Thread by @lucasmafaldo

Dias atrás, eu falei que é importante ter vários cenários em mente e atribuir pesos distintos, para poder ir corrigindo com o tempo.

Porém, nem sempre isso resolve a complexidade do momento.

Às vezes você tem um cenário A com 35% de chances (relativamente baixo), mas ainda....

... assim esse ser o cenário mais fácil de enxergar (caso todos os outros estejam abaixo de 30%, por exemplo).

É isso que acontece na minha visão do coronavírus. Tem cenários A, B, C e D disputando minha atenção, sem nenhum ganhar a vantagem clara.

Nos últimos dois dias, o cenário que tem vencido é o seguinte: o corona vai ser tipo um influenza 4x pior (não por letalidade absoluta, mas por pico de casos).

Isso não é o fim do mundo, mas também não é nada bom (o influenza já causa problema pra caramba).

Inclusive, eu falei já é em janeiro que isso era um dos riscos relacionado ao coronavírus: não o de um rápido fim do mundo, mas de um novo problema crônico que iria gerar uma deterioração permanente no estado global de saúde.

Nesse cenário, haveria novas ondas nos anos seguintes, que só diminuiriam mesmo com o desenvolvimento de vacinas e/ou imunidade de rebanho.

Ainda de acordo com esse cenário, o número de mortes será bem mais baixo do que as previsões mais pesadas, mas ainda significativas.

Dei uma rápida olhada no Google e o Brasil parece ter umas 250 mil mortes anuais que já parecem com coronavírus (infecções respiratórias, doenças pulmonares, etc.). O que significa que uma doença nova pode piorar as coisas e ainda deixar margem para dúvidas da dimensão do...

... impacto (o que significa que oposição e situação podem passar meses, ou anos, em uma matemática macabra inconclusiva).

Ainda nesse cenário, o mais provável é que os países alternem medidas de contenção e liberação. O vírus seria pesado o suficiente para assustar a...

... a população, mas não o suficiente para justificar um lockdown permanente.

Sendo assim, eu imagino um retorno parcial às atividades em maio, em um cenário recessivo até a próxima onda (lá para o final do ano), seguido de mais recessão e restrição.

Nesse cenário, a coisa melhoraria mesmo lá em meados de 2021, onde a combinação entre tratamento e vacina e/ou imunidade permitiria uma recuperação aceleradas: nossos roaring twenties começariam aí.

Eu acho que esse é o cenário mais provável no momento, mas (um grande "mas")...

... ainda não tenho nem 50% de confiança nesse cenário.

Um cenário mais positivo também me parece possível: imunidade de rebanho lá por agosto/setembro e o vírus não se torna crônico. Teremos o melhor natal em muito tempo.

Os cenários mais negativos, a meu ver, tem mais a ver com o vírus do que com geopolítica. Estamos vendo uma clara tendência à centralização de poder. As democracias podem começar a acabar em breve.

Além disso, diferentes blocos de poder podem aproveitar o momento para iniciar...

... guerras locais. A Índia não está muito estável, a China nunca esteve tão agressiva, a União Européia tem grandes chances de perder a Itália e a Hungria.

Pode não dar em nada, mas tem uns 10% da bronca ser enorme. É aquele cenário de baixa probabilidade, mas alto impacto.

Disse o contrário do que eu quis dizer: os riscos geopolíticos podem ser ainda maiores do que o do vírus (até porque um se soma ao outro).

E se para ficar claro: o problema do próprio vírus nesse cenário não é letalidade, mas o fato de muita gente precisa de tratamento médico ao mesmo tempo.

Nesse caso, o problema é a falta de redundância. Os sistemas tentaram ficar mais eficientes reduzindo a "gordura", mas...

... é justamente ela que é necessário para lidar com esses picos.

É uma coisa análoga a deixar todo o patrimônio investido e não ter liquidez para uma emergência. No tempo de alta, parece uma estratégia genial. Depois, quando cai, a gente percebe que estava com risco demais.