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Na #AulaFio de hoje, vamos falar sobre apenas um livro e as reações apaixonas que ele causou. Uma história que envolve suicídio, autoritarismo e uma visão retrógrada de religião....

Segue a Aula-fio...
Assim que voltou da viagem aos EUA em Maio de 1941, Érico estava com o irmão Ênio na praça da Alfândega de Porto Alegre, matando as saudades do irmão, que ainda vivia em Cruz Alta e veio visitá-lo na capital do estado, quando viu uma cena que jamais esqueceria...
Ele do que conversava com o irmão quando viu “precipitar-se do alto de um dos edifícios vizinhos um vulto humano, um corpo de mulher, que ao bater nas pedras do calçamento da rua, produziu um som horrendo.”
Em 1943, inspirado (ou assombrado)por este acontecimento, Érico lançou o romance “O resto é silêncio” em que o suicídio de uma jovem, que joga-se de um prédio, é o ponto de partida de sete histórias que se intercalam ao longo da narrativa.
Érico conheceu esta técnica narrativa ao traduzir o romance “Contraponto” do autor norte-americano Audous Huxley (1894-1963). No caso, cada linha narrativa funciona como o músico de uma orquestra, dando a sua nota que que formará todo o arranjo do romance.
Assim acompanhamos um dia da vida de personagens que vão de um menino de rua a um desembargador aposentado, passando por um escritor de romances (um alter-ego dentro da trama?).
E durante a história, são feitas várias denúncias, da hipocrisia religiosa, a calamidade social dos mais pobres, a superficialidade da vida burguesa, a corrupção política, o distanciamento de certo artistas da convulsão social, e por aí vai.
Ao final, os personagens reúnem-se novamente,agora no Teatro São Pedro, diante de uma orquestra. E ao ouvir a música,Tônio Santiago tem a catarse de desapaixonar-se de seu passado, e criar o épico da história do Rio Grande do Sul, onde cada tempo seria uma nota de toda a memória.
Evidente que o final remete ao que vira a ser a saga de “O Tempo e o Vento”. Além disto existem menções sutis à personagens e lugares dos romances anteriores. (Erico gostava de brincar com a ideia destas narrativas todas estarem entrelaçadas).
O título do romance são as últimas palavras da peça Hamlet, proferidas pelo próprio príncipe da Dinamarca, antes de morrer. “O resto é silêncio” com certeza foi o romance mais ambicioso de Erico no início de sua carreira, e com certeza o que lhe rendeu mais dor de cabeça.
Em março de 1943, foi publicada na Revista O Eco, apenas com as iniciais L.F. por assinatura, o texto “Getulinho Vargas”, uma elegia ao filho recém falecido do presidente Getúlio Vargas, misturada com ataques ao romance e ao próprio Verissimo.
Entre elogios ao falecido e ao ditador que “chamado pela Providência a cumprir sua grandiosa missão de renovar o Brasil no Estado Novo”, o autor pedia que o espírito de Getulinho inspirasse o pai a mandar fazer uma fogueira com os volumes do livro e expulsar Verissimo do Brasil.
Note-se que o ato de queimar livros era vivo no imaginário do autor, que soube-se que na verdade era o padre Leonardo Fritzen,membro da Companhia de Jesus (A Revista O Eco era vinculada ao colégio jesuíta de Porto Alegre).O texto também foi publicado em um jornal de Porto Alegre.
Erico, depois de identificar o autor dos ataques, apresentou uma queixa-crime. Não por questões pessoais, mas por entender que aquele ataque não era só a ele, mas a toda liberdade de expressão.
Quando a petição foi recebida pelo promotor, a cidade estava dividida em duas: a que apoiava o padre, liderada pelos católicos fervorosos encabeçados por Armando Câmara e a solidária à Erico, liderada por artistas e intelectuais não -simpatizantes do Estado Novo.
Para ter uma dimensão de quem é este senhor, ele se recusou a receberJean-Paul Sartre e Simone de Beauvoir na UFRGS, com a seguinte frase "Se esta rameira entrar nesta universidade, eu sairei pela mesma porta para nunca mais aqui voltar". Um anjo.
Um detalhe interessantíssimo foi que Câmara escreveu uma moção de solidariedade ao padre, atacado pela intelectualidade subversiva que ganhou centenas de assinaturas de apoio.
Erico foi à rádio é simplesmente leu o texto na íntegra, com todos os seus ataques e termos ofensivos. Houve uma fila de pessoas na livraria do Globo, para pedir desculpas por terem assinado a moção, sem terem lido o texto que causou toda a polêmica.
Com o tempo, a polêmica já não era mais sobre o livro ou a crítica a ele, mas entre os que apoiavam ou não o Estado Novo. Mesmo com a censura, houve intensos debates sobre direitos humanos, liberdade de expressão e democracia nos jornais e círculos intelectuais e artísticos.
Ao final, o promotor Luiz Lopes Palmeiro arquivou o processo, alegando inconsistências e irrelevâncias na queixa. Foi a gota d’água para que Erico decidisse sair do país.
Aceitou um novo convite do Departamento de Estado norte-americano e foi com sua família para Berkeley, passando dois anos na Califórnia (os anos finais da Segunda Guerra Mundial). A narrativa desta nova passagem nos EUA está em “A volta do gato preto” de 1946.
Na próxima #AulaFio, falarei sobre as viagens de Verissimo aos EUA, gatos pretos, Malasartes e como ele invadiu a Casa Branca!

Espero que voltem e Leiam!
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