O @TheInterceptBr publicou hoje uma matéria que levou quase 2 anos para ser concluída. Um trabalho jornalístico inédito, arriscado e inovador, como só o TIB faz. Quem fala aqui é @cecillia e vou contar um pouco dos bastidores para vocês desta reportagem que fiz com @Demori.
Durante cem dias, recolhemos 137 cartuchos de balas após tiroteios em localidades da região metropolitana do Rio de Janeiro. 
Como a gente fez isso? Foi relativamente simples. Nós monitoramos os tiroteios através do @fogocruzadoapp e quando eles terminavam, recolhíamos as cápsulas.
Depois de recolher as capsulas, veio o trabalho mais cansativo: cataloga-las e levantar o máximo de informação sobre contexto dos tiroteios. Pesquisamos na imprensa e perguntamos sobre operações realizadas à Polícia Civil, à PM e ao Exército - já que o Rio estava sob intervenção.
As polícias não nos responderam. Mas o Exército enviou um relatório com as operações que realizou no período. E uma das operações batia com um dos dias em que recolhemos cartuchos no Complexo do Alemão.
Houve operação das Forças Armadas no dia 19 de agosto de 2018 no Alemão. Lá recolhemos uma cápsula do mesmo lote das balas usadas para matar a vereadora Marielle Franco e seu motorista Anderson Gomes, o UZZ-18.
Este lote foi vendido pela CBC para a PF em 2006. A PF não estava no Alemão nesse dia. Como essas cápsulas foram parar lá? Talvez do mesmo jeito que pararam numa chacina em São Paulo e uma disputa entre traficantes em São Gonçalo em 2015? Não sabemos.
Com as informações iniciais em uma planilha, acionamos o @SoudaPaz e o @SmallArmsSurvey para nos ajudar a buscar dados de fabricação dos cartuchos. Os especialistas identificaram calibres, fabricantes, países de origem e em alguns casos ano de fabricação e lote.
Das 96 cápsulas brasileiras que recolhemos conseguimos identificar 54 lotes. Mas só obtivemos informação sobre 4 deles, através de uma planilhado MP da Paraíba. Foi assim que identificamos o lote da bala que matou a Marielle.
Tentamos por meio da Lei de Acesso a Informação saber mais sobre os lotes nacionais. Procuramos a PF, o Exército e até a Corregedoria Geral da União. Nossos advogados trabalharam exaustivamente nisso, mas as informações nos foram negadas.
Muito se fala sobre controle de fronteiras quando o assunto é segurança pública. Mas nosso levantamento mostra que parte do problema é produzido aqui mesmo.
68% das cápsulas que recolhemos são nacionais - a maior parte de uso restrito. A grande questão então é: como a munição que deveria estar com as polícias e as Forças Armadas vai parar nos mais de 20 tiroteios diários que acontecem por aqui e mataram quase 1500 pessoas em 2018?
Essa matéria combina todos os motivos que me fazem gostar de trabalhar no @TheinterceptBr. Aqui nós temos tempo, incentivo e recursos para trabalhar numa pauta mesmo que ela leve 18 meses para ser produzida.
Jornalismo inovador demanda muita gente (foram mais de 20 profissionais envolvidos nessa reportagem), coragem, tempo e advogados!! Ele muda o mundo e não é lucrativo. Por isso, ajuda a gente a fazer muito mais investigações como essa: catarse.me/intercept
