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Lendo sobre História negra feminina no Brasil, uma descoberta me emocionou. Deparei-me com uma das histórias de vida mais inacreditáveis e impressionantes que já ouvi, a de Ná Agontimé, a rainha de 2 mundos, nascida no séc XVIII. O desfecho é no Brasil. Trágico e recentíssimo👇
Agontimé foi rainha do reino de Daomé, atual Benin. A história do reino já dá thread. Sabe Dora Milaje, exército feminino de Wakanda (Pantera Negra)? Inspiradas nas únicas amazonas e exército feminino da história: as “nossas mães” de Daomé! Superavam homens em eficácia e bravura.
Ná era uma das esposas do rei Agonglo, do reino de Daomé (atual Benin) no século XVIII. O rei recebeu de um sacerdote a premonição de que seu primogênito Adanzan, sucessor ao trono, seria um desastre, por ser sanguinário. O filho de Agontimé, Guezo, ainda menino, virou o sucessor
O rei Agonglo morreu precocemente e Adanzan assumiu como regente até a maioridade do meio-irmão. Temendo a ascensão futura de Guezo, Adanzan vende sua madrasta Agontimé como escrava a um traficante com ordens de que a rebatizem para que não seja mais encontrada. Guezo exila-se.
Adanzan tem passagem curiosa com Dom João. Em 1810, enviou, junto de presentes como sandálias reais, carta debochando e ironizando o príncipe regente luso: se diz, como rei, superior ao mero príncipe; desdenha da fuga dos ingleses, “tenho lutado muito, guerras p mim são diversão”
Verdadeira peça de exercício de poder, mostrando a imponência do reino africano. Começa a carta diminuindo Dom João e termina expondo bandeira com decapitados de guerra com rival. A ideia era, com a mudança comercial movida pela Europa em direção à escravidão, liderá-la na África
Após 21 anos de reinado, Guezo adulto consegue derrubar Adanzan. Descobre que a mãe foi vendida como escrava. Imediatamente envia expedições na busca dela nas Américas. Enviou, junto dos expedicionários, o trono real do vencido Adanzan como presente ao recém-coroado Dom Pedro I.
Por mais de século o paradeiro de Ná Agontimé foi desconhecido. Em 1948, Verger, pesquisador de tradição religiosa africana, teve acesso a nomes de vodus do culto do reino antigo daomeno, pela sacerdotisa da Casa das Minas, templo do séc XIX mais célebre dessa religião africana.
Verger vai à costa africana e descobre que os nomes dos vodus cultuados na Casa das Minas pertencem à família real daomeana, já que apenas sacerdotes da família teriam acesso aos nomes. Maria Jesuína, fundadora da Casa das Minas, era vodúnsi do vodu mais importante do seu povo!
Ora, Maria Jesuína foi o nome pelo qual foi rebatizada Ná Agontimé quando escravizada pelo seu enteado Adanzan, rainha do antigo Reino de Daomé e filha do rei Guezo! Provou-se: havia no Brasil descendentes da família real daomeana, tal qual Zumbi e Ganga Zumba com o rei do Congo!
A tese de Verger foi confirmada por pesquisa da UNESCO em 1985 e Ná Agontimé reconhecida como fundadora da Casa das Minas.
O culto era matriarcal, sempre regido com rigidez por mulheres! Homens só tocavam tambor. Encerrou-se com falecimento da Princesa Deni de Tói Lepon, em 2015.
Após descobrir tudo isso, verdadeiro enredo de cinema, ligando resistência negra no Brasil a curioso Reino de Daomé, interessei-me por ver com próprios olhos a história viva. Trono, sandálias e touca real. A Carta de Adanzan. A Casa das Minas. Aí notei o logo do Museu Nacional:
Todos os artefatos abaixo, enviados por Adanzan e Guezo, desapareceram com o fogo. Relíquias do Reino de Daomé, extinto com a colonização francesa em 1904, após 2 sangrentas guerras de resistência das únicas reais amazonas. Ninguém mais verá essa história com seus próprios olhos.
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