Thread by @GCasaroes

BOLSONARO EM 🇮🇱: longa thread para entender essa viagem

1) A escolha de Israel como 1o destino transatlântico de @jairbolsonaro tem profundo significado. Diz respeito à relação do presidente e seus eleitores com a Terra Santa, à política externa do governo e aos ventos do mundo.

2) Domesticamente, 4 razões fizeram Bolsonaro se aproximar de 🇮🇱. Primeiro, o antipetismo. Bolso resolveu capitalizar em cima das brigas entre @netanyahu e @dilmabr naquele episódio de Gaza, em 2014 (o do "anão diplomático"). Vendeu a dicotomia de q esquerda=🇵🇸 e direita=🇮🇱.

3) Claro q Bolsonaro criou uma ideia simbólica de Israel, vinculada ao conservadorismo e à religião. Não é um bom retrato do país, aliás. Mas basta dizer que, em quase todas as carreatas de Bolsonaro rumo à presidência, havia bandeiras de 🇮🇱. Muita gente não gostou da associação.

4) Na história de Gaza, ele pediu desculpas a 🇮🇱 pelas críticas do governo Dilma à ação militar israelense, que o Brasil chamou de desproporcional. Disse que se solidarizava c/Israel pq o terrorismo do Hamas era equivalente ao terrorismo de esquerda no 🇧🇷durante o regime militar.

5) A associação de 🇮🇱c/a direita conservadora/religiosa tb se relaciona com o fenômeno do sionismo cristão. Há uma crença entre grupos evangélicos/neopentecostais de q reconhecer Jlem faz parte de 1 profecia bíblica do retorno de Jesus à terra. Ao fazê-lo, Bolso seria abençoado.

6) Esse elemento foi amplamente explorado por Bolsonaro em missão parlamentar a 🇮🇱, em maio/16. Mais do que visita protocolar, foi o 1o passo do lançamento de sua candidatura presidencial. O momento + simbólico foi o batismo de Bolso no rio Jordão, pelas mãos do Pastor Everaldo.

7) Terceiro: nessa viagem, Bolsonaro construiu seu principal argumento concreto de aproximação de 🇮🇱: tecnologia. Dessalinização, gotejamento, aparelhos médicos, startups, indústria de defesa/segurança pública foram assuntos que deram ao candidato respostas aos problemas do 🇧🇷.

8) Por fim, há o antiglobalismo, q só apareceu + tarde, depois da eleição de Trump - considerado por @ernestofaraujo o único homem q pode salvar o Ocidente da ameaça globalista. Em pol.externa, 🇧🇷deveria seguir os passos dos 🇺🇸 e abraçar 🇮🇱 em nome da civilização judaico-cristã.

9) A grande promessa de Bolsonaro sobre 🇮🇱 é transferir a embaixada brasileira de Tel Aviv p/Jerusalém. É um movimento polêmico, pois muda o status quo de uma cidade disputada por 🇮🇱e🇵🇸, além de contrariar todas as disposições do direito internacional, sempre defendidas pelo 🇧🇷.

10) C/a partilha da Palestina britânica em 2 Estados, árabe e judeu, em 47, Jlem possui um "status especial". Ela só pode ser capital depois da solução do conflito israelo-palestino. Desde q 🇮🇱ocupou/reunificou/anexou Jlem, a ONU vem chamando atenção para a ilegalidade da medida.

11) Por isso, mesmo depois de @realDonaldTrump ter mudado a embaixada dos 🇺🇸unilateralmente, poucos países seguiram. Até hoje, só a Guatemala efetivou a mudança. Paraguai fez e voltou atrás. Romênia, Hungria, Austrália e Rep. Checa prometeram, mas ainda não levaram adiante.

12) Não se trata de negar o fato de q Jlem pode ser a capital de 🇮🇱, mas reconhecer as reivindicações 🇵🇸e entender q esse status não pode ser estabelecido de maneira unilateral. Esse é o consenso que o 🇧🇷quer romper. Diz o chanceler Ernesto q isso é dar "alma" p/nossa diplomacia.

13) Claro que essa decisão da embaixada não é simples. Além de jogar a diplomacia no 🗑️, há riscos comerciais e políticos. @GeneralMourao já falou q não quer ver o 🇧🇷na rota do terrorismo int'l por uma briga q não é nossa. @TerezaCrisMS teme que a medida cause perdas comerciais.

14) Os ruralistas têm, de fato, muito a temer. Somos o principal exportador de carne e frango halal, com superávits bilionários. Vários países árabes e muçulmanos já disseram q discordam da posição brasileira. A ameaça, claro, não significa interrupção imediata do comércio...

15)... mas indica a possibilidade de substituição do produto 🇧🇷pelo de concorrentes, como os vizinhos 🇵🇾e🇦🇷, q já se movimentaram. Além da carne, comercializamos produtos variados c/os mundos árabe e islâmico q também poderão ser comprometidos. Não se trata de questão trivial.

16) Apesar de tudo, os agentes a cargo da política externa - Ernesto, Filipe Martins e Eduardo Bolsonaro - seguem insistindo na importância da transferência da embaixada. A viagem a 🇮🇱, se bem sucedida, reforçará o grupo ideológico/olavista na disputa por espaços no governo.

17) @netanyahu tb está animado. Em 10 dias, haverá eleições no país. Como a questão de Jlem é crucial p/reforçar sua narrativa, certamente ele dará tratamento especial ao presidente brasileiro. Imaginem o impacto simbólico q teriam os 2 rezando, juntos, no Muro das Lamentações...

18) A enorme boa-vontade do premiê israelense c/Bolsonaro revela as expectativas de q o 🇧🇷reconheça Jlem como capital "una e indivisível" de 🇮🇱e mude a embaixada. Veio à posse, fez elogios pelo Twitter, mandou ajuda humanitária p/Brumadinho. Não vai querer sair de mãos abanando.

19) Isso coloca Bolsoo num dilema: transferir a embaixada gera altos custos econômicos/políticos, mas consolida a narrativa antiglobalista e fortalece laços com o eixo trumpista 🌎. Não transferir enfraquecerá Ernesto, além de irritar lideranças evangélicas, como @PastorMalafaia.

20) Há soluções intermediárias, como a abertura de um escritório de representação em Jlem, como fez a aliada 🇭🇺de Orbán, ou reconhecer Jlem *Ocidental* como capital de 🇮🇱, como fizeram 🇷🇺e🇦🇺. Pode-se também reforçar a promessa e não decidir nada, empurrando a decisão p/o futuro.

21) Restam dúvidas: como o mundo reagirá à visita e às decisões? Como ficarão as relações c/Palestina, já que Bolso negou o convite p/visitar o país e já disse q romperia laços? O que o 🇧🇷pode oferecer aos árabes para minimizar os danos comerciais? Que grupo interno prevalecerá?

22) Dado o simbolismo do que há em jogo, nenhuma saída é ideal. Dificilmente a viagem correrá sem nenhuma decisão concreta ou promessa mais específica. Mas a única coisa que sabemos, conhecendo um pouco o governo, é que absolutamente tudo pode acontecer. Até o inimaginável.