Ta aí uma banda que se deu mal: os Pretty Things. Gravaram sua ópera-rock SF Sorrow antes de Tommy, do Who, em 1968. Na Inglaterra, ela saiu antes do disco do Who, que saiu em 1969. 
Nos EUA, SF Sorrow saiu já em 1969, meses DEPOIS de Tommy, por um selo bem menor, o Rare Earth, divisão "psicodélica" da Motown. Deu ruim.
Por causa disso, que coisa, os Pretty Things foram considerados copiadores do Who nos EUA. Sendo que fizeram sua ópera rock antes. Não tinha internet na época pra ninguém checar dados.
Quer coisa pior? Toma: SF Sorrow saiu na mesma semana do White Album, dos Beatles. Pela mesma EMI que lançava os Beatles - e que nao fez nada pelos Pretty Things.
SF Sorrow tem certa, digamos, semelhança com Tommy: pra começar ambas as óperas falam de personagens bem sombrios. Tommy, se ouvida com atenção, mostra uma história extremamente depressiva e triste:
um garoto cego surdo e mudo que nasce numa família disfuncional, sofre abusos do primo e do tio e, um dia, vira popstar.
Sorrow fala de um personagem (Sebastian F. Sorrow) que cresce numa cidade sem nome, passa por vários problemas pessoais, vai lutar na Segunda Guerra Mundial, vê sua noiva morrer num acidente de balão (na música Balloon burning)
e termina se sentindo a pessoa mais solitária do mundo (a última faixa, The loneliest person).
Tommy mexe com temas bem interessantes no fim dos anos 1960: a voz e a vez dos jovens, a mania por pinball, a ressaca de ídolos no pós-Beatles, um certo lance ocultista (no filme, esse lado "Jimmy Swaggart" da coisa fica claro)
Tommy, enfim, fez um puta caldeirão de tendências, e pôs certo toque irônico pra amenizar a coisa. Você pode torcer por Tommy, mas o fim da história é bastante revelador.
SF Sorrow, vamos admitir, tinha canções com menos pegada, contava uma história BEM mais triste, e mesmo o lado mais "religioso" da coisa (a entrada do Baron Saturday na história) é mal contado.
Mas ganhou fas, inclusive famosos. Dá pra ver ecos de SF Sorrow em muita coisa do Queen, por exemplo. Freddie Mercury era fã. Bohemian Rhapsody conta uma história tão deprê quanto (ultimo verso: "às vezes gostaria de nunca ter nascido")
Pra piorar, SF Sorrow mal foi apresentado ao vivo. A banda cismou de "dublar" as músicas, com o baterista Twink, uma das figuras mais famigeradas da psicodelia britânica, fazendo mímica e interpretando o personagem principal.
Em 1998, os PT receberam um convite para voltar ao estúdio Abbey Road, onde haviam gravado o disco, e fazer todo o album ao vivo para uma transmissão pela internet. Falamos disso no POP FANTASMA
popfantasma.com.br/aquela-vez-em-…
popfantasma.com.br/aquela-vez-em-…
Mais uma vez, SF Sorrow bateu na trave: na época, a internet era "à lenha". Rolaram mil problemas com o servidor, muita gente nao conseguiu ver a transmissão
SF Sorrow só nao virou uma caveira de burro na carreira dos PT porque eles voltaram na sequência com um disco bem melhor, Parachute. Foi o primeiro sem o guitarrista Dick Taylor - que, pasme, foi um dos primeiros baixistas dos Stones, mas abandonara o grupo.
Até hoje Dick Taylor (que voltou aos Pretty Things e tá lá até hoje - sim, a banda ainda existe) diz pra quem quiser escutar que o grande erro da banda foi não ter feito uma turnê pelos EUA
Ótima afirmação de Dick sobre o assunto: "Agora somos uma banda cult. Não podemos ir para um universo paralelo onde vamos aos EUA, e eu não posso ir para um universo paralelo onde ainda estou nos Rolling Stones"
Por sinal, nos anos 1970, os Pretty Things voltaram como contratados da Swan Song, selo do Led Zeppelin. Soltaram dois discos por lá. Ouça correndo se for fã de glam rock.
