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Qualquer análise de Junior Barranquilla 1x2 Flamengo precisa levar em consideração um elemento fundamental: o gramado.

Muitas vezes ignorado, esse é um fator que condiciona completamente o jogo de futebol, um dos mais importantes.
Contra o Junior, a qualidade do terreno influenciou completamente o jogo. O gramado duro e irregular fazia com que a bola não rolasse, ficasse sempre viva e atrapalhasse muito a fluidez do jogo rubro-negro, fundamental na imposição que esse time costuma exercer.
Quando a circulação de bola não flui, o Flamengo não domina. Não é a primeira vez que acontece e aparentemente não será a única. O que surpreende é que tão pouco se fale sobre isso nas análises.
Quem citou o gramado logo de cara foi o @Reikrauss, na sua “Melhor Análise”. Apesar de ser um programa de humor, foi a primeira coisa que o Rei notou, e está correto!

Aliás, muitos programas esportivos da TV tb são de humor, mas isso é outro assunto...

Na final da Libertadores 2019, em campo neutro, a CONMEBOL não molhou o gramado antes do jogo e quem foi sabe a lua que acarinhava as carecas no sol de 3 horas da tarde.

A grama seca prendia a bola, deixava o jogo mais agarrado e atrapalhava muito a troca de passes do Flamengo.
Com isso, o time se tornou uma presa mais fácil à intensa pressão do River, que chegava sempre a tempo de parar a jogada de alguma forma.

Méritos do time argentino, claro, e não serve de desculpa. O gramado é só um dos elementos que precisa ser colocado na conta.
Quando perguntado sobre a maior dificuldade que teve na sua chegada ao Brasil, Filipe Luís nem titubeou: “a maior diferença é no gramado”

(Pra quem ficou curioso, está aos 10:30 do excelente podcast do @globoesportecom com @cahemotta e @_igorrodrigues - interativos.globoesporte.globo.com/podcasts/progr…)
“O gramado brasileiro é muito diferente. Não quer dizer que seja ruim, mas é diferente. A bola corre diferente. Cada um é de uma altura, um está seco, outro está mais alto, o outro tem mais areia, então é diferente.”, disse.
“Eu jogo tênis e é diferente quando você joga no saibro ou na pista rápida. O futebol também passa por essa adaptação. Não é só ‘coloca uma bola lá e vai correr’. O gramado também tem a velocidade da bola...”

Ainda citou um exemplo…
“A gente foi jogar lá em Goiânia e o gramado estava bom, não estava ruim, mas estava fofo, então a bola corre mais devagar. Você tem que errar alguns passes até se acostumar.”, falando sobre o empate em 2x2 contra o Goiás, com gol de Michael no fim.
Por fim, completou: “É por isso que no Brasil tem tanta diferença jogar em casa e fora de casa. Em casa você sabe como o gramado está e já está adaptado a essa situação. Foi a maior diferença que eu encontrei.”
Não é só no Brasil, claro, mas na América do Sul. O gramado do Junior Barranquilla era muito ruim. O famoso “pasto” que não permitia aquela troca de passes envolvente para sair jogando lá de trás, o que prejudicava muito o primeiro passe.
Vale a pena repetir aqui: às vezes o primeiro passe é mais importante que o último para desestruturar a defesa adversária. Quando a bola sai limpa lá de trás, vai desorganizando o adversário e criando espaços nas regiões mais avançadas do campo.

Sem conseguir sair com tranquilidade e fluidez, o Flamengo ficou um pouco travado e, sejamos sinceros, o jogo ficou bem feio.
O futebol inglês, por exemplo, foi moldado por seus gramados. Em Londres, chove 106 dias por ano. Ou seja, em média, cai chuva cada três dias. Somado ao clima seco, frio e à neve do inverno, cuidar da grama sempre foi uma tarefa hercúlea no Reino Unido.
Não é coincidência que os bretões tenham desenvolvido o “kick and rush” como seu principal estilo de jogo. Como dar caneta, chapéu e tabelar num campo assim?

Entre 2004 e 2014, a média de acertos de passe na Premier League cresceu de 70% para 81%! Um aumento inacreditável, influenciado, é claro, pelo estilo espanhol que via dominando o futebol europeu, mas também pelos gramados. Hoje, até o lanterna joga em um verdadeiro tapete.
Antes mesmo de chegar oficialmente ao Fla, Filipe Luís também falou sobre o gramado do Maracanã.

“Tive a oportunidade de conversar com ele (Landim), principalmente sobre o gramado do Maracanã, para ele trocar, e acho que se trocar vai ajudar bastante.”

colunadofla.com/2019/07/negoci…
Dois meses depois, o lateral foi mais duro.

“A gente sabia que não estaria bom hoje. Não tem gramado que resista a tanto jogo seguido. Mas hoje estava MUITO duro e isso atrapalha muito. (...) É até perigoso jogar num gramado assim”

espn.com.br/video/clipe/_/…
De fato, Filipe tem razão. Em um mês e meio desde a temporada 2020, já foram disputados 16 jogos no Maracanã. O gramado, que começou o ano muito bom, já vem se desgantando.

A estimativa é que sejam jogadas em torno de 70 partidas no estádio durante o ano.
Colocando em contexto, foram disputados 28 partidas no Camp Nou em 2019. O Bernabéu recebe uma média de 35 jogos.

Até mesmo o San Siro/Giuzeppe Meazza, que é dividido entre Milan e Inter (e pelo Atalanta na UCL) terá dez jogos em março e abril, em um período crítico da temporada
Uma possível revolução no assunto através do "Projeto Gramados" foi, inclusive, um dos principais argumentos da CBF para exaltar o “legado da Copa”.

maquinadoesporte.uol.com.br/artigo/cbf-usa…
Não foi bem assim. Os gramados ainda variam muito por aqui.

No Maracanã, o número de jogos torna o trabalho impossível. Assim, o Flamengo pode começar (ou voltar) a sofrer com o terreno até mesmo nas partidas como mandante.

É impossível ignorar o efeito disso no jogo.
Como bem disse o lateral craque do Flamengo, o gramado condiciona a velocidade da bola e a forma como ela corre (ou não corre). Isso condiciona totalmente o futebol praticado.

O Flamengo não conseguiu se impor em um jogo que se tornou muito físico, picado o tempo todo.
Assim, a impressão foi de um jogo sem controle. Aquele Fla envolvente, que fatia a marcação do adversário e ataca de maneira voraz, não existiu. Isso não quer dizer que o time tenha jogado mal na Colômbia, mas é verdade que fez um jogo feio - e um tanto chato para o espectador.
Isso não pode, porém, se tornar muleta. Os gramados sul-americanos são assim. Isso é dado do problema e o Flamengo não pode se recusar a jogar bem quando a grama for mais apropriada para a convivência do gado do que a prática do futebol.
O time precisa encontrar alternativas para se adaptar a esse contexto. Precisa encontrar maneiras de fluir e ser dominante mesmo assim.

Há muito a se falar sobre o jogo de quarta. Só não me parece correto ignorar a grama. É dela que nasce o futebol!
PS: o segundo gol do Flamengo, inclusive, foi cortesia do gramado. O contra-ataque do Júnior estava montado, mas a bola quicou e o jogador deu de canela. João Lucas cortou e Gabigol foi genial no passe... O resto todo mundo já sabe
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