Muita gente não sabe, mas o Brasil tem histórias de abolicionistas que fariam qualquer negro estremecer e acender uma chama ancestral de orgulho com nossa luta. Uma delas eu vou contar nessa thread, um guerreiro destemido conhecido como uma fera mitológica: Dragão do Mar 
Essa lenda nasceu em Canoa Quebrada em Aracati (CE), filho de pescador e de uma tradicional rendeira chamada Matilde. Seu nome era Francisco, mas o garoto logo recebeu o apelido de “Chico da Matilde”. Que mora no interior sabe como esse costume ainda vigora
O pai pescador morreu em uma viagem à Amazônia e a mãe, sem condições, entregou o filho para o dono de uma embarcação. Passou a trabalhar cedo e aprendeu de tudo no ofício. Teve contato com as mazelas do tráfico negreiro e ganhou consciência das barbaridades cometidas
Em 1870 ele vai morar em fortaleza, se casa e compra algumas jangadas. Conseguindo trabalhar como prático do porto, um tipo de guia das condições naturais e dos riscos específicos. As jangadas eram importantes para desembarcar escravos e outras mercadorias dos navios
Quem é do Ceará sabe que tem uma personagem soturna que acompanha a história do estado, a seca. Durante 3 anos ela matou tanta gente que os escravagistas não conseguiam manter mais as senzalas. Muitos libertaram os escravos outros venderam para o Sul e Sudeste
A imagem terrível dos cativos acorrentados se dirigindo para o porto de Fortaleza a fim de embarcarem nas jangadas e posteriormente nos navios em direção ao sul, mobilizou sociedades civis engajadas na luta abolicionista. Uma delas era a Sociedade Cearense Libertadora
Presidida por João Cordeiro, que havia conhecido Chico da Matilde na campanha de apoio às vítimas da seca em 1877 e 1879. Seu estatuto declarava “...a sociedade libertará escravos por todos os meios ao seu alcance”. Eles criaram até um jornal próprio, o Libertador em 1981
Em uma das reuniões surgiu a ideia de uma greve dos jangadeiros, afinal se eles não embarquassem escravos, não haveria comércio. A primeira greve foi um sucesso, mas não era o bastante. É quando Chico da Matilde aparece, assumindo a liderança dos jangadeiros na greve do porto
Jangadeiros, abolicionistas e população estavam unidas para acabar com a violência. Há relatos de um ataque que impediu que duas escravas (42 e 12 anos) fossem levadas para o embarque por um Militar. Chico foi demitido e passou a ser considerado um marco da resistência popular
Sua fúria e sua barreira se tornou inviolável. O movimento se espalhou por todo Ceará não deixando nenhuma alternativa para o fazendeiros senão, concordar com a abolição. Dessa forma o estado libertou seus escravos 4 anos antes da lei que decretou a liberdade por todo o país
Chico da Matilde passou a ser conhecido como Dragão do Mar ou Navegante Negro e até hoje seu nome é celebrado em escolas, teatros e pelo governo como resistência popular cearense contra a escravidão.
