Profile picture
Além das Sombras @AlemD4sSombras
, 13 tweets, 6 min read Read on Twitter
Atenção para essa thread sobre nosso digníssimo ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo. Quando o nome de Ernesto Araújo foi oficializado na conta do twitter de Jair Bolsonaro duas coisas aconteceram: 1º ninguém sabia quem ele era. 2º todo mundo foi buscar no Google.
O primeiro resultado da busca no Google foi um blog tresloucado, em que Ernesto Araújo fala em uma diplomacia com princípios cristãos, antiglobalista, antimarxista, era só pataquada. Mas cabia como uma luva nos discursos neo-olavóides que foram vendidos na campanha de Bolsonaro. Manchete: Chanceler diz que combaterá 'pautas abortistas e anticristãs' na ONUManchete: Araújo assume Itamaraty pedindo mais Brasil e menos ordem GlobalDeixaremos de louvar ditaduras assassinas e desprezar ou mesmo atacar democracias importantes como EUA, Israel e Itália. Não mais faremos acordos comerciais espúrios ou entregaremos o patrimônio do Povo brasileiro para ditadores internacionais.
Mas tudo o que a imprensa pesquisou sobre Araújo, esse diplomata até então de carreira obscura, foi baseado num blog e em declarações posteriores ao seu anúncio como ministro. O que não ocorreu foi questionar a data em que o blog começou. Setembro de 2018, auge da campanha. Primeiro post do blog mostrando que foi escrito em 22 de setembro de 2018.
Mas numa pesquisa um pouco mais elaborada, a gente chega na última tese de Ernesto Araújo, publicada em 2008 e, vejam vocês, louvando o Mercosul como uma grande solução diplomática para o Brasil em negociações extra-regionais. A íntegra da tese está aqui: funag.gov.br/loja/download/… Capa do livro O Mercosul:<br />
negociações extra-regionais de Ernesto Araújo
Na tese, em resumo, ele defende que o Brasil tem que valorizar as relações com os PEDs (países em Desenvolvimento) em vez de focar nas relações com os EUA, porque só se juntando em Bloco (Ursal! Ursal!) podemos negociar de igual para igual. A promoção dos interesses dos PEDs exige uma reformatação<br />
dos modelos negociadores disponíveis, e não somente a obtenção de<br />
maiores concessões dentro desses modelos. A criação de novos<br />
modelos, adequados aos interesses dos PEDs e, especificamente, do<br />
Mercosul, requer um amplo trabalho por parte do bloco.<br />
Esse trabalho ver-se-ia facilitado se fosse possível impulsionar<br />
uma “OCDE do Sul”, um foro de discussão dos paíseOs modelos de acordos de livre comércio que circulam hoje no mundo estão eivados de uma certa ideologia favorável aos países desenvolvidos e desfavoráveis aos países em<br />
desenvolvimento. Não se trata aqui de “demonizar” os países<br />
desenvolvidos, mas apenas de apontar o fato de que suas<br />
negociações com os PEDs foram até hoje formuladas quase que<br />
unicamente de acordo com os interesses do Norte.
Araújo realmente enfatiza que não devemos focar só nas negociações com os grandes, porque eles têm "modelos intrusivos". E os países da América Latina não devem se subordinar. As negociações do Mercosul com países desenvolvidos<br />
deveriam ser, não aposentadas, nem substituídas por negociações SulSul, mas colocadas em novas bases, efetivamente vinculadas a um<br />
projeto de desenvolvimento. O fato de não havermos aceito modelos<br />
“intrusivos” nessas negociações não vem contradizer essa base, mas<br />
justamente confirmá-la, pois o que se manifesta em qualquer caso é a<br />
postura de relacionar-se simetricamente com os parceiros<br />
desenvolvidos o agrupamento deixou claro que não<br />
se subordina a lógicas negociadoras pré-definidas e que não fechará<br />
acordos desiguais apenas para melhorar sua visibilidade – e é<br />
justamente essa autonomia que faz o Mercosul visível e indispensável<br />
no cenário comercial internacional, e especialmente que torna o Brasil<br />
o ator central que é nas negociações multilaterais.2
O diplomata também fala da importância do Brasil se aliar com países como... Cuba. Sim, amiguinhos, tem Cuba no livro. o Mercosul tem diante de si outros sócios potenciais no<br />
processo de unificação sul-americana, ou no caso do México e Cuba,<br />
parceiros na ALADI que mantêm com o Mercosul um extenso<br />
patrimônio histórico
Tem mais? Tem. Ele fala que o Mercosul foi fundamental para que o Brasil tivesse melhores relações com países árabes e também cita o Irã como parceiro comercial, sem restrição ou animosidade. Se hoje o Brasil tem melhores<br />
relações com a Índia, os países árabes, a África do Sul e o Paquistão,<br />
e se essa relação se traduz em projetos de negociação comercial, isso<br />
não significa que tenha piores relações com EUA e UE.Dos 14 parceiros extras regionais considerados... cita todos, inclusive o Irã
Uma coisa que chama atenção no livro é como Ernesto Araújo sempre cita o antigo Ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, com muita admiração, sempre concordando com sua política externa. O Ministro Celso Amorim, em entrevista ao Estado de S. Paulo, publicada<br />
em 11/2/2007, respondendo à pergunta “por que a opção preferencial pelos<br />
países em desenvolvimento?” afirmava: “Ao aprofundarmos o diálogo SulSul, fizemos algo que não estava ocorrendo. Isso até fortaleceu o nosso<br />
diálogo com o Norte. Na mesma época, em visita a Buenos<br />
Aires, o Ministro Celso Amorim, durante encontro com o Chanceler<br />
Jorge Taiana, lançou a idéia de “criação de um embrião do que seria<br />
uma comissão negociadora permanente integrada por funcionários do<br />
Mercosul.”
Ernesto Araújo chega inclusive a atacar a ideologia "cargo cult financeiro" usada por países desenvolvidos como os EUA. Eles não podem ser a única fonte de esperança e salvação.  A ideologia disseminada pelos países desenvolvidos<br />
criou uma espécie de cargo cult financeiro,225 em que os investimentos<br />
externos são misticamente venerados como única fonte de esperança<br />
e salvação.
Mas sabe o que não tem no livro? Não tem antimarxismo, antiglobalismo, diplomacia cristã, religião, ordem global, elogio ao Sebastianismo português, combate a pautas abortistas ou de ideologia de gênero. O livro de Ernesto Araújo é uma tese de um diplomata sensato.
Nossas fontes dentro do Itamaraty dizem não reconhecem esse Ernesto Araújo do blog (link aqui: metapoliticabrasil.com). Factualmente, esse Ernesto Araújo surgiu em 22 de setembro de 2018 para se aliar a um projeto de poder. Não é o mesmo diplomata que existia até 21 de setembro. Capa do Blog Metapolítica 17
Nós ainda não sabemos quem é Ernesto Araújo. Talvez ninguém saiba. E esse é um problema: uma pessoa capaz de sofrer uma mudança tão drástica e tão repentina vai ser sempre um mistério. Resta saber se vale a pena ter um mistério como ministro. Foto de Ernesto Araújo
Missing some Tweet in this thread?
You can try to force a refresh.

Like this thread? Get email updates or save it to PDF!

Subscribe to Além das Sombras
Profile picture

Get real-time email alerts when new unrolls are available from this author!

This content may be removed anytime!

Twitter may remove this content at anytime, convert it as a PDF, save and print for later use!

Try unrolling a thread yourself!

how to unroll video

1) Follow Thread Reader App on Twitter so you can easily mention us!

2) Go to a Twitter thread (series of Tweets by the same owner) and mention us with a keyword "unroll" @threadreaderapp unroll

You can practice here first or read more on our help page!

Did Thread Reader help you today?

Support us! We are indie developers!


This site is made by just three indie developers on a laptop doing marketing, support and development! Read more about the story.

Become a Premium Member and get exclusive features!

Premium member ($3.00/month or $30.00/year)

Too expensive? Make a small donation by buying us coffee ($5) or help with server cost ($10)

Donate via Paypal Become our Patreon

Thank you for your support!