Thread by @menezes_barboza

Comemorar que o PIB cresceu 0,4% ao invés de 0,2% é revelador do estado lamentável da economia brasileira.

Como sair desse buraco? Segue uma thread sobre meu artigo hoje na @folha, em defesa do pragmatismo.

www1.folha.uol.com.br/mercado/2019/0…

1- Criou-se no debate público uma falsa dicotomia entre medidas pelo lado da oferta (que aumentam a capacidade potencial da economia) e pelo lado da demanda (que ocupam a capacidade produtiva existente).

Essa dicotomia é absolutamente falsa (e danosa)!

2- A economia brasileira tem um PIB potencial que cresce pouco (o que exige medidas pela lado da oferta) e um hiato do produto absurdamente negativo (o que exige medidas pelo lado da demanda). O Gráfico mostra diversas medidas de hiato do produto no Brasil.

3- Pouco importa se, no passado, políticos de determinada corrente estimularam excessivamente a demanda em contexto inadequado (entre 2010 e 2015, p. ex., quando o hiato era positivo).

Erros do passado não inviabilizam os instrumentos no contexto atual, totalmente diferente!

4a- É preciso fazer reforma tributária?

Sim, pois o sistema tributário brasileiro é um dos dez mais complexos do mundo, segundo pesquisa do Banco Mundial com 190 países, o que gera ineficiências diversas.

portugues.doingbusiness.org/pt/data/explor…

4b- É preciso abrir a economia para o comércio internacional?

Sim, pois o Brasil é a segunda economia comercialmente mais fechada do planeta, ganhando apenas do Sudão.

4c- É preciso avançar na agenda da educação (muito mal parada, diga-se de passagem)?

Sim, pois a qualidade da nossa educação é terrível, tal como medida nas provas internacionais do PISA.

4d- É preciso ampliar a competição bancária?

Sim, pois o spread cobrado pelos bancos brasileiros é uma aberração em comparações internacionais, inclusive superior ao observado em países em guerra.

4e- É preciso avançar na agenda de infraestrutura?

Sim, pois os dados do Fórum Econômico Mundial sugerem que temos um atraso gritante nessa seara, sobretudo em rodovias e ferrovias.

4f- É preciso avançar na reforma administrativa?

Sim, pois o que o Brasil gasta com funcionalismo (em % do PIB) é algo fora da curva entre países emergentes.

5- Enfim, certamente não são poucas as reformas necessárias para estimular o PIB potencial do país. Pelo contrário, no Brasil, um economista pode morrer de muitas causas, mas nunca de tédio!

6- A questão é que esse conjunto de medidas é politicamente sensível, toma muuito tempo e ataca apenas uma parte do problema.

A outra parte, relacionada à enorme ociosidade da economia (alto desemprego e baixos níveis de utilização da capacidade), depende de aumentos de demanda!

7- O que tem sido implementado nos últimos anos está claramente insuficiente para reverter a calamidade social em que nos metemos.

O PIB cresce a passos de tartaruga e a taxa de desemprego cai muito lentamente.

8- Em termos práticos, isso implica, em 1º lugar, em quedas mais agressivas da taxa Selic. O Banco Central perdeu muito tempo nessa seara, conforme venho argumentando há tempos em artigos no @valoreconomico e no blog do @FGVIBRE.

valor.com.br/opiniao/552452…

blogdoibre.fgv.br/posts/deve-o-b…

9- Mas a queda da Selic pode não ser, sozinha, suficiente para mudar o quadro recessivo. Por uma série de razões bem documentadas na literatura empírica (efeitos assimétricos da política monetária, efeitos da política monetária sob alta incerteza etc).

10- Caso a Selic não se revele um instrumento suficiente, teremos que partir para novos instrumentos, como revisar as regras fiscais, de modo a permitir algum impulso do investimento público. Ou mesmo pensar em um impulso fiscal localizado (carta IBRE).

portalibre.fgv.br/revista-conjun…

11- Ou, de maneira mais fácil, coordenar as atitudes das autoridades de plantão para reduzir a incerteza política no país, que é uma função de polêmicas, disputas e tweets desnecessários. Os efeitos da incerteza na atividade são enormes e incerteza é choque de demanda.

12- Em suma, como dizia um grande economista do passado, "oferta sem demanda é que nem bater palmas com apenas uma mão".

Precisamos bater palma direito, com força, sem preconceito e com pragmatismo!

13- Do contrário, seguiremos nessa década frustrada, em que acumulamos frustração atrás de frustração com o resultado do PIB.

O gráfico mostra como, desde 2011, o PIB efetivo (linha preta) fica abaixo do PIB esperado pelo consenso de mercado (linhas vermelhas).

14-Lembrando que a década frustrada é fruto de uma política econômica que implementou, na 1ª metade da década, estímulos de demanda quando havia insuficiência de oferta (pleno emprego) e que, na 2ª metade, tem focado em medidas de oferta, quando há clara insuficiência de demanda!

15- Para não dizerem que estou criando um espantalho, segue uma entrevista de um membro da equipe econômica em julho desse ano (não vou revelar o nome, pois não há necessidade de tornar o debate nominal).

16- Por fim, para quem não tem acesso ao jornal, segue o artigo por aqui. Que o pragmatismo nos permita bater palmas para o nosso PIB (e não comemorar 0,4% ao invés de 0,2%)!