... ou seja, as coisas podem variar de "sob controle" a "ruim" a "horrível". Normalmente os eventos não variam tanto e nossa mente é ruim em calcular riscos com alta variabilidade ao longo do tempo.

Um analogia simples: o próximo carnaval pode ter uns 10% a mais ou a menos de...

... de acidentes de carro, mas dificilmente terá 50% a mais ou a menos de acidentes. E certamente não terá 300% a mais.

No caso de epidemias, esse tipo de efeito não-linear é possível. Pouca coisa separa 1,000 mortos de 100,000 quando o efeito é multiplicador.

Mais não-linearidade: a partir de certo número de infectados, os sistemas de saúde podem ser sobrecarregados e as pessoas podem morrer por OUTRAS causas, até mais simples, pela falta de cuidados básicos.

E mais: há um ponto onde o número se torna tão grande que a economia para. E há um ponto onde a parada da economia provoca crises financeiras e recessões.

Há também um momento onde as crises se tornam tão violentas que o governo perde o controle da situação -- especialmente...

... se for um governo autoritário, que já deve estar reprimindo vários focos de insatisfação constantemente.

Além disso, há efeitos não-lineares de longo prazo: assim como HIV e ebola, isso pode aumentar permanentemente o risco humano, se tornando um problema cíclico.

Por fim, não sabemos as consequências de longo prazo da infecção. Será que as pessoas ficam imunizadas e perfeitamente saudáveis ou com sequelas permanentes?

Diante de tantas incertezas, a única atitude racional é ser desproporcionalmente cuidadoso: os governos devem monitorar com todos os possíveis afetados e restringir ao máximo a circulação de pessoas, enquanto prepara o aumento da capacidade do sistema de saúde.

Nisso aí o Taleb está certíssimo: melhorar tomar todas as preocupações e não dar em nada (o que é possível), do que correr atrás do prejuízo depois que o caos estiver instalado (o que também é possível).